Num momento em que o meio ambiente está sendo devastado, a série Amazônia, Arqueologia da Floresta, dirigida por Tatiana Toffoli, propõe uma abordagem original para tema tão fundamental. A série aposta na necessidade da preservação da floresta ao resgatar seu passado arqueológico, uma história que data de milhares de anos. A série está disponível no SescTV.

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Dividida em quatro episódios, Amazônia, Arqueologia da Floresta acompanha as pesquisas levantadas no sítio arqueológico Monte Castelo, em Rondônia, conduzidas pelo arqueólogo Eduardo Góes Neves. As escavações são realizadas em parceria com os moradores da aldeia Palhal, da etnia tupari, e mostram como a Amazônia foi transformada pelos povos indígenas ao longo de seis mil anos. A série traz uma reflexão sobre como a presença humana ajudou a moldar a Floresta Amazônica, tendo sido ocupada e transformada pelos povos que a habitam há milhares de anos.

Desfaz equívocos e clichês associados à região e a seus povos originários. Primeiramente, que se trataria de uma área historicamente pouco habitada, que seria preciso povoar. No tempo do regime militar, para incentivar a migração usava-se o dístico: “Uma terra sem povo para um povo sem terra”. Pelo contrário, constata-se que a região é habitada há milhares de anos e sua conformação atual deve-se à sua população. Em segundo lugar, há o mito que esses povos seriam menos desenvolvidos por não terem deixado ruínas majestosas, como as dos incas e maias, com suas pirâmides e templos.

“Na Amazônia há pouca pedra disponível”, explica o arqueólogo. As construções deviam ser feitas com madeira, palha e barro, materiais que não resistem à passagem do tempo como as construções em pedra. As diferenças entre uma e outra não implicam graus civilizatórios diferentes. Muito menos hierarquias civilizatórias. É esse mundo perdido que emerge das escavações feitas no sítio arqueológico de Monte Castelo.

A filmagem é paciente. Acompanha, com vagar, o trabalho minucioso dos arqueólogos. A prospecção do sítio e a detecção de ossos, conchas e cerâmicas são registradas com minúcia. Trata-se de gravar, quase em tempo real, a coleta de materiais em campo, sua separação, as primeiras interpretações. Em seguida, há a formulação de hipóteses, um quebra-cabeça que só poderá ser montado para valer no laboratório, com os restos recolhidos sendo examinados por microscópios e devidamente datados.

Fora o fascínio do trabalho arqueológico, a série ressalta a importância da interação da equipe com os indígenas que hoje habitam as terras dos seus antepassados. Hábitos alimentares remontam a milênios, como demonstram as escavações. Outros caem em desuso por interferências contemporâneas. É o caso da ingestão de uma bebida ritual, a chicha, uma cerveja feita de milho, hoje proibida em muitas aldeias por imposição de pastores evangélicos.

PARCERIA. Há, então, essa dinâmica entre passado e presente, feita de rupturas e continuidades, que empresta toda riqueza à série. É uma relação de pesquisa, mas também de respeito. Como diz o arqueólogo, sua profissão, durante muito tempo, foi associada a uma atividade colonialista e predatória. Algo do tipo Indiana Jones. Hoje, busca-se parceria com os habitantes da região. “Afinal, a arqueologia tem o dever de trazer à luz uma história apagada”, diz ele.

São vozes silenciadas que voltam a ser ouvidas. Contam uma história da dignidade e da civilização desses povos, hoje considerados entraves ao “progresso” – a destruição do seu meio ambiente para abertura de pastos, plantação de soja e mineração.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.