Os analistas passaram o dia de ontem digerindo a projeção de déficit primário, da ordem de R$ 139 bilhões para o governo central, anunciada quinta-feira. As primeiras impressões são ponderadas, com a maioria descrente em relação à capacidade da equipe em reequilibrar as contas públicas no curto prazo.

“Zerar o déficit em 2019 é otimista demais. Se o crescimento (do PIB) for de 2% ao ano, o déficit zera entre 2022 e 2023. Se for de 2,5%, zera em 2021, e se for de 3%, em 2020. Então, é preciso um baita crescimento ou um aumento da receita”, afirmou o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos e Internacionais do Banco Central (BC) e atual diretor da Schwartsman & Associados.

Para Schwartsman, não dá ainda para cravar que o governo central irá cumprir a meta de chegar a um déficit de R$ 139 bilhões em 2017. Ele lembra que Meirelles admitiu um rombo de R$ 194 bilhões no próximo ano e que iria buscar principalmente em concessões e outorgas os R$ 55 bilhões para trazer a meta ao valor anunciado.

“Eles vão ter de tirar R$ 55 bilhões Deus sabe de onde. Minha impressão é que fizeram as contas, chegaram a R$ 194 bilhões e, como esse valor não poderia ser apresentado, divulgaram R$ 139 milhões para dar prestígio à equipe econômica”, diz.

O economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Camargo Rosa, acredita que a meta fiscal para 2017 representa um “esforço possível” dentro das limitações que existem. Embora considere que um déficit de R$ 143 bilhões do setor público consolidado ainda seja um rombo fiscal muito grande, ele pondera que exigirá um controle maior dos gastos, se comparado a este ano.

Ele ressaltou que o fato de a equipe econômica ter conseguido emplacar uma meta de déficit de R$ 139 bilhões para o Governo Central em 2017 – mais dura do que a pretendida pelo núcleo político – é um bom sinal. Camargo Rosa, no entanto, diz que falta ao governo detalhar melhor como fará para conseguir atingir esta meta.

O ex-ministro da Fazenda e professor da FGV Luiz Carlos Bresser-Pereira acredita que a meta de déficit do governo central de R$ 139 bilhões para 2017 é factível e defende o gradualismo fiscal adotado pela equipe econômica de Michel Temer. Entretanto, o economista diz que não é favorável à proposta de emenda constitucional (PEC) que zera o crescimento real dos gastos públicos. Contrariando a maioria dos analistas, Bresser-Pereira diz que o principal problema da economia não é a situação fiscal, mas sim o elevado nível de juros.

Sinalização

O olhar dos analistas internacionais vê cenário similar. A agência de risco Moody’s considerou que a meta representa um melhora, mas reforçou que ficou abaixo do esperado pela equipe deles e sinaliza um ajuste mais lento que esperado. “Um déficit desse tamanho apoia nossa visão de que o ajuste fiscal no Brasil vai avançar em ritmo muito lento durante o atual governo”, diz o analista sênior de risco soberano da Moody’s para o Brasil, Samar Maziad. Os indicadores fiscais estão entre os mais avaliados pelas agências para determinar o risco de crédito de um país.

Mais preocupante, ressalta Samar, é que os números apresentados pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ainda estão longe do que é necessário para barrar trajetória de deterioração de indicadores fiscais brasileiros, como a relação entre a dívida bruta e o PIB.

A Moody’s estima que o Brasil precisaria ter um superávit primário ao redor de 2% do PIB para o governo estabilizar a dívida. Em fevereiro, a agência rebaixou a nota de risco soberano do País em dois níveis, retirando o grau de investimento. Além disso, deixou a perspectiva da nota como “negativa”, ou seja, nova piora pode ocorrer.

Os economistas do banco espanhol BBVA avaliam que a divulgação da nova meta fiscal brasileira reforça a previsão da casa de que as contas públicas continuarão em processo de deterioração pelo menos até o fim da década: o déficit primário deve continuar até 2019 ou 2020 e a dívida bruta atingirá, na melhor das hipóteses, o patamar de 88% do PIB em 2020.

Os economistas do Bank of America Merrill Lynch avaliam que “não há mágica” no curto prazo para melhorar as contas e o governo pode precisar subir impostos, além de outras medidas. Esta semana, os executivos do banco norte-americano estiveram reunidos com integrantes do governo em Brasília e a mensagem passada foi de “foco total” em resolver as questões fiscais no médio prazo.

Apesar da intenção de reduzir o déficit em 2017, a avaliação do BofA é que o governo brasileiro ainda precisará fazer mais para melhorar a trajetória de deterioração de indicadores fiscais no médio prazo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.