Como já haviam ameaçado em várias ocasiões, os bolsonaristas finalmente executaram seu Capitólio tupiniquim no dia 8, repetindo como farsa o ataque dos trumpistas em Washington, exatamente dois anos antes. Assim como aconteceu nos EUA, esse ataque à democracia vai mudar o rumo da economia.

Nos EUA, o caos extremista fortaleceu Joe Biden, que lançou vários pacotes trilionários de investimento público. Seu plano era repetir o New Deal de Roosevelt. O vácuo político fortaleceu os democratas, que avançaram na direção de uma espécie de Estado de bem-estar social. Houve um efeito benéfico de curto prazo, especialmente no mercado de trabalho, mas a inflação subiu, levando junto a popularidade do presidente. Biden se recuperou parcialmente, mas a perspectiva de uma recessão continua assombrando o seu mandato.

A rapina das sedes dos Poderes em Brasília, num primeiro momento, também fortalece Lula. A sociedade civil, os políticos e as entidades empresariais foram enfáticas na defesa das instituições, o que tende a isolar Bolsonaro e seus apoiadores radicais, fardados ou não. O movimento dá mais poder ao petista para avançar sobre a agenda intervencionista e estatizante que já era esboçada. Isso significa mais impostos, inflação pressionada, juros em patamares elevados e dólar nas alturas. A pressão do setor produtivo contra essa agenda (o calcanhar de Aquiles do novo governo) tende a ser escamoteada pela defesa da democracia, que é uma prioridade óbvia. É mais um presente que Bolsonaro deu a Lula.

Um desdobramento provável é que Fernando Haddad passe a mirar cada vez mais o Banco Central, que tem desenvolvido um papel importante ao impedir que o populismo de Paulo Guedes e seu antigo chefe contaminasse ainda mais a economia. A inflação fechou 2022 em 5,79%, estourando a meta pelo segundo ano seguido. Se não fosse a ação decidida do BC, a inflação ainda estaria nos dois dígitos. Mas Haddad já ataca os juros altos, mostrando que o petismo pode transformar o BC em bode expiatório das dificuldades na economia, que vão aumentar nos próximos meses. Foi o que aconteceu no governo Dilma.

As medidas que a equipe de Haddad prepara são amargas e precisarão ser convincentes para não desacreditarem um governo que mal completou dez dias. Mas o ministro até agora não mostrou jogo de cintura para apontar o País no rumo do crescimento. Pior, já foi desautorizado pela “ala política” do Planalto quando tentou reverter a desoneração dos combustíveis. Isso é um problema crescente para Lula, que insiste em teses ultrapassadas já fracassadas no passado. O petista ganhou o apoio da sociedade contra o terrorismo bolsonarista, mas tem pouco tempo para aproveitar a lua de mel. Além de reconstruir a praça dos Três Poderes, precisará mostrar habilidade em consertar a economia. Essa segunda tarefa pode ser mais difícil.