“Tenho orgulho de ser naturalizado italiano, mas nunca esqueço que sou africano” Mario Balotelli, jogador de futebol (Crédito:Alessandro Sabattini/Getty Images)

Em todo o mundo, mais do que nunca, as vidas negras importam. O ano de 2020 já pode ser considerado um marco contra o racismo. O brutal assassinato do americano George Floyd, morto por um policial branco em Minneapolis, nos EUA, em maio deste ano, foi o estopim para que o movimento ganhasse proporções mundiais como não acontecia desde o movimento pelos Direitos Civis liderado por Martin Luther King nos anos 1960.

“Sou mais que um atleta, não vou me calar. Eu significo muito para a sociedade” LeBron James, jogador de basquete da NBA (Crédito:EZRA SHAW / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / AFP)

O movimento chegou até a um universo que sempre pareceu alheio aos problemas externos, fora das pistas. No último domingo, 5, o GP da Áustria marcou o reinício da Fórmula 1 e foi palco de uma manifestação promovida pelo pentacampeão da competição e um dos únicos negros na história da categoria, o inglês Lewis Hamilton. Os 20 pilotos usaram camisas com mensagens anti-racismo — antes do início da corrida, 14 deles se ajoelharam, gesto que simbolizou o apoio à causa. Com mais de 28 milhões de fãs na internet, Hamilton usa sua influência para promover a campanha ‘We Race as One’ (Nós Corremos Como Um). Entre novembro de 2019 e janeiro de 2020, o jogador Mario Balotelli foi vítima de episódios de racismo no campeonato italiano, com torcedores da Lazio e do Hellas Verona imitando sons de macaco. As ofensas vieram até do próprio presidente do Brescia, clube do craque. “Ele é negro, o que devo dizer? Está trabalhando para se clarear, mas está com dificuldades”, ironizou Massimo Cellion em uma coletiva de imprensa.

“Fama e recordes quebrados nunca serão iguais àquilo que eu mais valorizo: minha família” Madonna, cantora (Crédito:Divulgação)

Um grupo formado por jogadores italianos negros protestou e a liga emitiu uma nota, se desculpando. “Sem justiça, sem paz”, publicou Balotelli em uma rede social. O jogador de basquete LeBron James é um ídolo dentro e fora das quadras da NBA, a liga americana. Com cerca de 137 milhões de seguidores nas redes sociais, assumiu o papel de líder de uma geração de esportistas. O camisa 23 do Los Angeles Lakers é símbolo da luta contra o racismo dentro de um campeonato onde há mais de 70% de jogadores negros. Em 2018, foi atacado pela apresentadora de TV Laura Ingraham, da Fox News, após opinar sobre ações do presidente Donald Trump. “LeBron deveria calar a boca e apenas jogar basquete”, disse a âncora. Inspirado por Colin Kaepernick, ex-jogador de futebol americano da NFL que se ajoelhou durante o hino nacional para protestar contra a violência policial que atingia os negros no país, LeBron respondeu a ofensa criando a campanha “Eu sou mais que um atleta”. Hoje, o movimento conta com nomes como a tenista Serena Williams e o jogador Kylian Mbappé. A representatividade é apontada como fator fundamental para a mudança, segundo especialistas. “Quando estrelas do esporte ou artistas se posicionam politicamente, atingem grupos que não acompanham política, o que gera reflexões e pensamentos sobre esses temas”, afirma Rosane Borges, pesquisadora e pós-doutorada em Ciências da Comunicação. Para amplificar o poder de sua voz, Lebron James acaba de negociar o investimento de US$ 100 milhões para a criação de uma empresa de mídia com o objetivo de dar voz aos menos favorecidos e exaltar a comunidade negra. Além disso, através da ONG “Fundação da Família LeBron James”, criou a instituição de ensino Eu prometo’, escola com suporte gratuito para mais de 200 crianças carentes em Akron, Ohio, seu estado natal.

“Eu concorreria pelo partido republicano se Trump não estivesse lá, mas retirei meu chapéu vermelho. Vou concorrer como independente” Kanye West, rapper e empresário (Crédito:Divulgação)

Fama e ativismo

Surpreendendo até seus fãs, Kanye West, rapper e empresário norte-americano, afirmou que vai concorrer ao cargo de Presidente dos Estados Unidos em 2020. Depois de Barack Obama, o músico e produtor sonha em ser o segundo representante negro no mais alto cargo político no país. A data do anúncio de sua candidatura foi simbólica: 4 de julho, Dia da Independência dos EUA.

O apoio do cantor a Donald Trump chocou a comunidade negra americana. Acostumado a polêmicas, o artista garante agora que rompeu com o presidente e, embora guarde afinidades com o partido republicano, afirmou que será um candidato independente.

A união mantém o coletivo forte. Respeito é tudo” Beyoncé, cantora e empresária (Crédito:Divulgação)

Mesmo sem a candidatura 100% confirmada, Kanye já possui apoio dos fãs e até de bilionários como o empresário Elon Musk. “Os influenciadores digitais negros iniciam micro-revoluções em seus canais de mídia ou lugares de fala, e esse movimento viraliza”, aponta Adriana Barbosa, criadora da Feira Preta e empresária de sucesso no Brasil. “As pessoas querem ser como seus ídolos”, completa Rosane Borges. Conhecida mundialmente, a cantora Beyoncé é um símbolo de empoderamento para seus mais de 100 milhões de seguidores. Em 2016 durante a final do Super Bowl 50, assistido por mais de 112 milhões de telespectadores, ela apresentou a música “Formation”, cuja letra retrata as mazelas do racismo nos EUA. Vestida de preto e com uma coreografia em forma de “X” , referência ao ativista Malcolm X, foi a maneira que Beyoncé encontrou para espalhar uma mensagem cada vez mais universal: o mundo não aceita mais o racismo.

Muhammad Ali, gigante da política

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Considerado um dos maiores nomes da história do Boxe, Muhammad Ali não era um gigante apenas nos ringues. Batizado como Cassius Marcellus Clay Jr, o norte-americano tornou-se campeão olímpico com apenas 18 anos, em 1960. Mesmo sendo um atleta de elite e acumulando vitórias em seu cartel, Clay não conseguiu se esquivar do racismo. Aos 22 anos, converteu-se ao islamismo e mudou seu nome de batismo, defendendo que era “seu nome de escravo”, para Muhammad Ali. Em 1967, Ali se recusou a servir ao exército para lutar na Guerra do Vietnã, afirmando que combater o racismo nos EUA era mais importante. O gesto custou sua licença como lutador, mas o tornou um símbolo na luta racial. Três anos depois de seu afastamento, voltou aos ringues, ganhou títulos mundiais e cravou seu nome como ativista e um dos maiores atletas da história.