O Senado aprovou nesta terça-feira o texto base do projeto de lei contra as fake news. O placar foi de 44 votos favoráveis e 32 votos contrários ao texto costurado pelo relator Ângelo Coronel (PSD-BA), que examinou nada menos que 152 emendas e incorporou integral ou parcialmente o conteúdo de 92 delas.
Boa parte dos senadores que ficou contra o projeto preferia que ele tivesse sido votado presencialmente, depois da pandemia.
Argumentaram que não houve uma audiência pública, com participação de entidades da sociedade civil, o que é verdade.
Também disseram que faltou tempo para estudo do assunto – o que não procede. O grande número de emendas apresentadas já indica que os gabinetes trabalharam com afinco sobre o tema. Além disso, na semana passada cumpriu-se o rito de ouvir dez senadores, cinco pró e cinco contra o projeto.
Um segundo tipo de objeção foi que PL cerceia a liberdade de expressão. Mas não é o caso. O principal alvo do projeto são aqueles que operam contas falsas, que promovem disparos em massa ou financiam conteúdos de forma encoberta.
Em outras palavras, ele procura tirar do anonimato quem usa as redes sociais e os aplicativos de mensagens para atacar reputações ou semear confusão. Faz isso criando novas obrigações para as empresas de internet, que precisam coletar e armazenar dados sobre o percurso de cada mensagem, da criação ao compartilhamento.
Havia muito mais riscos para a liberdade de expressão na versão original do texto, apresentada pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania/SE). Primeiro, ela tentava definir o que era desinformação na internet. É o tipo de esforço que sempre cria uma zona cinzenta, onde ficam os conteúdos que não se sabe muito bem se são legítimos ou não. Depois, ela criava uma casta de juízes para os conteúdos: as agências independentes de checagem de fatos, um tipo de empresa que se tornaria incrivelmente poderosa e rentável.
O projeto aprovado deixou tudo isso de lado. Não procura definir o que é discurso correto ou incorreto.
Fake news e outros tipos de conteúdo duvidoso poderão ser excluídos por decisão judicial ou, ainda, por moderação das próprias plataformas, como já acontece. Mas elas terão de definir com transparência seus critérios, além garantir ao autor do conteúdo denunciado a oportunidade de se manifestar.
As partes mais polêmicas do projeto são aquelas que procuram vincular a atividade nos aplicativos de mensagens ao aparelho em que ela ocorre, mesmo quando se trata de telefones celulares. Quem trocar de telefone e não vincular sua conta do WhatsApp ou serviço semelhante ao novo número, vai ser bloqueado. É um esforço para impedir o uso de celulares em disparos em massa, mas não é claro se ele vai ser de fácil operacionalização e se vai realmente impedir que haja fraudes.
O projeto ainda precisa passar pela Câmara. Deverá sofrer mudanças, e talvez aperfeiçoamentos. Mas a aprovação do texto base foi um passo importante para promover o saneamento de um ambiente onde gente de má fé e inimigos da democracia têm operado à vontade.