A sequência de arquivamentos de inquéritos por ministros do Supremo Tribunal Federal no mês passado, contrariando a Procuradoria-Geral da República, levou cinco parlamentares citados na delação da Odebrecht a solicitar à Corte o mesmo tratamento para as investigações das quais são alvo. Já protocolaram pedido de arquivamento os senadores do PSDB José Serra (SP), Dalírio Beber (SC) e Cássio Cunha Lima (PB), o deputado Rodrigo Garcia (DEM-SP) e o ministro Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), que é senador afastado.

Todos pedem aos ministros Gilmar Mendes e Rosa Weber, relatores dos casos no Supremo, que seus inquéritos sejam extintos por falta de provas, fragilidade nas delações e excesso de prazo. Foram esses os argumentos usados pelos ministros Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Dias Toffoli para negar continuidade a seis inquéritos abertos no ano passado com base na colaboração da Odebrecht.

Na avaliação de um ministro do STF ouvido em caráter reservado, as recentes decisões chamam atenção para a “fragilidade” do acordo da empreiteira. Já para procuradores e delegados da Polícia Federal que atuam na Lava Jato, elas são motivo de preocupação. Eles veem a medida como mais um obstáculo às investigações, que chegam a uma fase decisiva na Corte, e que põe em xeque o potencial do acordo da Odebrecht.

A discussão sobre o tema deve ser reaberta no Supremo em agosto, tanto na análise dos novos pedidos quanto na apreciação de recursos da Procuradoria contra os arquivamentos já definidos. A Procuradoria quer que o caso do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e o dos senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Eduardo Braga (MDB-AM) sejam enviados à primeira instância, após o próprio Supremo limitar o alcance do foro para parlamentares federais.

Já a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, decidiu na segunda-feira passada, dia 9, prorrogar dois inquéritos abertos com base na delação e disse que a continuidade das investigações é um direito da sociedade. “O princípio constitucional da razoável duração do processo impõe-se em benefício da continuidade da ação em respeito ao direito à sociedade”, disse a ministra.

Os inquéritos prorrogados por Cármen foram abertos em abril do ano passado. A decisão reflete um entendimento de que a duração, de 1 ano e 3 meses, não é excessiva, embora reconheça que não pode haver adiamentos perpetuamente. “O direito ao processo penal sem procrastinação é da vítima, do réu e da sociedade”, afirmou a presidente do Supremo ao conceder mais 30 dias “para a conclusão das investigações”.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, criticou os arquivamentos. “Se o Judiciário abre a hipótese de arquivamento sem pedido do Ministério Público, é natural que cada uma das defesas entre com pedido semelhante.” A avaliação é rebatida pelo presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mendes, para quem o STF tem o poder de controle da atuação judicial.

Perícia

A perícia dos sistemas de propina da Odebrecht também é citada pelas defesas. Ao arquivar três inquéritos, Gilmar e Toffoli entenderam que a análise dos sistemas não traria elementos novos. “A única diligência pendente solicitada pela autoridade policial (perícia nos sistemas de comunicação) é absolutamente desnecessária, como já asseverado por V. Exa”, disse a defesa de Aloysio ao pedir a Gilmar o arquivamento. “Quem não pode denunciar, não pode arquivar”, rebateu a Procuradoria, que defende o envio do inquérito à primeira instância.

Continuidade

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mendes, disse que a entidade não vê “nenhum problema” no arquivamento, pelo Supremo Tribunal Federal, de inquéritos sem pedido da Procuradoria-Geral da República.

“Se o Supremo, analisando os elementos de prova, avalia que não há nada que justifique a continuidade, e do outro lado o Ministério Público não traz elementos de maneira que motive a necessidade de continuação, o STF exerce seu papel de controle. Papel que não só pode como deve ser feito”, afirmou Mendes à reportagem.

Presidente da Ajufe desde junho, Mendes avaliou que a Procuradoria deve comprovar a necessidade para que as investigações sejam mantidas. “Passado tempo razoável de investigação sem que elementos mínimos tenham sido apresentados, o Ministério Público não pode deixar esse inquérito aberto ad infinitum, sem uma justificativa plausível”, afirmou o magistrado.

“O STF tomou decisão em casos específicos, não no plenário, que de alguma maneira cria um precedente concreto. Não dá para afirmar que vai criar uma cultura”, disse Mendes. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.