Vexame. Essa é a palavra que descreve a participação da Seleção Brasileira na Copa do Mundo Feminina de 2023. Com um desempenho para lá de duvidoso, a equipe de Pia Sundhage não conseguiu encaixar uma boa sequência após a vitória de 4 a 0 sobre o Panamá e se despediu da competição nesta quarta-feira (02), após um amargo empate sem gols contra a limitada Jamaica.

A eliminação do Brasil ainda na fase de grupos escancarou os inúmeros problemas da seleção e o péssimo trabalho de Pia à frente da equipe. A sueca, que está no comando da amarelinha desde 2019, não só fez um ciclo pré-Copa decepcionante, como também atrapalhou a evolução do time.

Temendo uma precoce eliminação na Copa do Mundo, como acabou ocorrendo, Pia lançou sua última esperança nos ombros daquela que é conhecida como a rainha do futebol: Marta. A capitã da seleção, que nitidamente já não é a mesma jogadora de outrora, foi escalada como titular diante da Jamaica, mas não conseguiu evitar a eliminação vexatória da seleção.

Em sua sexta e última Copa do Mundo disputada, Marta, que já foi eleita a melhor jogadora do mundo em seis ocasiões, se despediu dos Mundiais com a sensação de que faltou algo. Maior artilheira do torneio, com 17 gols marcados, a camisa 10 tem como melhor resultado um segundo lugar em 2007, após perder o título para a Alemanha. 

Apesar de vexame na Copa do Mundo Feminina, carreira de Marta será lembrada por anos
Marta em ação na Copa do Mundo de 2007. Naquele torneio, a Seleção Brasileira foi vice-campeã (Crédito:Reprodução/Twitter @FIFAWWC)

Naquela ocasião, com um Brasil finalista e uma Marta melhor do mundo, vislumbrou-se dias mais felizes para a Seleção Brasileira. Mesmo com a esperança restabelecida, a camisa 10 seguiu empilhando eliminações dolorosas nas Copas do Mundo e se despediu do torneio sem ter conquistado o título uma única vez.

Apesar dos reveses nas Copas do Mundo, é inegável que Marta deixa seu legado imortal no futebol feminino de seleções. Maior artilheira na história dos mundiais entre homens e mulheres, a jogadora inspirou diversas meninas, que hoje dividem os vestiários da Seleção Brasileira com a camisa 10, e mostrou, ao lado de nomes tradicionais como Formiga e Cristiane, que a modalidade só tende a crescer.

História de Marta

Hoje com 37 anos, a eterna rainha revolucionou o esporte no Brasil e no mundo. Nascida no município de Dois Riachos, em Alagoas, a atleta teve uma infância humilde no interior do Estado e cresceu sem a presença do pai. Filha de Tereza da Silva, a jogadora foi criada com os três irmãos, Ângela, José e Valdir, e despontou para o futebol aos 14 anos, após ser aprovada em uma peneira do Vasco da Gama, equipe do Rio de Janeiro.

Apesar de vexame na Copa do Mundo Feminina, carreira de Marta será lembrada por anos
Registro de Marta na Federação de Futebol Estado do Rio de Janeiro (Crédito:Reprodução)

Depois de deixar o sertão de Dois Riachos para trás, Marta se firmou no Vasco mesmo com a falta de investimento na modalidade feminina e, posteriormente, despontou para o cenário internacional do futebol. Com 16 anos completados, a camisa 10 passou a defender as cores da Seleção Brasileira no sub-19 e no profissional, evidenciando ainda mais o seu talento e projetando sua transferência imediata para o futebol sueco.

Nova e ainda franzina, Marta desembarcou na Suécia como uma promessa que, anos depois, se tornou uma grande realidade. No futebol europeu, a rainha garantiu o prêmio de melhor do mundo em cinco ocasiões, todos eles conquistados de forma consecutiva, entre os anos de 2006 e 2010, além de diversos títulos coletivos.

Apesar de vexame na Copa do Mundo Feminina, carreira de Marta será lembrada por anos
Marta com o prêmio de melhor jogadora do mundo (Crédito:Reprodução/Twitter)

Após uma passagem de sucesso absoluto pela Europa e de garantir o título de rainha do futebol, a alagoana mudou-se para os Estados Unidos, onde segue empilhando feitos enormes à carreira e levantou sua sexta bola de ouro, em 2018, defendendo as cores do Orlando Pride, seu atual time.

Mesmo com a consolidação de Marta no exterior, sempre faltou uma passagem, ainda que simbólica, da jogadora por alguma equipe tradicional do Brasil. Em 2009 e no ano seguinte, a atacante tratou de assegurar que sua carreira tivesse um capítulo nacional e atuou por poucos meses pelo Santos, mas o tempo foi suficiente para que a camisa 10 conquistasse a Copa Libertadores e a Copa do Brasil pelo clube da Baixada Santista.

Apesar de vexame na Copa do Mundo Feminina, carreira de Marta será lembrada por anos
Marta atuou pelo Santos por poucos meses (Crédito:Reprodução/Twitter @SantosFC)

É fato que boa parte das lembranças dos brasileiros são da alagoana jogando no exterior. Mesmo com a curta passagem pelo Santos, a brasileira construiu a maior parte de sua carreira nos clubes estrangeiros, mas isso só aumentou o legado da jogadora. Marta não só elevou o nome do Brasil frente aos países estrangeiros, como também alavancou a nossa cultura futebolística e inspirou outras gerações, que acabaram ingressando no futebol após a influência da atacante.

Legado além dos gramados

Se é óbvio a influência de Marta na nova geração do futebol, reforçando o seu legado nacional e internacional, é ainda mais claro como a jogadora foi importante para a evolução de diversas meninas, fora do âmbito esportivo, e para o crescimento de outras profissionais mulheres, que alcançaram diferentes áreas apenas se inspirando na jogadora.

Marta, além de histórica e necessária, mostrou, para garotas e mulheres, que tudo é possível. A própria jogadora reconhece seu papel no crescimento do esporte e também fora dele. Em entrevista coletiva nesta Copa do Mundo, a rainha não se escondeu e reforçou seu tamanho dentro da sociedade feminina.

“Sabe o que é legal? É que quando eu comecei a jogar, eu não tinha ídolo no futebol feminino. Vocês [imprensa] não mostravam o futebol feminino. Como eu ia entender que eu poderia chegar à seleção e virar uma referência? Hoje a gente sai na rua, as pessoas param, os pais falam: ‘A minha filha te adora, ela quer ser igual a você'”, disse a atleta.

“Há 20 anos, em 2003, ninguém conhecia a Marta, era minha primeira Copa. Vinte anos depois, a gente virou referência para muitas mulheres do mundo inteiro, não só no futebol, no jornalismo também. A gente vê muitas mulheres no jornalismo, que não víamos antigamente. Então a gente acabou abrindo portas para a igualdade”, acrescentou a atacante.

Apesar de vexame na Copa do Mundo Feminina, carreira de Marta será lembrada por anos
Marta deixa legado enorme para as próximas gerações (Crédito:WILLIAM WEST / AFP)

As falas da jogadora escancaram aquilo que muitos torcedores e fãs indicam há algum tempo: a importância e o legado futuro deixado por Marta vai além de qualquer título. É claro que terminar uma passagem de anos pela seleção com um troféu de Copa do Mundo seria uma conquista imensurável, mas a atacante já carrega na bagagem a reverência de toda uma geração.

Herança. Referência. Legado. O vexame na Copa, citado no início do texto, em nada reflete na histórica carreira construída por Marta. Dona de duas medalhas de prata em Olimpíadas, a nossa eterna rainha já alcançou o Olimpo e assegurou sua permanência entre as grandes da história.