O nome do partido União Brasil, um dos maiores do país, não é por acaso. Em 2022, a fusão das siglas PSL (Partido Social Liberal) e Democratas deu origem a uma agremiação com poder ampliado no Congresso. Três anos mais tarde, o presidente da legenda, Antônio Rueda, é empurrado de volta ao noticiário por circunstâncias mais delicadas.
Rueda ordenou na quinta-feira, 18, que todos os membros do União Brasil deixassem seus cargos no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dentro de 24 horas. O rompimento acontece após o líder partidário ser incluído nas investigações da Polícia Federal sobre a Operação Carbono Oculto, que investiga a infiltração do PCC (Primeiro Comando da Capital) nos setores financeiro e de combustíveis.
O desgaste com o Palácio do Planalto, no entanto, vem de antes. Aprovada na terça-feira, 16, a PEC (Proposta de Emenda de Constituição) da Blindagem contou com 53 votos a favor e apenas quatro contra por parte da legenda. Não foi a primeira vez que a bancada deu maioria a um projeto desagradável ao governo.
Neste texto, a IstoÉ explica as conexões existentes entre esses episódios.
Blindagem tem sangue do União nas veias
A proposta conhecida como “PEC da Blindagem” foi aprovada na última semana em primeiro turno, por 353 votos a 134. Os deputados vão analisar as sugestões de alteração no texto antes da pauta ir a votação no segundo turno. Caso seja aprovada novamente, a PEC deve seguir para o Senado.
Em resumo, a proposta da blindagem passa a exigir autorização do plenário das Casas legislativas para que o STF (Supremo Tribunal Federal) possa abrir processos contra os parlamentares. A repercussão popular foi majoritariamente negativa, com discursos de contradição na “blindagem” de políticos pelos próprios políticos.
A PEC existe desde 2021 e é de autoria de Celso Sabino, hoje ministro do Turismo de Lula — o único filiado ao União Brasil na Esplanada do petista. Conforme apuração da IstoÉ, Sabino deve atender à decisão do partido e pedir demissão do cargo até o final da próxima semana.

Celso Sabino (União Brasil): ministro de Lula é autor de texto original da PEC da Blindagem
Vale lembrar que a primeira investida pela proposta se deu às vésperas da megaoperação da Polícia Federal contra o PCC, em movimento lido por analistas como um esforço para blindar parlamentares das investigações. Na votação, o União demonstrou apoio pesado à pauta, ficando atrás apenas do PL (Partido Liberal) na quantidade de votos a favor.
Rueda na mira
As ligações entre a Operação Carbono Oculto e o apoio à PEC da Blindagem voltaram à baila quando Antônio Rueda foi incluso na investigação por suposto envolvimento com o crime organizado.
O piloto Mauro Caputti Mattosinho, de 38 anos, transportador de uma dupla criminosa ligada ao PCC, afirmou à PF que o presidente do partido estaria entre os donos de quatro jatos executivos operados pela empresa de táxi aéreo da facção. A declaração foi dada durante entrevista ao canal ICL Notícias. Conforme o piloto, Rueda era mencionado por seu chefe como o líder de um grupo que “tinha muito dinheiro que precisava gastar” na aquisição de aeronaves avaliadas em milhões de dólares.
De acordo com o portal UOL e o ICL, duas aeronaves atribuídas a Rueda pertencem a fundos de investimentos que têm apenas um controlador final, cujo nome não é divulgado em documentos públicos.
O dirigente negou as informações e afirmou ser alvo de acusações “irresponsáveis sem fundamento”. “O que há, sim, é um pano de fundo político nestas leviandades, que estão sendo orquestradas, usando-se uma operação policial séria, para atacar adversários”, concluiu.
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Os ‘peixes grandes’ do crime organizado
Com a Carbono Oculto, Polícia Federal e Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) deflagraram a maior investigação contra a atuação de facções criminosas na economia formal do Brasil. Com foco em endereços poderosos da avenida Faria Lima, em São Paulo — principal centro financeiro do país –, a operação escancarou que a presença do crime organizado superarou há tempos o narcotráfico.
Só na Faria Lima, houve 42 mandados de busca (em empresas, corretoras e fundos de investimentos). Ao todo, 255 empresas são citadas na operação. As investigações apontam para uma dezena de práticas criminosas, desde crimes contra a ordem econômica, passando por adulteração de combustíveis, crimes ambientais, lavagem de dinheiro, fraude fiscal e estelionato.
Os acusados teriam obtido parte do domínio da cadeia produtiva do etanol, da gasolina e do diesel por meio da associação de dois grupos econômicos e ligações com operadores suspeitos de lavar dinheiro para Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder do PCC.
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Ruptura esperada
Rueda enxergou afronta por parte do governo federal na associação ao crime organizado. Um dos autores das reportagens em que ele foi mencionado tem cargo na EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), do governo federal, e o próprio presidente Lula já fez críticas ao dirigente.
A federação União Progressista, que reúne União Brasil e PP, já sinalizou no começo de setembro que romperia com a base petista. A saída, porém, foi antecipada pelo novo episódio.

Lula e Alcolumbre: presidente do Senado é ‘última ponte’ entre governo e União Brasil
A decisão atinge, além de Subino, o ministro André Fufuca (PP), dos Esportes, que ainda não se pronunciou sobre o futuro no cargo. O ministro do Turismo está na Esplanada desde agosto de 2023, quando substituiu a deputada Daniela Carneiro (RJ) por indicação da legenda. Já Fufuca foi nomeado em setembro do mesmo ano, substituindo a ex-voleibolista Ana Moser para ceder espaço ao PP na gestão petista.
Os dois são deputados federais licenciados e devem retornar a suas respectivas bancadas na Câmara se deixarem o governo. Por se tratar de uma decisão partidária, o desembarque poupará, a princípio, os ministros das Comunicações, Frederico Siqueira Filho, e da Integração Regional, Waldez Góes. Ambos foram indicados pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).