Duas providências na área da segurança pública foram anunciadas na semana passada pelo governo federal. Uma é excelente, visa ao futuro e, se levada a sério por aqueles que devem implementá-la, poderá mudar a situação da violência no País – caso contrário, se quedará no mundo da utopia. A outra providência tomada é somente cantilena e mise-en-scène. Vamos a elas. A primeira: a Secretaria de Assuntos Estratégicos leva o mérito de ter feito um estudo inédito e corajoso sobre o impacto socioeconômico advindo do alto número de jovens (entre 13 e 25 anos) assassinados no Brasil. O estudo transpira frieza e pragmatismo, mas é bom lembrar que trabalhos desse tipo derrubaram a escalada de homicídios em outros países, sobretudo nos EUA. Ao invés de ficarmos apenas no campo da comoção, o estudo aponta para a imprescindível necessidade de o Estado fornecer condições dignas de vida aos jovens mais vulneráveis (os pobres), se quisermos salvar a economia brasileira como um todo. Nas últimas duas décadas, o Brasil perdeu R$ 450 bilhões em capacidade produtiva: equivale ao quanto os jovens assassinados renderiam em produtividade (trabalho), se estivessem vivos. Tais mortes retiram anualmente do PIB cerca de 4%.

R$ 450 bilhões é quanto o Brasil deixou de ganhar em duas décadas, em produtividade, devido ao alto índice de homicídios de jovens

Eis uma razão gelada e pragmática, como é a economia (e que nem por isso deixa de ser boa razão), para derrubarmos o alto índice de homicídios. A segunda medida, a que é pura encenação, trata da criação do Sistema Único de Segurança (mais um SUS) – tanto que a seu repeito as autoridades nada têm além de um decreto. O que precisa é unificar as polícias em cada estado, isso sim. Esse novo SUS terá verbas originadas das loterias. O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, ameaçou não repassá-las ao estado que não lhe fornecer informações sobre a criminalidade – imaginávamos que isso já lhe fosse repassado em função de seu cargo. Em tempo: o ministro tem o dever de elucidar a execução de Marielle Franco. Ministro, na quinta-feira 14 o assassinato fez três meses e até essa data as investigações não deram em nada. Esse é um assunto que diz respeito ao senhor e ao seu ministério.

4% é quanto o PIB do País vem perdendo, por ano, com a saída de jovens mortos do mercado de trabalho

CORRUPÇÃO
Cristiane Brasil não pode pisar o Ministério do Trabalho

João Ricardo/PTB

Cristiane Brasil, filha do ex-deputado Roberto Jefferson, já foi indicada para ocupar o Ministério do Trabalho – acabou impedida por ter contra ela ações (justamente) na Justiça do Trabalho. Agora Cristiane foi proibida pelo STF até de pisar a sede do Ministério: é acusada de integrar organização criminosa que fraudava registros de sindicatos. Também não pode falar com outros investigados. Estranho: não pode falar, mas foi autorizada a ir à festa de aniversário do pai, que é um dos envolvidos no caso.

STF
Cai a condução coercitiva para investigados

Sergio Lima

Resolve-se uma insegurança jurídica, cria-se outra – inevitável num País em que leis menores trombam com a Constituição. O STF proibiu a condução coercitiva de investigados para prestar depoimentos. Fixou assim o princípio da presunção de inocência. Isso fará crescer, no entanto, o número de pedidos de prisão temporária para obrigar a pessoa a depor. Crescerá então, também, a concessão de habeas corpus: pedidos de prisaõ temporária não são plenamente fundamentados, até porque a pessoa só está sendo investigada. Como pode ser presa?

* O STF ampliou a restrição do foro privilegiado para ministros (como já o fez para parlamentares). Só tem foro especial ministro que cometer crimes durante o mandato e correlatos a ele. Já foi para 1ª instância o inquérito que investiga o ministro Blairo Maggi (foto).

DEMOCRACIA
Em defesa da imprensa livre

Daniel Marenco

A liberdade de imprensa, assegurada pela Constituição, vem sendo massacrada. Daí a importância da fala da ministra Cármen Lúcia, presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça. “Sem imprensa livre, o Poder Judiciário e o Estado não funcionam bem”, disse ela no seminário sobre os trinta anos anos de vigência da Constituição, organizado pelo CNJ. Dados dessa entidade, levantados junto a 2.373 processos contra a imprensa, apontam que 25% deles são responsabilidade da Justiça Eleitoral. Na Justiça estadual tramitam 68,7%. Os números foram fornecidos pelas associações Nacional de Jornais, Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, Brasileira de Jornalismo Investigativo.

IMIGRAÇÃO
Europa revive anos que antecederam a II Guerra

Kenny Karpov

Pontuada por países que optam por políticas nacionalistas, fechando os seus portos às embarcações com refugiados, a Europa vive a sua maior crise diplomática envolvendo a imigração. O governo italiano não recebeu um barco com 629 pessoas a bordo, alegando que 700 mil imigrantes já desembarcaram em Lampedusa nos últimos anos – sabe-se que o novo primeiro-ministro, Giuseppe Conte, assumiu o cargo para trancar as portas da nação. O presidente da França, Emmanuel Macron, disparou: “a decisão italiana me dá náusea”. Macron não se compadece dessa gente à deriva no mar, aquilo que o move é a disputa com a Itália pela hegemonia conservadora. Conte respondeu: “Macron é hipócrita”. Socorridos por ONGs, os imigrantes rumaram à Espanha, que se ofereceu para acolhê-los. Macron e Conte se desculparão, mas novos confrontos virão. Não há solução (só impasse) na crise de refugiados. Nada diferente do que ocorreu, também numa Europa pintada com tons nacionalistas, nos anos que antecederam a Segunda Guerra Mundial.