Apesar das investidas do presidente Jair Bolsonaro contra a democracia, o Brasil e os brasileiros vivem sob a égide e o amparo do Estado Democrático de Direito. Nele estão incluídos o professor de história e ativista do PT Arquidones Bites e o tenente Albuquerque, da Polícia Militar de Goiás.
Tal regime político implica deveres e direitos, e, para tal exercício, em nome da isonomia, a todas as instituições e a todos os cidadãos cabe o sistema de Checks and Balances. O tenente Albuquerque parece considerar, no entanto, que a democracia foi criada somente para ele. Que pretensão que a farda dá a alguns soldados!
Albuquerque tem todo o direito de ser bolsonarista, desde que isso não interfira em seu procedimento como policial – interferência, aliás, proibida pelo regimento da corporação que integra. Deve o policial militar ser apartidário e apolítico. Da mesma forma, o professor Arquidones possui o mais consagrado direito de ser contra Bolsonaro e nada o impede, dentro dos limites legais e legítimos fixados pela Constituição, de externar sua posição política e ideológica. Trata-se da liberdade de expressão e manifestação.
O professor encontrou recentemente, no entanto, o Albuquerque no caminho. No carro do profesor estavam colados, em letras bem visíveis, os dizeres: “Fora Bolsonaro Genocida”. O tenente ordenou que ele parasse o veículo e tirasse o enorme adesivo. O professor, conhecedor de seus direitos constitucionais, recusou-se. O tenente, extrapolando em suas funções, deteve o professor, julgou-o e o condenou como difamador e caluniador do presidente. Vê se pode: um PM julgando o que alguém pode ou não expressar e como pode fazê-lo. O Albuquerque se sentiu magistrado! Repita-se: Albuquerque é policial de uma instituição de patrulhamento ostensivo. Apenas isso. Quis ser juiz! Absurdo típico e bravata típica do bolsonarismo. Ele chegou a dizer (tem gravação de celular mostrando) que se tratava de calúnia e difamação. Albuquerque, o juiz! Albuquerque, você atropelou a lei.
Albuquerque levou o professor (que chegou a ser algemado) para a delegacia da Polícia Civil da cidade de Trindade, para que ele fosse autuado de acordo com a Lei de Segurança Nacional. Claro que o delegado, cumpridor de seus deveres e conhecedor da legislação, recusou-se a cometer tal desvario. Albuquerque tranportou o professor, então, para a Polícia Federal em Goiânia. Também aí o delegado, agindo dentro da lei, não concordou e liberou o detido. Albuquerque quis novamente seguir com Arquidones detido para Trindade, mas viu que perdera a parada.
Albuquerque errou. Primeiro: ele não pode deter alguém a partir de suas colorações ideológicas. Segundo: se Bolsonaro se sentir difamado ou caluniado, somente ele, Bolsonaro, pode tomar providências legais, jamais um terceiro. Albuquerque, nesse caso, você é terceiro. Finalmente: a Lei de Segurança Nacional tem de proteger o Estado, não a figura do presidente quando é criticado.
Em tempo: nas redes sociais apareceu imagem de Albuquerque sorrindo ao lado de Bolsonaro, que sorri também. Ambos juntos. Só isso diz tudo, não é? Albuquerque, o tenente, está enrolado.