A falta de álcool em gel nos comércios e até mesmo o aumento do preço do produto por conta da pandemia do novo coronavírus têm levado algumas pessoas a recorrerem a soluções caseiras, mas que não são eficientes. Na internet, as buscas por “como fazer álcool em gel” deram um salto no Google e o termo começou a ganhar relevância no buscador.

Vídeos e páginas na web ensinam a fazer álcool em gel com gelatina incolor, gel para cabelo e até mesmo álcool para acender churrasqueira. No entanto, especialistas ouvidos pela ISTOÉ alertam que, além de não ter a eficiência comprovada, as fórmulas caseiras podem causar acidentes, irritação na pele e alergias.

Para que o produto tenha ação de combate ao vírus é necessário que a sua concentração esteja entre 60% e 80%. De acordo com a farmacêutica-bioquímica Laura de Freitas, na receita caseira seria preciso realizar um cálculo para garantir uma concentração adequada de álcool no produto final.

“A pessoa vai achar que está protegida, mas vai estar só passando gel de cabelo na mão com cheirinho de álcool e que não tem efeito”, afirma. “As pessoas não devem fazer isso”, ressalta Laura, que faz parte da equipe do projeto “Nunca vi 1 cientista”,  dedicado a falar sobre ciência no Brasil por meio das redes sociais.

A orientação também é dada pela dermatologista Natasha Crepaldi. “A maioria dessas produções caseiras são feitas com água quente ou com produtos quentes, então o risco de mexer com álcool perto do calor é altíssimo”, diz Natasha.

Em nota enviada para a ISTOÉ, o Conselho Federal de Química (CFQ) também reforçou o alerta. “Quando se utiliza álcool líquido em elevadas concentrações, aumenta-se bastante o risco de acidentes que podem provocar incêndios, queimaduras de grau elevado e irritação da pele e mucosas”, explicou o CFQ.

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“Além disso, a depender do que se utiliza como espessante, ao invés de eliminar microrganismos pode-se potencializar sua proliferação”, informou o CFQ.

João Victor/ Arquivo pessoal

Cuidados na hora da compra

Segundo as especialistas, o consumidor precisa observar no rótulo do produto se ele possui o selo do Inmetro e se tem a quantidade correta de álcool.

“O consumidor deve primeiro saber se é uma empresa idônea e de confiança. Se for em uma farmácia de manipulação é preciso conferir se ela possui certificação da vigilância sanitária e, se for um comércio comum, o selo do Inmetro no rótulo é a garantia que a fiscalização foi feita corretamente e que o produto foi testado”, explica a dermatologista.

“A maioria dos géis que são mais seguros é feita com carbopol, é um gel bem neutro, puro, sem outros químicos que possam fazer mal para a pele”, recomenda.

Além disso, o consumidor deve ficar atento à data de validade do produto. Alguns com componentes hidratantes ou óleos podem causar irritações na pele depois de vencidos.

“Esses componentes costumam estragar e podem gerar irritação e alergia e também pode ser que o álcool evapore. Então, se tem uma data de validade, a gente garante que dentro daquele período a quantidade de álcool está correta. Depois da data não há como garantir que a concentração de álcool é a certa para ficar protegido”, informa a farmacêutica-bioquímica.

A concentração correta de álcool no produto é importante porque é ele o responsável por dissolver a camada de lipídios (gordura) que protege o vírus. “O álcool dissolve gorduras e inibe proteínas. Ao dissolver a gordura a gente tira a ‘capinha de proteção’ do vírus. Essa gordura faz uma membrana que protege esses organismos do ambiente e mantém todos os componentes deles inteiros. Dissolvendo essa gordura você rompe essa proteção”, explica Laura.

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Água e sabão x álcool em gel

Ministério da Saúde instalou pia na entrada do prédio para incentivar as pessoas a higienizarem as suas mãos (Crédito:Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Para as especialistas ouvidas pela ISTOÉ, a população deve priorizar o uso de sabão e água corrente para lavar as mãos em vez de usar álcool em gel. “Realmente não há a necessidade dessa loucura de ir atrás de álcool em gel, a lavagem correta das mãos continua sendo a forma prioritária de deixar as mãos higienizadas”, afirma Laura.

“A lavagem correta das mãos é efetiva para eliminar o coronavírus”, enfatiza Natasha. Segundo a dermatologista, o álcool em gel é necessário em situações onde não há a possibilidade de lavar as mãos.

“O que a gente tem falado é: está em casa, não entrou em contato com nada, não precisa ficar usando álcool em gel desesperadamente”, alerta.


A dermatologista ainda cita as principais situações em que é necessário fazer a higiene das mãos. “Antes e depois da refeições, antes da ingestão de líquidos , antes e depois de ir ao banheiro, após tocar pessoas e superfícies que podem estar contaminadas, ao chegar em casa, depois de usar o transporte público tem que lavar a mão, mas lavar a mão corretamente. Com água corrente, com sabão ou detergente, e no tempo adequado, cerca de 20 segundos, e lavar o dorso, a palma e entre os dedos. Nessa época, a recomendação é manter as unhas curtas.”

Segundo Natasha, se a lavagem das mãos foi feita de forma correta, não há a necessidade de passar álcool em gel.

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Limpeza de superfícies

De acordo com Laura, além do álcool etílico outros produtos desinfetantes podem ser usados para a limpeza de superfícies. “Seja ela água sanitária, produtos multiuso, que tenham ação desengordurante, basicamente todos os produtos que a gente já tem em casa podem ser usados normalmente. Não é preciso ir atrás de nenhuma receita mirabolante”, diz.

Questionada sobre o uso do vinagre, a farmacêutica-bioquímica explicou que há um vinagre específico e com um teor maior de ácido acético usado exclusivamente para limpeza. “Ele não pode ser usado nas mãos por risco de causar queimaduras e não substitui o álcool em gel de nenhuma maneira”, ressalta.

Laura também citou uma lista de objetos que devemos ficar atentos e fazer uma limpeza. “Higienize os produtos que você compra no mercado, higienize suas bolsas, tenha o hábito de trocar de roupa quando chegar da rua e procure ficar em casa o maior tempo possível para evitar a contaminação.”

O Conselho Federal de Química também recomenda a higienização do celular. “O mais recomendado para equipamentos eletrônicos seria o álcool isopropílico, uma vez que, por possuir um carbono a mais que o etanol na cadeia carbônica, é menos miscível em água, dificultando a oxidação das peças. Deve-se ter cuidado com a quantidade de produto aplicada, não devendo molhar o equipamento e bastando aplicar com um pano/lenço/papel embebido no álcool”, diz a nota do CFQ.


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