Sem formação ou estudo na área do estilismo, Kelvin Mendes, de 25 anos, se tornou um dos mais requisitados especialistas em vestir — o que, no caso das mais ousadas, é apenas um modo de dizer — as musas do Carnaval brasileiro. Quando terminou o ensino médio, seu maior sonho era ser veterinário, mas, por falta de dinheiro, acabou fazendo um bico no ateliê de um amigo. Cinco meses foram suficientes para não querer mais sair do ramo. Começou como uma brincadeira, desenhando e fazendo roupas e vestidos para drag queens. As postagens no Instagram viralizaram e acabaram chegando a modelos, cantoras e assistentes de palco. “Tudo depende de se ter bons contatos”, diz Kelvin. Este ano, ele vai vestir dez destaques de Carnaval, entre rainhas e madrinhas de bateria de diversas escolas. Entre suas clientes mais fiéis estão as cantoras Wanessa Camargo e Lexa, e as modelos Livia Andrade, Dani Bolina e Tati Minerato.

AS CLIENTES Wanessa Camargo, Priscila Canhoto, Dani Bolina e, abaixo, Tati Minerato: brilho e penas verdadeiras (Crédito:Divulgação)

 

Divulgação

Em comparação com outros estilistas, a estrutura de trabalho de Kelvin ainda é modesta. Afinal, ele começou há apenas três anos em um cômodo da casa da família em Osasco, na Grande São Paulo. Recentemente, comprou um espaço maior no bairro de Itaquera, Zona Leste da capital paulista. Ele faz as fantasias sozinho, do croqui ao acabamento final. As mais caras chegam a custar R$ 20 mil. Há dois modelos de contrato. Em um, a cliente usa a peça em um desfile e depois a devolve. Em outro, ela pode incorporar a roupa ao seu acervo pessoal. A cantora Lexa, por exemplo, uma de suas clientes mais fiéis e até hoje amiga íntima, já lhe causou transtorno certa vez, pois deixou de devolver um vestido feito por ele — e que já tinha sido vendido para outra pessoa. “Foi um bafafá que acabou na demissão do personal stylist de Lexa, que era quem deveria ter restituído a peça”, diz Kelvin. No ano passado, tomou um calote de R$ 15 mil reais de uma cliente famosa, cujo nome ele não revela. “Pode ter certeza que nunca mais trabalho com ela”, garante.

O estilista-revelação não tem medo do politicamente correto. Todas as penas que ele usa nas fantasias são verdadeiras. “Quem fala que usa apenas penas artificiais está mentindo, isso não existe. Nunca sofri retaliações e espero não sofrer. Sou amigo da Luisa Mell (ativista dos direitos dos animais) e ela nunca me falou nada. Acredito que ela saiba que isso é meu trabalho”, diz Kelvin, que enquanto fala corre para finalizar alguns detalhes dos últimos vestidos que devem ser entregues até sábado de Carnaval. Ele pede para suas clientes um intervalo de uma semana para aprontar a fantasia, mas abre exceções. Se uma delas ligar para ele na sexta, pedindo o vestido para o dia seguinte, ele faz. O estilista guarda até hoje, em suas araras, a sua peça favorita — em estilo sertanejo, com muito brilho, chapéu e bota —, que foi usado pela madrinha da Dragões da Real, a modelo Tânia Oliveira, no desfile do ano passado em São Paulo.

PRODUÇÃO Kelvin Mendes em seu ateliê, na Zona Leste de São Paulo: ele faz tudo (Crédito:GABRIEL REIS)

“Nós temos uma relação de irmãos. Eu sou a madrinha dele e ele é meu anjo da guarda. Estou muito feliz com o sucesso que ele vem adquirindo. Em um espaço que só tem ego e competição, um querendo se mostrar mais que o outro, encontrar um amigo é muito difícil. Eu sempre divulguei muito o trabalho do Kel e insistia para ele cobrar mais caro pelos vestidos”, diz Tânia. Quando viu o desenho da fantasia sertaneja pela primeira vez, Tânia não teve dúvidas e levou para Kelvin “dar uma mãozinha”. A escola pensou em tons de amarelo e branco, mas a musa foi contra por causa da sua pele clara e do cabelo loiro. Ela e Kelvin passaram a noite grudando pedras na roupa e inovaram colocando cores laranja, dourado e preto. Foi um sucesso. Após 19 anos desfilando, 2020 será o último de Tânia na avenida. E, claro, ela vai brilhar com uma peça de Kel.

Drag carnavalesca

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Apesar de todas as musas desejarem uma roupa melhor que a outra, este ano elas têm feito pedidos parecidos: biquínis e muita transparência. A encomenda mais sensual feita ao estilista foi de Raíssa Barbosa, vice-miss Bumbum e musa da bateria da Unidos do Peruche. É a primeira vez que ela será destaque de chão. “Eu pedi ao Kel uma fantasia bem pelada, pois quero estrear quase nua. A minha vai ter um tapa-sexo bem pequenininho e terá um detalhe surpresa no seio”, revela. Raíssa também conheceu Kelvin pelo Instagram e diz se surpreender com cada peça de roupa que o estilista-revelação faz para ela.

As características mais marcantes de uma peça com a etiqueta ByKelvinMendes são o uso de pedras “boas e verdadeiras”, como cristais, strass e vidro, para dar mais brilho. É o que ele faz desde o começo: misturar o mundo carnavalesco com o das drag queens . É o que ele chama de “Drag Carnavalesca”. As musas adoram soltar a drag que há dentro delas.

 


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