A julgar pela reação do deputado federal bolsonarista Otoni de Paula (PSC-RJ) nas suas redes sociais, o desfile militar fora de época realizado hoje em Brasília cumpriu sua missão: excitar os piriguetes do golpismo.

“Nunca uma simples manobra militar mexeu tanto com o meu patriotismo”, escreveu o deputado. Como diz a música de Caetano Veloso, “olha o menino, ui”. A foto no post de Otoni de Paula era de tanques chineses, mas pelo jeito, se for tanque está bom.

Fora das hostes bolsonaristas, as reações foram bem diferentes. De um lado, indignação com um presidente e um ministro da Defesa, Braga Netto, que insistem em insinuar que podem roubar o poder pelas armas. Além disso, consternação com o fato de as Forças Armadas serem instrumentalizadas dessa maneira ordinária.

Esse último sentimento foi vocalizado pelo general da reserva Santos Cruz. Ele qualificou a parada, cujo objetivo ostensivo era levar a Jair Bolsonaro um convite para assistir a exercícios militares na próxima semana, de “infantilidade absolutamente desnecessária”.

Mais importante, ele disse: “Essa imagem vai ser um vexame nacional e internacional. Vai prejudicar de maneira incalculável a imagem, o prestígio, a confiança nas Forças Armadas.”

Santos Cruz tem razão. Forças Armadas que aceitam participar de uma pantomima como a de hoje não inspiram confiança.

Ou imaginemos, por um instante, que tudo tenha sido feito com o melhor dos propósitos. Forças Armadas que se deixam atrair por um presidente sem escrúpulos para uma armadilha política desse calibre também não inspiram confiança.

O simples fato de o almirante Almir Garnier, comandante da Marinha, ter-se visto compelido a explicar o passeio dos tanques e garantir que ele não teve segundas intenções mostra que houve um estrago.

A fala de Santos Cruz reitera o que é sabido: que muitos oficiais da ativa e da reserva, provavelmente a maioria, execram a maneira como Bolsonaro tenta arrastar as Forças Armadas para o teatro da política.

Mas também é fato que uma falange militar, hoje encabeçada pelo ministro Braga Netto, de mãos dadas com o presidente, acredita ter o direito de tutelar a sociedade brasileira, se necessário atropelando-a com blindados.

Essa falange está passando a perna nos militares que preferem se ater à verdadeira missão institucional das Forças Armadas. Está fazendo a corporação ser vista, mais uma vez, como risco para a democracia e as instituições brasileiras.

É difícil saber com exatidão o que se passa no interior do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. É provável que os militares bolsonaristas não sejam mais do que um grupo barulhento, incapaz de empurrar as Forças Armadas para qualquer aventura.

Mas estamos falando de imagem. E nesse caso, parafraseando a velha máxima sobre a mulher de César, não basta que as Forças Armadas sejam confiáveis, é preciso também que pareçam confiáveis.