Coluna: José Manuel Diogo

Fundador da Informacion Capital Consulting e Diretor da Câmara de Comércio e Industria Luso Brasileira em Lisboa onde coordena o comité de Trade Finance é o autor do estudo "O Potencial de Expansão das Exportações Brasileiras para Portugal”. Atua atualmente como investidor e consultor, estando envolvido em projetos de intercâmbio internacional nas áreas do comércio, tecnologia e real estate. Vive com um pé em cada lado do Atlântico, entre São Paulo e Lisboa. É autor e colunista na imprensa internacional sobre temas de investimento, importação e exportação e inteligência de mercado. É um entusiasta da cultura e da língua portuguesa.

Anvisa. Garota de Programa.

José Manuel Diogo
Foto: José Manuel Diogo

A vacina é uma arma. Tá anvisado! Ninguém espere que o ser humano, seja humano, aja humano ou sequer pareça humano nesta crise mundial.

Ninguém pense que a solidariedade de homens bons supere a vilania de políticos maus; ou que a amizade suplante o amor sujo pelo dinheiro. No final de contas ganha sempre a cupidez.

A luta pela vida é grande, mas afinal a luta pelo dinheiro é que é a santa. A primeira é apenas luta pela sobrevivência, mas a segunda luta é mesmo pela liberdade. Rasguem-se tratados, incumpram-se contratos, contornem-se acordos. A vacina será apenas de quem pagar mais nesta licitação internacional.

Consulto o “pensador” tentando escavar uma boa citação sobre o papel do ser humano nesta novel guerra mundial que usa seringa como míssil, insumo como morteiro e a Dona Anvisa como garota de programa — logo encontro a frase certeira.

É do Nelson Rodrigues: “É sempre a falta de caráter que decide uma partida. Não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos”. Exatamente o que está acontecendo nesta partida em que a humanidade joga seu futuro — sobram bons sentimentos, mas o caráter falta em toda a parte.

Nada importa, só o lucro, neste choque de titãs. Nada muda, os senhores da guerra são os suspeitos do costume, desta vez travestidos de empresa farmacêutica.  Para eles a única coisa que conta é o brilho do ouro.

Dá pena ver o Brasil xingando a China para depois logo se ajoelha, mas choca ainda mais ver os países da Europa — tão mais velhos e fracos do que eu podia imaginar — ficar reféns das empresas que fabricam as vacinas em seu próprio solo e depois as vendem para quem pagar mais.

O noticiário sobre a vacinação mundial — online e em tempo real — é a melhor campanha publicitária que essas novas senhoras da guerra podiam desejar, e é completamente gratuita. O sonho de glória de qualquer marqueteiro! Todos os meios possíveis contando a mesma história, ao mesmo tempo, para todo o mundo. “Comprem vacinas. A gente tem”.

No meio desta galáctica campanha, a Anvisa altera as regras e concede autorização de uso emergencial a todas(?) as vacinas. Aquilo que parece segunda edição da novela “Cloroquina cura” não é mais que uma sequela com audiência global.

Já não é preciso testar as vacinas em brasileiro antes de vacinar todos.  Deixou de ser necessário que o imunizante tenha passado ou esteja passando por testes de fase 3 no Brasil. Sputnik V e Covaxin, produzidas na Rússia e na Índia, entram direto para o mercado.

Neste ponto o doutor Ministério anuncia a compra de 30 milhões de doses de ambas as vacinas. Dona Anvisa ainda resiste, mas logo vira garota de programa.