Havia mais mistérios entre o Qatar e a Copa do Mundo do que podia imaginar a União Europeia. Por que nas tantas ocasiões em que o governo do mais rico país árabe viu-se acusado de desrespeitar os direitos humanos, a eurodeputada grega Eva Kaili, uma das vice-presidentes do Parlamento Europeu, correu à tribuna a fazer caudalosos discursos em defesa dos líderes catarenses? Fim do mistério. Eva foi presa sob a acusação de aceitar propinas advindas do Qatar para mitigar as acusações que pesam contra o país – trabalho escravo e desaparecimento de corpos de operários que morreram na construção da infraestrutura da Copa. Juntamente com ela foram presos o seu marido, Francesco Giorgi, e diversos assessores. Na casa de Eva a polícia belga encontrou 750 mil euros. Mais dinheiro engordava a mala carregada por seu pai quando foi detido. Na quarta-feira 14, o Partido Socialista Pan-Helênico confirmou a sua expulsão, e seus bens estão congelados pelo governo grego. Esse é o maior caso de corrupção a abalar o pretígio e a história do Parlamento Europeu.

JOHN THYS / AFP

“As acusações contra Eva são extremamente graves. É uma questão de confiança das pessoas em nossas instituições, e tal confiança pede os mais altos padrões de integridade” Úrsula Von der Leyen,, presidente da Comissão Europeia

LIVROS
Uma revolucionária tese na música popular brasileira

CACIQUE DE RAMOS Beth Carvalho: ritmo sim, toalete em seu nome não (Crédito:Divulgação)

Compositor e rigoroso pesquisador da MPB, Nei Lopes (mais valorizado no exterior que no Brasil) expõe sua tese bastante original no excelente livro Beth Carvalho: De pé no chão, do escritor e roteirista Leonardo Bruno. Diz ele que a divisão rítmica do samba que gerou o pagode foi tão revolucionária como a bossa nova. O nosso samba teria passado, assim, por dois momentos de transformação. Primeiro: nos anos 1920, no Estácio, no Rio de Janeiro, quando o samba batucado alterou (sobretudo na extensão da nota) o samba de roda da Bahia. Segundo: o pagode, em Cacique de Ramos, também no Rio. Uma curiosidade: no terreiro do Cacique não havia toalete feminina e Beth Carvalho reclamou. Construíram e quiseram homenagear a cantora dando ao banheiro o nome de Beth Carvalho. Ela não quis. Mas projetou os compositores do tradicional bloco carioca.

PESQUISADOR Nei Lopes: pagode feito bossa nova (Crédito:Felipe Varanda)

OPERAÇÃO CONDOR
Presos os sequestradores de Lilian e Universindo

SUEQUESTRO Universindo e Lilian: tortura (Crédito:Divulgação)

Os covardes e criminosos contam com o passar do tempo para que seus atos sejam esquecidos. Relata-se aqui um caso de 44 anos atrás. Página virada? Não. A história se presentificou para fazer justiça contra dois torturadores do regime militar do Uruguai que aqui pisaram e sujaram nosso chão. Na semana passada confirmaram-se naquele país as prisões dos hoje coronéis Carlos Argimon e Glauzo de Leon. Em 1978, com a ajuda de agentes da repressão brasileira (dentre eles, o ex-jogador de futebol do Internacional Didi Pedalada), ambos ingressaram em Porto Alegre e sequestraram o casal Lilian Celiberti e Universindo Díaz, juntamente com os dois filhinhos, à época com sete e três anos de idade (as crianças levaram tapas e acabaram entregues a avós). O general Ernesto Geisel era o presidente do Brasil e Aparicio Méndez, do Uruguai. Lilian e Universindo viram-se levados à força a Montevidéu e sofreram torturas de choques e “pau de arara”. Os carrascos queriam saber em que local do Brasil se escondia o líder do Partido da Vitória do Povo, Hugo Cores, oposicionista da ditadura em seu país. Lilian e Universindo padeceram, mas nada falaram. Sobreviveram. Ele faleceu em 2012 e ela está com 73 anos. A ação fez parte da Operação Condor, que unificou até 1985 atos repressivos dos regimes de exceção da Argentina, Bolívia, do Chile, Brasil, Uruguai e Paraguai. A legislação uruguaia não anistiou torturadores, ao contrário da brasileira. Aqui, a Lei da Anistia, pelo princípio jurídico da conexidade, anistiou os dois lados. O STF já pacificou a questão.

QUEDA Didi Pedalada: do futebol aos porões da repressão (Crédito:Divulgação)

Parceiros na morte

40 mil é o número estimado de guerrilheiros mortos pela Operação Condor – nome que designava a colaboração entre as ditaduras militares da Argentina, Bolívia, do Brasil, Chile, Uruguai e Paraguai para eliminar aqueles que se opunham aos regimes totalitários nesses países. Somente na Argentina foram assassinadas cerca de 30 mil pessoas. A operação funcionou entre 1975 e 1985