Por Bernardo Caram

BRASÍLIA (Reuters) – O Banco Central avaliou que uma elevação adicional da taxa Selic na semana passada teria reforçado postura de vigilância e refletiria uma atividade econômica mais forte do que esperada, mas a decisão final de manter a taxa em 13,75% considerou cautela e necessidade de avaliar os impactos do aperto feito até agora nos juros, conforme ata do Comitê de Política Monetária publicada nesta terça-feira.

O BC também realizou um exercício alternativo e estimou que a inflação em 2023 e 2024 poderá ficar mais alta do que suas projeções atuais se o nível de ociosidade da economia brasileira estiver menor do que o estimado agora pela autarquia.

De acordo com o documento, as opções de deixar a Selic no mesmo nível e de elevá-la em 0,25 ponto percentual foram “amplamente debatidas”. A decisão de manter a taxa, segundo a ata, foi tomada diante dos dados divulgados, projeções, expectativas de inflação, balanço de riscos e defasagens dos efeitos da política monetária.

A decisão do Copom da semana passada foi a primeira tomada de forma não unâmime pelo colegiado em seis anos em meio, com dois diretores votando por uma elevação residual de 0,25 ponto percentual da taxa básica de juros.

“Esses membros argumentaram que a alta adicional fortaleceria a mensagem de comprometimento do Comitê com sua estratégia, diante da elevação das expectativas de inflação e da projeção no cenário de referência para o ano de 2024, em ambiente de incerteza sobre o nível do hiato do produto e a dinâmica da atividade”, disse a ata.

Segundo o documento, os membros divergentes (Fernanda Guardado e Renato Gomes) avaliaram que os riscos de alta da inflação podem ter impactos mais duradouros caso se materializem.

Na semana passada, o BC manteve a Selic em 13,75% ao ano, interrompendo seu agressivo ciclo de aperto monetário para controlar a inflação, mas ponderou que segue vigilante e não hesitará em retomar as altas nos juros se a redução dos preços não transcorrer como o esperado.

ECONOMIA AQUECIDA

Diante do risco de alta da inflação gerado por um eventual hiato do produto mais estreito do que o utilizado em seu cenário –uma indicação de que a economia poderia estar aquecida a ponto de pressionar a inflação–, o BC fez um exercício para avaliar o tema, embora cite incerteza sobre essa medição.

Pressupondo um cenário alternativo em que o hiato atingiria no terceiro trimestre deste ano o nível zero (quando o desempenho da atividade econômica alcança seu patamar potencial), a autarquia apontou que as projeções de inflação seriam de 4,9% em 2023 e de 3,0% em 2024. No cenário de referência usado atualmente, as expectativas do BC para o IPCA estão mais baixas, em 4,6% para 2023 e 2,8% para 2024.

O BC destacou que o mercado de trabalho seguiu em expansão no país, ainda que sem reversão completa da queda real dos salários dos últimos trimestres, e reforçou que grande parte do efeito do aperto monetário feito até o momento ainda não ocorreu.

A autarquia disse que a opção recente de dar ênfase ao período de seis trimestres à frente para o foco da política monetária está condicionada ao caráter temporário dos cortes de impostos implementados pelo governo. E antecipou que, se a desoneração de combustíveis for mantida ano que vem, voltará a enfatizar horizontes que incluam o primeiro trimestre de 2023.

Para o BC, porém, esse quesito não trará impacto relevante sobre a política monetária porque os efeitos primários dessa redução tributária já estão sendo desconsiderados em seus cenários.

A autarquia disse ainda que não houve mudança substancial nos canais de transmissão de política monetária e que o repasse da alta da Selic para taxas finais de crédito tem ocorrido conforme o esperado, ainda que as concessões para empresas sigam mais robustas que o previsto.

Ao avaliar que a mediana das expectativas de mercado para o IPCA em 2024 tem subido, a ata apontou que todos os membros do Copom concordam que é papel primordial do BC “a condução de uma política monetária compatível com a ancoragem das expectativas em prazos mais longos, fortalecendo continuamente a sua credibilidade e reduzindo o custo desinflacionário futuro.”

RISCO FISCAL

No documento, o BC voltou a questionar o quadro fiscal do país, em meio a promessas de candidatos à eleição de manter repasses sociais turbinados e corrigir a tabela do Imposto de Renda no ano que vem, sem detalhar fontes de custeio das medidas.

Para o Copom, um aumento de gasto permanente e a incerteza sobre a trajetória das despesas a partir de 2023 podem elevar os prêmios de risco do país e as expectativas de inflação.

“Há vários canais pelos quais a política fiscal pode afetar a inflação, incluindo seu efeito sobre a atividade, preços de ativos, grau de incerteza na economia e expectativas de inflação”, disse.

Em relação ao cenário externo, o BC avaliou que o mercado de trabalho em economias avançadas segue aquecido, mas disse que há perspectiva de desaceleração global nos próximos trimestres, com a reversão de gastos tamporários em diversos países, guerra na Ucrânia e política de combate à Covid-19 na China.

Com a “normalização incipiente” nas cadeias de suprimentos e acomodação de preços de commodities, o Copom avaliou que deve haver uma moderação na pressão inflacionária global ligada a bens, mas afirmou que a baixa ociosidade no mercado de trabalho indica que a pressão sobre serviços pode demorar a dissipar.

Para o Copom, com a política monetária caminhando para o campo restritivo em países avançados, há impacto sobre as expectativas de crescimento e uma elevação do risco de “movimentos abruptos de reprecificação de mercados”.

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