Os candidatos socialdemocratas Sandra Torres e Bernardo Arévalo se enfrentarão pela Presidência da Guatemala, após um surpreendente resultado no primeiro turno eleitoral de domingo(27).

A ex-primeira-dama ficou em primeiro lugar com 15,78% dos votos, como previam as pesquisas, mas o deputado Arévalo surpreendeu ao ficar em segundo com 11,8%, apesar de nunca figurar entre os favoritos, mas em oitavo lugar nas pequisas.

“Nós não aparecíamos nas pesquisas, mas sempre dissemos que não venceríamos nas pesquisas, venceríamos nas urnas”, disse Arévalo na noite de domingo.

Sociólogo de 64 anos e filho do ex-presidente reformista Juan José Arévalo (1945-1951), nasceu em Montevidéu, Uruguai, onde seu pai se exilou após a queda de seu sucessor Jacobo Árbenz, em 1954.

“Veja a surpresa que foi esta eleição presidencial”, tuitou o advogado e analista político Edgar Ortiz, ao destacar a votação de Arévalo, candidato do movimento Semilla.

– “Não o conhecíamos” –

O deputado Arévalo não apenas surpreendeu a seus 21 concorrentes na corrida presidencial e a analistas, mas também a muitos guatemaltecos que nunca haviam ouvido falar nele.

“[Estamos] impressionados porque não o conhecíamos”, disse à AFP Isabel Santos, dona de casa de 38 anos, no centro da capital, onde muitas pessoas liam jornais com curiosidade.

“O sentimento que tenho é o de muitos guatemaltecos, felicidade, pelo fato de que não predominam os candidatos que não vinham fazer o bem, mas continuar a corrupção que se vive no país”, indicou à AFP o taxista Erick García, de 41 anos.

Na madrugada desta segunda-feira, com a contagem de 90% dos votos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) anunciou que a tendência era “praticamente definitiva” e ao meio-dia confirmou que os resultados eram “imutáveis”.

“Se chegar a mudar será uma quantidade insignificante”, indicou a presidente do TSE, Irma Palencia, após a apuração de 98% dos votos.

– “Voto nulo, o vencedor” –

Outra surpresa das eleições foi a grande quantidade de votos nulos, 17,38%, mais que os votos conquistados por Torres e quatro vezes mais que os anulados no primeiro turno de 2019.

“É uma oposição ao sistema”, expressou a titular do TSE.

“Definitivamente, o vencedor é o voto nulo e isso […] é a insatisfação do cidadão em relação ao sistema”, declarou Edie Cux, diretor do braço local da ONG Transparência Internacional, à rádio Emissoras Unidas.

Os guatemaltecos votaram sem grandes ilusões de superar a pobreza, violência e corrupção que assolam o país, após uma campanha marcada pela exclusão de candidatos e a perseguição à imprensa.

O vencedor da votação do próximo 20 de agosto sucederá o presidente direitista Alejandro Giammattei, que chega ao fim de seu mandato com 76% de desaprovação, segundo a empresa ProDatos.

Cerca de 9,4 milhões de cidadãos estavam habilitados a votar, mas compareceram somente 60%, em linha com as eleições de 2019, segundo dados oficiais.

– Eleições legislativas –

Arévalo se mostrou prudente em relação à votação, enquanto Torres se declarou confiante de assumir a Presidência em agosto, apesar das derrotas no segundo turno em 2015 e 2019.

“Com quem seja, vamos ganhar”, declarou a ex-primeira-dama de 67 anos, líder do partido Unidade Nacional da Esperança (UNE).

Também foram eleitos 160 deputados, 340 prefeitos e 20 representantes do Parlamento Centro-americano, mas a contagem destes votos ainda não terminou.

Quem quer que seja o vencedor da eleição marcará uma virada ideológica no país após três presidentes de direita: Otto Pérez (2012-2015), Jimmy Morales (2016-2020) e Giammattei, que deve deixar o cargo em janeiro de 2024.

O partido Vamos de Giammattei deve ser a bancada majoritária no Congresso de 160 cadeiras, ao eleger 40 deputados, segundo uma projeção do diário Prensa Libre. O partido de Torres teria 27 deputados e o de Arévalo, 24.

Nem Torres nem Arévalo prometem legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou o aborto, que só é permitido se houver risco de vida para a mãe.

– Candidatos vencidos –

Em terceiro lugar na disputa pela Presidência ficou o candidato do governo de direita Manuel Conde, com 7,84%. Em quarto, ficou o empresário de direita Armando Castillo (apoiado por um partido evangélico) com 7,37% e em quinto, o centrista Edmond Mulet, com 6,78%, segundo o TSE.

A direitista Zury Ríos, filha do ex-ditador Efraín Ríos Montt, ficou em sexto lugar, com 6,68%. Ela e Mulet figuravam atrás de Torres nas pesquisas anteriores.

O TSE registrou cinco incidentes, em dois deles, a polícia lançou gás lacrimogêneo para dispersar protestos por supostas irregularidades nas eleições.

O sistema democrático navega por águas turbulentas na Guatemala, com controle do governo sob o Judiciário, perseguições a jornalistas e promotores anticorrupção, além de exclusão de candidatos como o empresário de direita Carlos Pineda e a indígena de esquerda Thelma Cabrera.

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