Ameaça de presidente do PP amplia sinais de distanciamento entre ‘centrão’ e Lula

Isac Nóbrega/PR
Ciro Nogueira, senador e presidente do PP Foto: Isac Nóbrega/PR

Presidente nacional do PP, o senador Ciro Nogueira (PI) afirmou que seu partido e os demais do chamado ‘centrão’ poderão desembarcar do governo Lula (PT) se não houver uma “mudança radical dos rumos”. A sigla tem André Fufuca no Ministério dos Esportes, mas já faz oposição à gestão petista no Congresso.

“Está muito próximo de termos de reunir o partido e tomar uma decisão definitiva de desembarcar [do governo]. Gosto muito do ministro Fufuca, mas, se o governo não tiver uma mudança radical de rumos para o país, não tem nem como a gente, daqui a pouco, permitir que os membros participem desse governo“, afirmou, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo.

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Riscos conhecidos

Para Nogueira, a decisão poderia desencadear uma debandada. “O União Brasil pode vir junto, o Marcos Pereira [presidente do Republicanos] é difícil ficar sozinho lá dentro. Não sei se o Gilberto Kassab [presidente do PSD] fica”, disse. Juntas, as legendas chefiam sete ministérios e somam 196 votos na Câmara dos Deputados, onde o governo já enfrenta dificuldades na configuração atual.

O dirigente comparou esse movimento ao que ocorreu com Dilma Rousseff (PT), que perdeu apoio do centro à direita antes de sofrer um impeachment, em 2016, mas preferiu afastar essa possibilidade. “O ideal é dar governabilidade do país para a gente fazer uma transição. Se eu fosse o presidente, o mais rapidamente possível, eu anunciava que não era candidato [em 2026] e virava essa página”, concluiu, antes de defender que Jair Bolsonaro (PL), inelegível até 2030, seja o presidenciável da oposição.

Ameaça de presidente do PP amplia sinais de distanciamento entre 'centrão' e Lula

Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: no centro das críticas do ‘centrão’

Embora tenha chefiado a Casa Civil sob Bolsonaro, Nogueira é um personagem de influência ampla no Parlamento e foi um dos integrantes do núcleo próximo do ex-presidente a defender o reconhecimento da vitória de Lula em 2022, ao contrário do grupo que supostamente planejou um golpe de Estado.

Na terça-feira, 25, o portal UOL reportou que lideranças no Congresso já fazem a comparação Lula-Dilma ao relatar a dificuldade do presidente para convencer integrantes da centro-direita a assumirem ministérios e, assim, aumentar sua base de apoio parlamentar.

Nem mesmo a oposição bolsonarista fala em impeachment, mas o governo viu sua aprovação popular despencar e é assombrado pela alta na inflação dos alimentos, que impacta especialmente os mais pobres — tradicional base de apoio do PT –, e por uma perspectiva econômica desanimadora. “O governo não tem mais munição fiscal e há uma elevação na taxa de juros. Se a economia desacelerar, como é esperado, haverá razão mais forte para queda na aprovação”, disse à IstoÉ Marcelo Neri, professor de economia da FGV-RJ (Fundação Getulio Vargas).

Fila aumenta

O cenário dá outro peso às falas de Nogueira, que engrossaram um coro de lideranças do ‘centrão’ em desagravo ao Palácio do Planalto. Em janeiro, Kassab, presidente do PSD, chamou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de “fraco”, e projetou que Lula não seria reeleito se as urnas fossem abertas naquele momento.

O mandatário ironizou, mas cientistas políticos ouvidos pela IstoÉ entenderam a crítica como uma cobrança de poder em troca de apoio — por meio de uma esperada reforma ministerial, que ainda não ocorreu. “Foi uma ferramenta para mostrar que, sem o PSD, o cenário poderia ser ainda pior”, disse Marco Antônio Teixeira, professor de gestão e políticas públicas da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas). Os pessedistas comandam as pastas de Minas e Energia, Pesca e Agricultura.

Na mesma semana, Marcos Pereira, presidente do Republicanos, disse que a tendência da legenda, à frente do Ministério de Portos e Aeroportos, é integrar um projeto de centro-direita em 2026. “O governo está um pouco sem rumo, sem direção. Falta entrosamento interno”, afirmou ao jornal O Globo.

Em pesquisas divulgadas nesta semana, Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo e principal nome do partido, apareceu à frente de Lula em três estados em pesquisas presidenciais para 2026. O ex-ministro de Bolsonaro nega a intenção de disputar o Planalto, mas tem relações íntimas com PSD, MDB e outras siglas que dominam o Legislativo nacional — e estão, tudo indica, cada vez mais distantes do Executivo.