04/12/2024 - 17:28
A censura do governo francês não leva à queda do presidente Emmanuel Macron, cujo mandato termina em 2027, mas o centro-direitista terá a difícil tarefa de nomear um primeiro-ministro e sem poder recorrer a novas eleições legislativas.
Em setembro, Macron escolheu o conservador Michel Barnier como primeiro-ministro em nome da estabilidade, dois meses depois das legislativas que antecipou em virtude da vitória da ultradireita francesa nas eleições ao Parlamento Europeu.
A inesperada antecipação eleitoral deixou uma Assembleia Nacional (Câmara Baixa) sem maiorias claras e dividida em três blocos irreconciliáveis: esquerda, centro-direita e extrema direita. Macron não pode convocar novas eleições até julho.
Em plena crise política, qual é a margem de manobra do presidente de 46 anos?
Nada impede Macron de designar Barnier de novo. Em 1962, o então presidente Charles de Gaulle nomeou novamente George Pompidou, o único primeiro-ministro a cair até agora em uma moção de censura desde 1958, mas houve eleições nesse ínterim.
Na noite de terça-feira, o primeiro-ministro de 73 anos descartou essa possibilidade. “Quero servir. Disse a vocês que é uma grande honra. Mas que sentido tem [uma nova nomeação como primeiro-ministro]?”, declarou às redes TF1 e France 2.
Entre os nomes que circulam para suceder o ex-negociador europeu do Brexit estão o atual ministro da Defesa, Sébastien Lecornu, e o aliado centrista de Macron, François Bayrou.
A nomeação de Barnier em setembro foi possível porque seu partido conservador Os Republicanos (LR) decidiu deixar a oposição e governar ao lado da aliança centrista no poder desde 2017.
Mas o líder do LR, Laurent Wauquiez, garantiu a seus deputados na terça-feira que seu “compromisso em setembro era válido apenas para Barnier”, de acordo com sua comitiva, sugerindo novas discussões para entrar em um governo.
Faltando dois anos e meio para a próxima eleição presidencial, que Macron não pode disputar, os partidos estão buscando se dissociar do legado de um presidente impopular, mas tentando não parecer responsáveis pela crise atual.
O antecessor de Barnier, o macronista Gabriel Attal, defendeu “um acordo de não censura” com o LR, mas também com o Partido Socialista, que faz parte da coalizão de esquerda Nova Frente Popular (NFP).
O governo que surgiria desse pacto incluiria ministros da aliança de Macron, de acordo com Attal, de centro-direita, e poderia evitar que sua sobrevivência dependesse do partido de oposição Reagrupamento Nacional (RN), de extrema direita, comandado por Marine Le Pen.
Alguns membros mais à direita da coalizão governista defenderiam, em vez disso, um “pacto” secreto entre o chefe de Estado e Marine Le Pen, para que esta última permitisse a sobrevivência de um novo governo.
A NFP – formada por socialistas, ecologistas, comunistas e o partido de esquerda radical A França Insubmissa (LFI) – venceu as eleições parlamentares sem maioria, mas Macron se recusou a nomear sua candidata, a economista Lucie Castets, como primeira-ministra.
Embora Castets tenha dito na terça-feira que está “pronta para governar”, os socialistas defenderiam a proposta de um pacto “sem censura”, com acordos pontuais com todos os outros partidos, exceto a extrema direita, mas com um governo de esquerda.
Essa abertura entra em conflito com a posição da LFI, que defende “aplicar o programa e somente o programa” da Nova Frente Popular, apesar do fato de que esse cenário implicaria em uma rápida censura.
O líder dos socialistas, Olivier Faure, também rejeitou um governo liderado pelo ex-primeiro-ministro socialista Bernard Cazeneuve, que deixou o partido e rejeita qualquer acordo com a LFI.
Outra possibilidade seria a nomeação de um governo tecnocrático até as próximas eleições legislativas, um dispositivo usado na Itália em várias ocasiões para superar crises políticas.
Esse governo se dedicaria à administração cotidiana e à cobrança de impostos, mas enfrentaria o obstáculo no Parlamento do orçamento de 2025, que já provocou a queda de Barnier.
“Por trás da técnica sempre há política”, resume um líder da aliança de Macron, rejeitando esse cenário.
Cada vez mais vozes, da esquerda, mas também do LR, consideram que a única saída para a crise inclui a renúncia de Macron e uma antecipação da eleição presidencial. Isso é “ficção política”, respondeu o mandatário na terça.
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