À SANGUE FRIO Maiara Oliveira, 26 anos, foi morta na frente da filha por dois homens encapuzados na cidade de Cariacica: vingança cruel (Crédito:Divulgação)

Na quarta-feira 11, o deputado estadual do PSL no Espírito Santo capitão Assumção usou a tribuna da Assembleia Legislativa do estado para promover uma forma repudiável de fazer justiça: com as próprias mãos. “Tenho 10 mil reais aqui do meu bolso para quem mandar matar esse vagabundo, isso não merece estar vivo não. Eu tiro do meu bolso quem matar esse vagabundo aí. Não vale dar onde ele está localizado, não, tem que entregar o cara morto, aí eu pago”, disse ele. O policial militar se referia ao assassino da operadora de telemarketing Maiara Oliveira, de 26 anos, que foi morta na frente da filha por dois homens encapuzados na cidade de Cariacica. O caso ainda está sendo investigado pela Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Mulher (DHPM). A suspeita é que Maiara tenha sido morta por vingança, pois há cerca de um ano o seu namorado foi assassinado e ela ajudou a polícia na investigação. Ameaçada, ela havia se mudado para Minas Gerais e retornado recentemente ao município onde foi morta.

Independente de quem seja o responsável pelo gravíssimo crime, uma coisa é fato: o Estado brasileiro protege a vida pelo artigo 5º da Constituição: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida”. Sendo assim, além de violar o Estado Democrático de Direito, o deputado, com as palavras disparadas em plena Casa do Povo capixaba, cometeu um delito: o artigo 286 do Código Penal brasileiro tipifica a incitação pública à prática de crime, prevendo como consequência a detenção de três a seis meses, ou multa. Por ser deputado, o militar conta com imunidade parlamentar, que lhe assegura expressar ideias e opiniões, e com imunidade formal, que torna o processo passível de suspensão caso haja entendimento do parlamento. Mesmo assim, ele pode responder criminalmente e também diante da Corregedoria da Assembleia Legislativa. O Ministério Público do Espírito Santo já está acompanhando o caso e a OAB do estado mandou um ofício para a Assembleia. Além disso, a Procuradoria da Assembleia acionou a Corregedoria para apurar o caso. Em sessão na terça-feira 17, três deputados saíram em defesa de Assumção, com o argumento da imunidade parlamentar.

Contradições

Em entrevista por telefone à ISTOÉ, o posicionamento do capitão em relação a sua fala é confuso. Ele afirma que não muda de opinião e que não se arrepende do que disse. Segundo ele, sua fala se restringiu apenas ao agente público que age em legítima defesa (dessa forma, portanto, ele se defende de um processo, já que, essa morte é prevista e autorizada por lei). Depois, porém, o deputado voltou a afirmar que daria sim a recompensa para qualquer pessoa que matar o assassino: “se você realmente souber e quiser responder criminalmente, eu vou pagar.” A mesma contradição acontece em relação a um vídeo que ele postou na semana passada em seu Instagram. Nele, um homem não identificado, localizado em frente a um brasão da Polícia Civil do Estado de Goiás, afirma que daria R$ 10 mil para quem trouxer a orelha de quem assaltou a sua filha, e R$ 30 mil para quem matá-lo: “ladrão bom é ladrão morto”, diz o sujeito. Questionado sobre a publicação do vídeo e a nova incitação ao crime, o capitão Assumção afirmou na entrevista que o havia recebido em um grupo de WhatsApp: “Vai ter que criar um país para prender tanta gente que pela primeira vez, em muito tempo, se manifestou sobre como eles gostariam que o Estado brasileiro agisse. São milhares de pessoas”, diz ele. Após a entrevista, no entanto, o deputado apagou o vídeo de suas redes sociais.

O capitão Assumção é um bolsonarista radical que com seu discurso agrada um eleitorado de extrema direita. Defende a instituição da pena capital para crimes hediondos por votação popular, além de se declarar contra ideologia de gênero nas escolas, anti-drogas e pró-vida. São inúmeros os comentários em suas redes sociais apoiando o seu posicionamento. Policial militar, o deputado tem como religião a pentecostal Igreja Cristã Maranata (ICM). Para defender o seu posicionamento, cita trechos da Bíblia e afirma que o perdão deve existir apenas no plano espiritual: “bandido bom não está aqui. Ou está com Jesus ou com o capiroto.” Em 2017, ele foi recolhido ao presídio militar da PM-ES por acusações como motim e desrespeito a ordem de superior durante uma greve da PM que deixou 219 mortos no estado. Casado e pai de três filhos, costuma trabalhar de farda.

 

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