O ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht Claudio Melo Filho afirmou em sua delação premiada que o célebre escândalo dos “Anões do Orçamento”, que sacudiu o Congresso e deixou Brasília em polvorosa em 1993, fez a empreiteira “mudar radicalmente sua forma de atuação estratégica” nos bastidores da Câmara e do Senado.

“Nesse momento, os recursos para as obras passaram a ser aprovados e liberados diretamente pelo Poder Executivo, por meio da criação de dotação orçamentária específica, que não mais sofria influência individual de parlamentares”, contou Melo Filho em sua delação premiada – documento que preenche 82 páginas.

Os “Anões do Orçamento” puseram de joelhos o Congresso apenas um ano depois do impeachment do ex-presidente Fernando Collor (1990/1992). Deputados manipulavam emendas do Orçamento Geral da União para desviar recursos públicos por meio de organizações sociais de fachada e empreiteiras.

O escândalo surgiu a partir das revelações do assessor da Comissão de Orçamento José Carlos Alves dos Santos, preso na época sob suspeita de planejar o assassinato da própria mulher.

O deputado baiano João Alves, então do PFL, foi apontado como líder da quadrilha. Para justificar sua fortuna ele alegou à Comissão Parlamentar de Inquérito ter ganho 56 vezes na loteria naquele ano.

Desde aquele período, a Odebrecht já se movimentava no Congresso em busca de facilidades em troca de propinas. O emblemático capítulo “Anões do Orçamento”, no entanto, fez a empreiteira alterar seus procedimentos.

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“Esse ocorrido (‘Anões’) consistiu na descoberta de que parlamentares, ao elaborarem o Orçamento Geral da União (OGU), apresentavam emendas individuais que no futuro seriam revertidas para recursos de obras. Apurou-se na CPI dos ‘Anões do Orçamento’ que parlamentares negociavam as emendas pelo recebimento de percentuais dos recursos que seriam futuramente repassados às obras. A Odebrecht acabou envolvida no escândalo, tendo, inclusive, sido realizada busca e apreensão na residência de um de seus executivos à época.”

Ele disse que, “pelo que escutou à época”, as emendas eram levadas aos parlamentares por diretores comerciais (DC’s) e superintendentes (DS’s) “responsáveis pela apresentação e aprovação”.

“No momento em que os recursos aprovados eram transferidos para as obras, havia o repasse para o político responsável pela emenda, em porcentual previamente acordado (com os diretores). Fui informado pela empresa que os seguintes nomes tratavam, à época, sobre Orçamento: Ailton Reis, José Carvalho Filho, Laerte Rabelo e Maurício Vasconcelos.”

“Este acompanhamento e pressão política para as liberações de recursos são feitos diretamente pelos DS’s e DC’s das respectivas obras junto ao Poder Executivo”, afirmou Melo Filho.

Segundo ele, os diretores que atuaram ao longo do seu período em Brasília, pós-2004, atrás de recursos foram João Pacífico, Valter Lana e Fábio Gandolfo.

“A forma de atuação dos DS’s e DC’s também mudou: ao invés de pressionar parlamentares, passou-se a pressionar os ‘donos da obra’ ou seja, os governadores ou prefeitos, para que estes pressionassem as suas respectivas bancadas estaduais”, relata o delator.

“Quando cheguei na Odebrecht S/A, em 2004, sabendo do ocorrido no passado, acertei que não me envolveria com Orçamento Geral da União e nem com nenhuma forma de atuação que envolvesse a liberação de recursos, com receio da investida de parlamentares de uma área que não é de minha responsabilidade, ou seja, obras.”


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