O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), recebeu com “preocupação” e chamou de tentativa de “usurpar as prerrogativas do Poder Legislativo” uma decisão liminar do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que limitou à PGR (Procuradoria-Geral da República) a possibilidade de denunciar e pedir o impeachment de magistrados da corte.
“Reconheço o apoio de cada senador e, na condição de presidente do Congresso Nacional, não hesitarei em defender todas as prerrogativas estabelecidas na Constituição“, afirmou Alcolumbre nesta quarta-feira, 3, em discurso no plenário da Casa.
+Como funciona o processo de impeachment de ministros do STF
A liminar suspendeu trechos da Lei do Impeachment de ministros do Supremo, restringindo o direito de apresentar denúncias contra magistrados e transferindo a atribuição à PGR, hoje chefiada por Paulo Gonet. Pelas regras atuais, cabe justamente à presidência do Senado analisar os pedidos protocolados e, em caso de consentimento, instaurar um processo que depende de maioria simples (41 votos) para aprovação.
O grupo político de Jair Bolsonaro (PL) defende abertamente alcançar esse número de cadeiras na Casa após as eleições de 2026 para derrubar magistrados, com foco especial em Alexandre de Moraes.

Gilmar Mendes, decano do STF
No Senado, Gilmar desagradou da base à oposição
A fala de Alcolumbre coroou a revolta dos senadores com a decisão do decano, que é provisória e será avaliada pelos demais ministros da corte a partir do dia 12.
Antes do presidente da Casa se pronunciar, os senadores Eduardo Girão (Novo-CE), Esperidião Amin (PP-SC), Marcos Rogério (PL-RO), Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG) e Plínio Valério (PSDB-AM) usaram o púlpito do plenário para pedir uma “reação efetiva” ao Judiciário.
À IstoÉ, o tucano disse que a liminar “anula o Senado Federal” e “permitir esse devaneio é reconhecer que não servimos mais para nada“. Em notas, Carlos Viana (Podemos-MG) e Sergio Moro (União Brasil-PR) engrossaram o coro.
“A decisão corrói o equilíbrio institucional e enfraquece o papel do Parlamento. O Supremo guarda a Constituição, mas não existe guardião acima da própria Constituição”, afirmou o mineiro. Já o ex-juiz da Operação Lava Jato disse que Mendes “legislou em causa própria” e equiparou a liminar à PEC da Blindagem — projeto que restringia os instrumentos de investigação contra parlamentares, aprovado na Câmara e rejeitado pelos senadores.
Mesmo membros da base do governo Lula (PT), como Eduardo Braga (MDB-AM) e Omar Aziz (PSD-AM), criticaram a liminar e defenderam a proteção das prerrogativas do Senado. “A independência dos Poderes prevê que uma lei não pode ser revista por decisão monocrática”, disse o emedebista.
Na Câmara, a bancada do partido Novo apresentou uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para reforçar o artigo da Constituição que autoriza qualquer cidadão a pedir o impeachment de integrantes da cúpula do Judiciário. O texto ainda prevê a manutenção das prerrogativas atuais de condução do processo.
Crise entre Poderes se agrava
Sob a ótica da constitucionalidade, a avaliação é de que o ministro do Supremo atuou para retirar poder do Legislativo e transferi-lo ao Ministério Público. Para Rubens Glezer, coordenador do núcleo de Justiça e Constituição da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas), a liminar “tolhe a presidência do Senado” e não pode ser interpretada sem considerar um contexto de agravamento da crise entre os Poderes.
“Ao mesmo tempo em que há uma proposta de estabelecer maior rigor para pedidos de impeachment e impedir o instrumento de ser utilizado para fragilizar o tribunal, a decisão é um instrumento de blindagem dos ministros e um mecanismo de negociação política“, afirmou à IstoÉ.
Parte relevante dos integrantes do Congresso, em especial na oposição, avalia que o Supremo invade competências do Legislativo. Em defesa dessa tese, parlamentares citam julgamentos como o do artigo 19 do Marco Civil da internet, quando a corte determinou que as redes sociais sejam responsabilizadas judicialmente pela publicação de conteúdos ilícitos por seus usuários, e a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal.
A tensão institucional ganhou tração no Senado desde que Lula indicou o advogado-geral da União, Jorge Messias, à vaga aberta no STF com a aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso. Os senadores preferiam e fizeram campanha aberta pela indicação de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ex-presidente da Casa e aliado de Alcolumbre.