TRIUNFO DA MORTE Tela do pintor Hieronymus Bosch: o horror da Peste Negra (Crédito:Divulgação)

O microorganismo mais destrutivo da história da humanidade, até agora, tem nome e sobrenome: Yersinia pestis. Trata-se da bactéria causadora da Peste Negra, o evento epidêmico mais letal de que se tem notícia, responsável pela morte de 75 a 200 milhões de pessoas na Europa e na Ásia, no século 14. Transmitida por pulgas de rato, ela dizimou 30% da população mundial na época. Antes disso, a bactéria tinha feito estragos no período romano, causando a chamada Praga de Justiniano, no ano 541, e na Grécia Antiga, onde relatos de historiadores dão conta da chamada Praga de Atenas, no ano 430 a.C. Recentemente, um grupo de pesquisadores encabeçado pelo geneticista evolutivo Eske Willerslev, do Centro de GeoGenetics da Universidade de Copenhague, descobriu em escavações arqueológicas na Suécia que uma cepa da bactéria é muito mais antiga do que se imaginava. Ela acompanha e mata seres humanos há mais de cinco mil anos, desde a Idade do Bronze (3.300 a 700 a.C.), quando a agricultura começava a ser praticada em diversas partes do planeta.

O estudo, que envolveu também pesquisadores franceses e suecos, analisou 101 esqueletos com milhares de anos, originários da Europa Ocidental e da Ásia Central. Em amostras de DNA retiradas dos dentes de sete deles, a bactéria foi identificada. O mais antigo dos restos mortais, com cerca de 5,7 mil anos, era de uma mulher jovem que estava em uma tumba de calcário na Suécia em que outras 77 pessoas foram enterradas juntas. A cova coletiva, segundo os cientistas, pode indicar que as pessoas tenham morrido por causa de uma epidemia. A Yersinia pestis causa diferentes formas de pestes, como a septicêmica, a pneumônica e a bubônica. Na Idade do Bronze, ela ainda não tinha a mesma letalidade demonstrada posteriormente e não era transmitida pelas pulgas de ratos, mas, provavelmente, por gotículas de saliva. Os cientistas compararam os genomas das bactérias encontradas nos corpos descobertos nas escavações com outras variedades da Yersinia, como a Yersinia pseudotuberculosis, e concluíram que se trata da versão mais antiga do micróbio.

Ontem, como hoje

A eclosão das primeiras epidemias coincide com o momento em que o ser humano começava a se assentar em comunidades agrícolas e surgiam as primeiras rotas comerciais, assim como os veículos de tração animal, que ofereciam condições tecnológicas ideais para a disseminação de doenças em vastas regiões. O mapeamento geográfico da Yersinia pestis mostrou que as origens mais primitivas do microorganismo remontam à região onde vivia um grupo neolítico chamado Cucuteni, que corresponde hoje à Romênia, à Moldavia e à Ucrânia. Os Cucuteni formavam comunidades agrícolas em que viviam entre 10 mil e 20 mil pessoas e circulavam pelo continente europeu, avançando até a Sibéria e a Escandinávia, o que possibilitou sua chegada à Suécia. Alguns pesquisadores atribuem a diminuição da população européia verificada no período à propagação de várias doenças originárias em outras regiões e ao adensamento populacional. De alguma maneira, o desenvolvimento das epidemias no passado não é muito diferente do que acontece atualmente.