PÂMELA ROSA Promessa de medalha de ouro, a skatista é a atual campeã mundial de street (Crédito:NELSON ALMEIDA)

O esporte tem o poder de contar um pouco da história da civilização, além de produzir grandes heróis do nosso tempo. A Olimpíada de Tóquio, que se inicia na sexta-feira, 23, será lembrada como um evento único, pelas circunstâncias de sua realização, marcada pela pandemia de Covid-19, pelo adiamento de um ano e pela total ausência de público nas arquibancadas dos estádios. Será única também nos resultados alcançados pelos competidores, que deverão sofrer o impacto desses eventos, alguns de maneira adversa e outros se erguendo das cinzas e expondo a força humana e a capacidade de superação. Se por um lado há certa frustração com as medidas restritivas, por outro existe a oportunidade de melhorar a concentração e se dedicar ao que realmente importa: a disputa. O Brasil vai aos jogos levando 302 atletas, com uma missão ambiciosa de aumentar o número de 19 medalhas conquistadas no Rio de Janeiro em 2016. A aposta do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) é que 20 ou mais pódios sejam alcançados. Além dos esportes em que o País tem tradição, como vôlei, vela e natação, a inclusão de surfe e skate é um trunfo que aumenta a possibilidade de medalhas.

ISAQUIAS QUEIROZ Ele quer se tornar o brasileiro com mais conquistas olímpicas, já tem três pódios (Crédito:Jonne Roriz)

O surfe promete ser uma das sensações em Tóquio. Os brasileiros dominam o circuito profissional do esporte há alguns anos e têm Gabriel Medina e Ítalo Ferreira, ambos campeões mundiais, como os principais nomes. É provável que tragam as medalhas de ouro e prata. Medina, que lidera o circuito atualmente, afirmou nas suas redes sociais que está pronto para o desafio. “Só agradecer e aproveitar o momento, o esforço e a preparação foram feitos. Vamos ser felizes!”, escreveu. Caso não apareça nenhum intruso a fatura é certa para os dois e não importa a ordem das medalhas, quem ganha é o Brasil. Mais um esporte que estreia em Tóquio é o skate. A brincadeira de adolescente é coisa séria para muitos praticantes da modalidade e as mulheres são os destaques. Pâmela Rosa e Letícia Bufoni são as estrelas do street. Letícia é uma lenda, mas não está no seu melhor momento. Por sua vez, Pâmela está no auge e foi campeã mundial em 2019. Outra menina que chama atenção é a skatista Rayssa Leal. Com apenas 13 anos ela é a mais jovem atleta brasileira e tem a companhia da mãe na Vila Olímpica. No meio de tantas mulheres, o skatista Pedro Barros, campeão seis vezes nos X Games, é o favorito no skate masculino. Os outros esportes estreantes em Tóquio são beisebol, escalada e caratê, nos quais o Brasil não tem representantes.

MARTA A jogadora de futebol fez gols nas cinco olimpíadas que participou (Crédito:Andre Penner)

Não só pelo skate, uma das grandes forças do Brasil nessa Olimpíada são as mulheres. Tanto que a judoca Ketleyn Quadros dividirá com o jogador de vôlei Bruninho a honraria de entrar com a bandeira brasileira na cerimônia de abertura no Estádio Olímpico. Ela foi a primeira mulher a conquistar uma medalha em um esporte individual em 2008. Além disso, o futebol já tem a sua rainha: a jogadora Marta, que chegou mostrando as suas credenciais, ao fazer dois gols, quarta-feira, 21, no primeiro jogo disputado contra a China. O Brasil venceu por cinco a zero. Marta joga a quinta Olimpíada e é a única jogadora a fazer gols em todas as edições. Superada a cobrança por uma medalha de ouro na competição, conquistada em 2016, a seleção masculina está com menos holofotes, mas estreou contra a Alemanha com uma vitória de 4 a 2. A estrela do time é o lateral veterano Daniel Alves que não abriu mão de disputar os jogos. Com um pouco de sorte, o futebol pode trazer duas conquistas. Na natação, o Brasil tem dois nomes de destaque. A maratonista aquática Ana Marcela Cunha já conquistou 11 medalhas em mundiais e é esperança de pódio. Bruno Fratus nos 50 metros livres não é o favorito para o ouro, porém tem chances de ser medalhista. O País já teve mais destaques dentro das piscinas e vive com uma geração que ainda está em formação. Nas lutas, as maiores esperanças estão depositadas na boxeadora Bia Ferreira, líder do ranking e campeã mundial peso leve. No judô, a bicampeã mundial Mayra Aguiar representa a boa tradição brasileira. Milena Titoneli pode trazer uma medalha disputando o taekwondo. E a esgrimista Nathalie Moellhausen completa a lista de pódio nas lutas, dessa vez utilizando a sua espada.

SUSTENTÁVEL As medalhas olímpicas terão em Tóquio um compromisso com o meio ambiente. Todas serão confeccionadas com materiais reaproveitados pelo designer Junichi Kawanishi (Crédito:Divulgação)

País do vôlei

Na Olimpíada o Brasil ostenta o título de País do vôlei. Ao todo foram conquistadas 23 medalhas, entre quadra e areia: oito de ouro, dez de prata e cinco de bronze. Em quadra, a seleção masculina é atual campeã mundial e as meninas são vice-campeãs. O esporte coletivo tem uma tradição que dá as melhores expectativas. Na areia, a dupla feminina deve ser a grande sensação. Ágatha e Duda são promessas de ouro. As duplas masculinas também podem trazer medalha. Alisson e Bruno foram medalhas de prata em 2016, mas estão com novos parceiros. O campeão olímpico Serginho (Escadinha) falou à ISTOÉ sobre a experiência de estar numa Olimpíada. Ele é o segundo maior medalhista brasileiro, participou de quatro edições e conquistou medalhas em todas às vezes: duas de ouro e outras duas de prata. “Essa Olimpíada terá algo a mais por conta da pandemia. As histórias mais lindas não vêm de uma medalha de ouro. Pode vir de uma atitude nobre. Os exemplos aparecem. Não espero recordes, espero lições para que o povo reflita que o esporte pode mudar a vida das pessoas”, afirma. Ele diz que os atletas brasileiros do vôlei foram moldados por gerações e que isso traz bons resultados. “Falo de boca cheia que o Brasil é o País do voleibol. Nunca vamos ganhar da Rússia na altura, então é preciso mais trabalho”, diz. Em tom de brincadeira, lembrou que na primeira olimpíada pagava aluguel. “Em 2004, precisava ganhar aquela medalha de qualquer jeito”, brinca.

ARTHUR NORY Na barra fixa o ginasta artístico é o favorito depois de conquistar bronze no Rio (Crédito:Marcelo Machado de Melo)

A maior surpresa de pódio para o espectador comum, em 2016, foi o canoísta Isaquias Queiroz. Ele conseguiu nada menos que três medalhas e se tornou o maior recordista brasileiro em uma única olimpíada. Mas o atleta é ambicioso e almeja ser maior de todos os tempos com sete medalhas. Planeja ganhar duas em Tóquio e outras duas em Paris, em 2024. “Não penso em sair daqui sem duas medalhas no pescoço. Posso estar sendo ganancioso, mas treinei muito para isto e não quero sair daqui sem este objetivo”, afirmou. O sonho do baiano é superar outro atleta que treina na água, o velejador Robert Scheidt, maior medalhista olímpico com cinco medalhas. Ele está em Tóquio para disputar a sétima competição. “Sempre dá um frio na barriga de representar o País”, afirmou o velejador. As velejadoras Martine Grael e Kahena Kunze, ouro no Rio, são favoritas na classe 49er FX. Já há algum tempo que a ginástica artística brasileira conquista bons resultados e revela talentos. Arthur Zanetti tem no currículo um ouro em Londres e uma prata no Rio. No Japão deve conquistar mais uma medalha. Zanetti é sargento da Aeronáutica e faz parte do grupo de atletas militares da delegação. Dos 302 representantes do Brasil, 91 são militares. Outro medalhista, o ginasta Arthur Nory, também sargento, conquistou bronze no Rio e é favorito na barra fixa. A lista da ginástica fica completa com Rebeca de Andrade, que compete pelo Flamengo.

Mais de 11 mil atletas estão em Tóquio e a contaminação pela Covid-19 parecia desde o início ser algo inevitável. Na quarta-feira, 21, havia a confirmação de 80 casos na Vila Olímpica. Nenhum brasileiro. Os atletas contaminados ao longo da competição serão eliminados. No Brasil, 30 competidores se recusaram a tomar a vacina contra o coronavírus. O Comitê Olímpico não revelou os nomes e disse que a medida não era obrigatória. De qualquer forma, as arquibancadas vazias serão uma marca nos jogos. Em Tóquio está proibida a presença do público por conta da Covid-19. O heroísmo dos atletas não terá os aplausos ao vivo de multidões entusiasmadas. Mas será facilmente percebido e ficará para a história.