A política tradicional muitas vezes cultiva o péssimo hábito de ignorar os sinais emitidos pelos eleitores. Em vez de tentar compreendê-los, procura adaptar as regras como forma de contrariá-los. Ao estabelecer como se dariam as eleições deste ano, os políticos diminuíram radicalmente o período da campanha. Reduziram o tempo de propaganda na TV e nas rádios. Ao proibirem a possibilidade de financiamento de empresas, impuseram um modelo em que a principal fonte de recursos foi o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, coordenado pelos caciques de cada partido, que distribuíram o dinheiro com a clara lógica da perpetuação no poder. Os caciques deram com os burros n’água. A renovação do Senado foi impressionante: 85%. A da Câmara, igualmente muito maior do que se esperava: mais de 40%.

“Do ponto de vista de renovação, é um sentimento correto”, resigna-se o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), derrotado pela reeleição. Ele considera que é algo semelhante ao que aconteceu na Argentina após a crise de 2001, quando diversas pessoas foram às ruas gritando o slogan: “Que se vayam todos!” (Que se vão todos). A senadora Ana Amélia (PP-RS), que retorna para casa derrotada como candidata a vice-presidente na chapa de Geraldo Alckmin (PSDB), alerta que os recados das urnas precisam ser compreendidos pelos políticos. “As redes sociais produziram uma velocidade muito maior à reação das pessoas. E, com elas, cada cidadão ganhou uma ferramenta muito maior de pressão”, avalia ela.

Na Câmara, foram eleitos 269 novos deputados.
No Senado, a renovação foi de 80%: só 8 senadores se reelegeram

Embora o índice de mudança no Senado tenha sido surpreendente, somente 20 dos ocupantes das 54 cadeiras oferecidas no pleito deste ano são realmente neófitos no Legislativo. Na Câmara, ocorre a mesma coisa. Das 513 vagas para deputado federal, houve uma renovação de 269, mas somente 141 nunca ocuparam cargos eletivos ou exerceram algum cargo comissionado em governos estaduais. O único fato certo é que a nova silhueta do Congresso será mais conservadora. O partido de Bolsonaro, hoje com apenas oito deputados, elegeu nada menos que 52 novos deputados. Houve espaço também para outras louváveis iniciativas na política. O movimento RenovaBr, liderado pelo empresário Eduardo Mufarrej, conseguiu eleger 16 deputados.

Na avaliação do diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, um recorte será mais latente na Câmara, onde os novatos têm origem nas lideranças evangélicas e no estilo de policial linha-dura. Para ele, além da adesão à onda bolsonarista, a renovação foi um castigo para os políticos que tentaram evitá-la. “Foi uma resposta à ação dos parlamentares que tentaram blindar a renovação com uma série de reformas que favoreciam a eles”, analisa.

Embora a legislação tenha determinado que 30% das candidaturas fossem preenchidas por mulheres, reportagem de ISTOÉ na edição de 30 de setembro mostrou que poucos recursos do Fundo Eleitoral irrigaram suas campanhas. Mesmo assim, elas aumentaram sua participação. De 51 mulheres na atual legislatura, serão 77 deputadas federais no ano que vem. No Senado, das 54 cadeiras, sete serão ocupadas por mulheres. É o caso, por exemplo, de Leila do Vôlei (PSB-DF) e da juíza Selma Arruda (PSL-MT).

O eleitorado impôs o novo através das urnas. Num desejo de mudança que não é apenas de troca de nomes, mas de padrão de comportamento na política. O eleitor espera, agora, que o novo não envelheça.