A aposentadoria é um dos momentos mais significativos na trajetória de qualquer pessoa. Ela não marca apenas o fim de um ciclo profissional, mas também o início de uma nova etapa da vida – uma fase que pode (e deve) ser dedicada ao bem-estar, à realização pessoal e à busca por mais qualidade de vida. No entanto, saber o momento certo de se aposentar é um desafio que envolve autoconhecimento, planejamento e coragem.
Muitas vezes, o apego à rotina de trabalho, o medo da ociosidade ou a insegurança financeira fazem com que as pessoas adiem essa decisão. Porém, é preciso refletir: continuar trabalhando está trazendo satisfação ou apenas cansaço? O tempo dedicado ao trabalho está comprometendo a saúde física, emocional ou os relacionamentos pessoais? Se as respostas apontam para o desgaste, talvez seja a hora de considerar a aposentadoria como uma escolha consciente e saudável.
A vida não deve ser apenas sobre produtividade, mas também sobre viver bem. Ao se aposentar, abre-se espaço para aproveitar o tempo com mais liberdade: cuidar da saúde, viajar, desenvolver hobbies, estar com a família ou simplesmente descansar sem culpa. A qualidade de vida está diretamente ligada a esse equilíbrio entre tempo, propósito e prazer.
Saber a hora de parar não é desistir – é uma forma de se priorizar. É compreender que cada fase da vida tem seu valor e suas possibilidades. A aposentadoria, quando bem planejada e acolhida, pode ser a fase mais rica em experiências significativas. E o mais importante: é a chance de viver com mais leveza, saúde e plenitude.
Na segunda-feira, 12, a jornalista e apresentadora Marília Gabriela, de 76 anos, que se consolidou como uma das maiores entrevistadoras da TV brasileira, usou as redes sociais para anunciar sua aposentadoria definitiva. Na publicação, ela compartilhou uma foto vestindo uma camiseta com a inscrição em inglês: “Aposentada. Adjetivo. Eu faço o que eu quero, quando eu quero. Olhe também: não é mais meu problema”.
“Sim, é o que está escrito: aposentada, fazendo o que eu quero, quando eu quero e pronto, não se fala mais nisso… Só viajar e fazer teatro… por enquanto. Daí pergunto: para que mais?”, iniciou na legenda da publicação.
Marília ainda relembrou um momento de nostalgia. “PS. Ah… sim… minha primeira carteira de trabalho, um ‘caco’, mostra que fui admitida na Rádio Televisão Paulista (Globo) em 1º de abril de 1970. Encontrei-a hoje numa gaveta! Vida que segue. Beijos nesta segundona barulhenta, desta sua e sempre, G…”, finalizou.
A trajetória de Marília Gabriela
No ar há mais de 40 anos, Marília Gabriela Baston de Toledo, nascida em Campinas, interior de São Paulo, no dia 31 de maio de 1948, já entrevistou personalidades como o presidente Lula, Elton John, Yasser Arafat e Fidel Castro. Além de jornalista e apresentadora, também é cantora, atriz e escritora.
Em 1969, Marília entrou como estagiária no Jornal Nacional, da TV Globo, e, no mesmo ano, já foi convidada para ser âncora do Jornal Hoje. Quatro anos depois, foi para o Fantástico fazer reportagens especiais pelo Brasil. Ainda na Globo, foi apresentadora do TV Mulher, nos anos 1980.
Marília passou por diversas emissoras brasileiras. Na Bandeirantes, apresentou o programa de variedades Marília Gabi Gabriela (1985) e Cara a Cara (1985), programa que lhe trouxe a fama de maior entrevistadora do país. Depois da Band, a jornalista recebeu uma proposta da CNT para ganhar um salário mensal de R$ 1 milhão para fazer o mesmo programa Marília Gabi Gabriela.
No SBT, a veterana ficou de 1997 até 2001 no SBT Repórter e, no ano seguinte, começou a apresentar o De Frente com Gabi.
Ela também comandou o Marília Gabriela Entrevista, no canal pago GNT.
A partir de 2001, a jornalista passou a se dedicar à carreira artística e interpretou o papel principal na peça Esperando Beckett. Depois, ainda fez mais duas montagens: Lady Macbeth (2006) e Aquela Mulher (2008). Gostou tanto da vida de atriz que participou de mais de cinco novelas e minisséries, além de seis filmes. Na dramaturgia, destacou-se como Josefa em Senhora do Destino (2004), ao lado de Susana Vieira, Renata Sorrah e Carolina Dieckmann.
Marília ainda canta e escreve. Gravou três discos, sendo Perdido de Amor (2002) o mais conhecido, com participação de Caetano Veloso e Simone. Em 2008, publicou o livro Eu que Amo Tanto.
Como identificar a hora de parar de trabalhar?
Procurado pela reportagem de IstoÉ Gente, o psicólogo Alexander Bez fez uma análise sobre saber a hora de se aposentar. Leia na íntegra:
“Quando falamos em aposentadoria, precisamos considerar uma série de fatores. Em primeiro lugar, o que tenho percebido ao longo da minha carreira é que a saúde física costuma ser um dos aspectos mais determinantes. Isso influencia bastante na escolha que a pessoa vai fazer. Por exemplo, profissionais que dependem do corpo para exercer sua função, como atores e atrizes de teatro ou cinema, podem chegar a um ponto em que, fisicamente, não conseguem mais exercer o ofício. Nesse caso, a aposentadoria se torna inevitável.
Por outro lado, existem profissões mais intelectuais, que não estão diretamente ligadas à condição física. Nesse caso, tudo vai depender do estado emocional e psicológico da pessoa. É aí que entra um conceito muito importante: a percepção psicoemocional.
Existe, sim, um tempo interno, não cronológico, mas psicológico, em que a pessoa sente que sua missão foi cumprida. Quando essa percepção acontece, ela sente que chegou a hora de parar. Vem um sentimento de gratidão, de completude. Mas esses sentimentos precisam ser genuínos, sentidos de fato, e não apenas idealizados.
Essa percepção vem de uma integração dos nossos “aparelhos” internos: emocional, psicológico e sentimental. Quando estão alinhados, a pessoa consegue enxergar que a sua tarefa foi cumprida. Mas nem todos conseguem atingir esse estado.
Em muitos casos, isso não acontece porque a pessoa sente que não realizou tudo o que gostaria. Pode ser por frustração profissional, por expectativas não atingidas, por necessidades financeiras ou até por desejo de reconhecimento — seja do público, da família ou do parceiro. Tudo isso alimenta a necessidade de continuar, mesmo quando a energia já não é mais a mesma.
Quando esses impulsos cessam e a pessoa sente que sua trajetória foi concluída, ela pode, enfim, se aposentar com tranquilidade. E esse é um ponto-chave: tomar a decisão e não voltar atrás. Quando alguém se aposenta e depois tenta retomar, é comum perceber que a energia já não acompanha mais o ritmo anterior. Isso porque a energia profissional envolve uma série de fatores: disposição física, mental, emocional e até química.
Uma vez que essa energia se esgota, é muito difícil reconstruí-la. Além disso, o fator idade é real e inevitável. Mesmo com boa saúde mental, a idade pesa, e isso precisa ser tratado com responsabilidade e autoconhecimento.
Quando a pessoa compreende tudo isso, quando sente que fez tudo o que podia e desejava fazer, ela tem todo o direito de parar. E, mais importante: ao parar com essa consciência, ela não sentirá o “vazio da profissão”. Não haverá tédio, frustração ou necessidade de buscar compensações.
Esse é um ponto fundamental: quando não há completude, é comum surgir a necessidade de preencher esse vazio com outros comportamentos. A pessoa pode recorrer a hábitos compulsivos ou destrutivos, tentando compensar algo que não foi concluído internamente.
Por isso, o ingrediente essencial nesse processo é a realização pessoal: a sensação de ter feito o que precisava ser feito. A certeza de que não é mais necessário continuar. Essa certeza só vem quando há uma gratidão autêntica e uma paz interna com a própria história.
Quando há esse alinhamento, a pessoa não sofre conflitos internos, porque os componentes mentais, como o ego e os desejos mais profundos, estarão em harmonia. A decisão de parar passa a ser natural, leve e definitiva.
Em resumo: a hora de parar é quando essa percepção psicoemocional vem à tona — quando a energia que antes movia a profissão já não existe mais, e a pessoa se sente realizada com o que construiu. Poucos chegam a esse entendimento, porque ele exige tempo. E esse tempo não é cronológico, é emocional. É o tempo da mente. O tempo de se escutar com profundidade.”