O Rio de Janeiro foi palco de um grande ato de baderna e insubordinação provocado por policiais militares, civis e bombeiros, que invadiram a Assembleia Legislativa do Estado (Alerj) na última terça-feira 8 em protesto contra o necessário pacote de ajustes anunciado pelo governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) para tentar salvar o Estado da falência. Sem dinheiro até mesmo para pagar salários do funcionalismo, o Governo do Rio quer uma renda extra, e mandou projeto para a Alerj aumentando a taxação das contribuições previdenciárias dos funcionários. Ao invés do diálogo, os policiais adotaram a força, com a invasão e destruição do patrimônio da Assembléia. Um verdadeiro ataque ao Estado Democrático.

Aos gritos de palavras de ordem contra o governo fluminense, os policiais, além de servidores do Corpo de Bombeiros, destruíram móveis, arrancaram o forro de cadeiras fabricadas no começo do século passado, estilhaçaram o tampo de vidro da mesa da presidência do plenário, rasgaram documentos, quebraram computadores, sumiram com câmeras de vigilâncias em uma demonstração de violência, insubordinação à lei e violação da constituição. Ou seja, tudo o que deveriam combater.

Para o presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani (PMDB), o comportamento dos policiais foi “um crime e uma afronta ao estado democrático de direito sem precedentes na história política brasileira.”

Picciani disse que o projeto aumento da contribuição previdenciária dos servidores do Rio será rejeitado pela bancada do PMDB e que o Legislativo irá retirá-lo de pauta e devolvê-lo ao Executivo. Mas lembrou que a discussão dos projetos do governo para salvar as contas públicas não será paralisada pela força e sim pelo diálogo.

“Jamais deixaremos de discutir as medidas do governo para resolver a crise financeira pela força bruta. O Parlamento não se curva a isso. A invasão da Alerj não é compatível com a democracia”, disse Picciani.

A tentativa de pressão dos policiais revoltou o governador Pezão. “Invadir o parlamento, nem na ditadura isso acontecia. Acuar deputados numa sala dentro do departamento médico não é coisa de servidor público”.

“Invadir o parlamento, nem na ditadura isso acontecia. Acuar deputados numa
sala não é coisa de servidor público”, disse o governador Luiz Fernando Pezão.

SELVAGERIA: Móveis e computadores destruídos foi o saldo na Alerj
SELVAGERIA: Móveis e computadores destruídos foram o saldo na Alerj

Perplexidade

Algumas marcas dos violentos chutes dados na portaria da entrada principal por policiais já foram apagadas. Porém, no interior do belíssimo Palácio Tiradentes, atual sede da Alerj e onde funcionou o Congresso Nacional brasileiro entre 1926 e 1960, a destruição ainda é grande e levará algum tempo para ser restaurada. A sala mais quebrada foi a sala do vice-presidente Wagner Montes (PRB), onde os arquivos foram revirados de cabeça para baixo e os computadores, inutilizados. Um prejuízo enorme ao patrimônio público cujo conserto sairá dos cofres públicos. Ou seja, do nosso bolso.

Coube a um ambulante, que trabalha nas imediações da Alerj e presenciou a invasão da terça-feira, o resumo da perplexidade que tomou conta de todos que viram as cenas, ou fotos, da selvageria. “Se aqueles que deviam nos proteger agem assim, que segurança podemos esperar agora?”, questionou, sob anonimato.

O deputado Paulo Melo (PMDB) se disse intimidado por manifestantes. “O cara começou a me ofender, com a cara cheia de álcool, enquanto eu dava uma entrevista. Pressionar os deputados é legítimo para quem quer garantir seus direitos, intimidar não é legítimo.”

Menos de 24 horas depois de depredarem a Alerj, os policiais militares reassumiam o papel de guardiões do patrimônio social e controladores de protestos no mesmo endereço. Só que, uniformizados, impediram que funcionários do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), invadissem a Alerj na quarta-feira para fazer exatamente o que eles fizeram no dia anterior. Policiais usaram bombas de gás de efeito moral para impedir que os manifestantes invadissem novamente a Assembléia.

Os protestos do funcionalismo acontecem contra algumas medidas anunciadas por Pezão para tentar dobrar a arrecadação do estado, como o desconto de 30% no contracheque de servidores ativos e aposentados que recebem até R$ 5.189 mensais, e de 16% de quem ganha acima disso, durante um ano e meio. Prevê, ainda, a extinção dos restaurantes populares e outros projetos sociais. O pacote, que inclui também funcionários do judiciário, entraria em apreciação na terça-feira 8, mas, após a baderna, uma liminar concedida pelo desembargador do Tribunal de Justiça Custódio de Barros Tostes suspendeu o item da alíquota extra.

Picciani já declarou que a proposta de taxar o funcionalismo será devolvida ao governo do Estado, mas assegurou que as outras 21 medidas vão seguir o calendário determinado para votação na Alerj. Caso esse pacote seja aprovado, é prevista uma arrecadação de R$ 27,9 bilhões para os cofres públicos do Rio nos próximos dois anos.

Estado falido

Governo do Rio mandou para a Alerj projeto com 22 medidas para sanear as contas do Estado, que tem um déficit anual de R$ 19 bilhões

O governo gasta R$ 25 bilhões anualmente com os 223 mil servidores da ativa e R$ 17 bilhões com os inativos

Somente com a Previdência estadual o déficit é de R$ 12 bilhões até 2018

O governo prevê desconto extra nos salários de servidores ativos e aposentados. Os que ganham até R$ 5.189 terão descontos de 30%

As medidas estimam arrecadação de R$ 27,9 bilhões para os cofres públicos do Rio nos próximos dois anos.

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Fotos: Marcelo Theobald/Extra/Agência O Globo; Pablo Jacob/Agência O Globo