Sete meses sem palco. Quando tudo começou, a cadeia do entretenimento sabia que seria uma das mais afetadas. E, dentro de seus setores, os músicos pressentiam que a vida não seria fácil nem depois que uma reabertura decretasse a retomada dos espaços de show. Afinal, quanto tempo levará até que as plateias se sintam confiantes para dividir um mesmo espaço de novo? Surgiram o movimento das lives, as redes de solidariedade e até uma lei, a Aldir Blanc, para o salvamento pontual dos artistas mais vulneráveis desde as suspensões de seus trabalhos.

Mas, então, os palcos não reabriram, o efeito das lives se esgotou e o modelo drive-in não se acomodou aos shows como tem feito com filmes e espetáculos teatrais infantis. E para onde vão os músicos? Segundo as experiências dos mais ousados, para o próximo passo, usando as redes para divulgar trabalhos que voltam a lidar com o conceito de espetáculo, expandindo as possibilidades das lives passivas do estágio inicial.

A cantora Tchella traz em seu DNA uma capacidade de reinvenção que o novo mundo pede cada vez mais. Ela fez circo, teatro de rua, teatro infantil, cinema e performance até lançar, em 2018, o álbum autoral Transmutante. Seus shows produzidos em casa com uma mistura de linguagens ajudaram a trazer 100 mil playes no Spotify, o que garante R$ 243 em royalties e uma receita de quase R$ 8 mil proveniente das frentes abertas com suas produções, como uma lojinha de artigos acessada por meio de um QR Code durante as exibições. “Estou conseguindo transformar a rede em um palco online. O show é o encontro das presenças, do público com o artista, e o problema é quando o artista não estuda suas apresentações como uma linguagem específica. Eu e meu marido estamos estudando.”

Tchella diz que, em alguns casos, o espaço das lives é mais maleável do que o das grandes áreas físicas. “A espacialidade é bem menor para compor a fotografia. Estou conseguindo fazer coisas mais interessantes no vídeo do que fazia no palco, onde a logística de cenário e do uso de efeitos é muito mais cara.” Há também, ela diz, reações específicas proporcionadas por uma live, como a que houve em um de seus shows em que ela canta de cabeça pra baixo. “Algumas crianças cantaram comigo de ponta-cabeça também, algo que jamais fariam em um teatro.”

A cantora e compositora No Stopa conta que tem feito encontros e ensaios com sua Banda Mirim em aplicativos de videoconferência. “Somos um coletivo de 12 artistas e estamos trabalhando dessa forma, semanalmente, desde o início da pandemia. Pesquisando para a próxima peça, montando cenas e oficinas virtuais para o público e para educadores. Esse material ficará disponível nas nossas redes sociais e será distribuído em escolas públicas e equipamentos culturais que acolherem esse formato.” Ela tem dois singles lançados durante o período, um deles gravado totalmente pelo microfone do celular, na sala de casa, “sem direito a edição de voz e outros truques de estúdio”. Sobre manter o conceito de espetáculo, No diz acreditar no “olhar de fora”. “É essencial ter alguém que cuide da direção artística e cênica, que veja o cenário, encontre a melhor iluminação, figurino, modo de interagir com a câmera. Mesmo com os recursos limitados pela câmera do celular, dá para chegar a um resultado bacana. Tem artista usando cromaqui, inserindo vídeos pré-gravados e descobrindo uma gama de possibilidades. Penso que é um universo que se abre e seguirá mesmo quando os shows voltarem.”

Enquanto a vacina não vem, ela diz que monetiza seu trabalho com o que aparece: “Shows em teatros vazios com transmissão ao vivo, show com público dentro dos carros, live em estúdio pra equipamentos culturais, show virtual em plataformas como o Sympla”. Contudo, sente que o tempo ainda não é do vislumbre. “Parece um sonho. Eu tô tentando criar memórias leves para levar desses dias.”

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O produtor e cantor Fee Rocha, que lançou há uma semana o clipe e a canção Era de Esperar, diz que o caminho é “explorar tudo para manter o público perto mesmo de longe”. “O sentido de tudo sempre será passar a mensagem e o sentimento. Em tempos de live, que não temos a aproximação com o público, penso que nós artistas temos de nos esforçar ainda mais para termos a atenção do público em casa. É um desafio, acho que mentalizar o público junto e fazer de tudo isso algo natural é um bom caminho.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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