Por sua retórica, Donald Trump se alienou de uma parcela significativa do eleitorado negro. Diante da proximidade da eleição presidencial de 2020, ele se lança, porém, em uma empreitada de sedução que provoca – sem surpresa – vivas reações contrárias.

“Veremos em um ano, mas acho que terei uma porcentagem fenomenal de votos afro-americanos”, disse ao deixar a Casa Branca.

O principal argumento do presidente? Os bons resultados econômicos. Em outubro, a taxa de desemprego entre a população negra foi de 5,4%, número que caiu bruscamente na última década, mais que ainda supera o da população branca, em 3,2%.

Trump também se orgulha da reforma da justiça penal para aliviar prisões lotadas. A lei foi votada por legisladores dos dois partidos, conscientes dos custos humanos e financeiros das políticas ultrarepressivas para lutar contra o narcotráfico.

“Sem mim, não teria havido uma reforma judicial e beneficiou os afro-americanos mais do que ninguém”, destacou Trump.

Mas em seus esforços por captar essa porção do eleitorado, a desconfiança que gera é real.

Em 2016, o magnata imobiliário apontou para o desencanto de uma parte dos afro-americanos com o partido de Barack Obama, primeiro presidente negro de Estados Unidos, mas sua rival, a democrata Hillary Clinton, obteve 88% do voto do eleitorado negro. Trump, somente 8%.

– Racista –

Desde que chegou à Casa Branca, os constantes ataques de Trump contra líderes afro-americanos não teriam feito nada além que atiçar as tensões.

Segundo uma pesquisa da Universidade Quinnipiac divulgada em julho passado, 80% dos eleitores negros consideram que o presidente americano é racista.

Desde que chegou à Casa Branca, seus repetidos ataques contra lideranças afro-americanas não contribuíram em nada para reduzir as tensões.

A última delas foi uma série de tuítes agressivos contra o congressista Elijah Cummings, membro da Câmara de Representantes e uma emblemática e carismática figura dessa comunidade, que veio a falecer.

O destacado reverendo negro Timothy McDonald, que participou na manhã de sexta-feira de um ato com legisladores democratas, não ocultou seu descontentamento pelas tentativas de Trump de seduzir o eleitorado negro.

O fato de Trump chegar a Atlanta, “terra de Martin Luther King e berço do movimento de direitos civis”, é uma bofetada para todos os negros na Geórgia e um insulto a todas as pessoas negras nos Estados Unidos”, disse.

– “Um insulto” –

O cofundador da organização Black Voters Matter Cliff Albright rejeita a iniciativa de campanha de Trump.

“É um embuste, é hipócrita, é um insulto”, afirma, denunciando as palavras e os atos do presidente.

Segundo Albright, a intenção de Trump é “criar confusão” e conseguir que “1%, 2% ou 5% dos eleitores negros fiquem em suas casas”, o que prejudicaria os democratas.

“Criar uma espécie de confusão, martelando: ‘vocês não têm nada a perder’, pode ter um efeito na margem”, afirma Albright, acrescentando que o objetivo é “levar 1%, 2% ou 5% dos eleitores negros a ficarem em casa”, e não irem votar.

Em 2016, a mobilização do eleitorado negro por Hillary Clinton foi, claramente, mais fraca em vários estados-chave, entre eles Wisconsin, que, para surpresa geral, mudou de lado.

Em 2020, os democratas esperam remobilizar essa fatia do eleitorado para voltar a atingir níveis próximos das duas eleições de Barack Obama, em 2008 e em 2012.

Tudo dependerá também, em certa medida, do candidato democrata que enfrentará Trump.

O ex-vice-presidente Joe Biden goza de uma sólida popularidade entre os eleitores afro-americanos, devido, sobretudo, à sua excelente relação com Obama, o primeiro presidente negro dos Estados Unidos.

Por enquanto, seus adversários na corrida das primárias, como a senadora progressista Elizabeth Warren e o jovem prefeito Pete Buttigieg, provocam menos entusiasmo.