AfD, a aliada de Trump no Parlamento alemão

AfD, a aliada de Trump no Parlamento alemão

"AliceA AfD, que tem setores classificados como extremistas de direita, quer se envolver mais na política externa alemã, seguindo a linha de Trump e seus novos aliados no governo dos EUA.Medos, cenários catastróficos e teorias da conspiração alimentam a Alternativa para a Alemanha (AfD). Quando, na noite da eleição, saiu o resultado de que o partido – que o serviço secreto alemão classifica como, em partes, extremista de direita – obteve uma votação histórica, com 20,8%, mas mesmo assim ficaria em segundo lugar, atrás da aliança conservadora CDU/CSU, os comentários começaram a aparecer nas redes sociais: "Fraude eleitoral!", "Adeus, Alemanha!", "Vamos todos morrer", "Última esperança: Trump!".

Apoiadores da AfD não têm tempo para festejar que o número de votos tenha dobrado de uma eleição para a outra – o que os move parece ser uma fixação pela ruína. Para eles, a Alemanha, a terceira maior economia do mundo, está à beira do colapso. E não é de hoje, há décadas já. E milhões de alemães parecem concordar com eles e votam na AfD. Para que algo mude, eles exigem – copiando o slogan do presidente dos EUA, Donald Trump – a "Alemanha em primeiro lugar!"

Teorias da conspiração

O empresário Jürgen Elsässer, um fervoroso teórico da conspiração e apoiador do presidente dos EUA, também exige isso. Elsässer já foi um extremista de esquerda. Hoje ele é um extremista de direita, empresário de comunicação e influente militante na campanha eleitoral da AfD. Na noite da eleição, seus funcionários da Compact TV estiveram entre os primeiros a conseguirem entrevistas com as lideranças do partido. A editora Compact é alvo de um processo de proibição que corre em última instância no Tribunal Administrativo Federal.

A acusação é de que a Compact, que publica a revista de mesmo nome, espalha "conteúdo antissemita, racista, de desrespeito às minorias, de revisionismo histórico e de teorias da conspiração", de acordo com o Ministério do Interior da Alemanha, que em julho de 2024 proibiu a circulação da publicação (a proibição foi suspensa pelo Tribunal Administrativo Federal até o julgamento do caso). A candidata à chanceler federal da AfD, Alice Weidel, considera a tentativa de proibição um "sério golpe à liberdade de imprensa".

O próprio Elsässer participou da transmissão ao vivo, no domingo da eleição, do seu canal no YouTube. Situações como essa o agradam: tudo está ainda incerto e aberto a especulações! Durante o programa, Elsässer reclama dos alemães: muito poucos votaram na AfD. "Parece-me que há uma tendência suicida na maioria dos alemães", diz. Quase 400 mil seguem seu canal.

Guerra de duas frentes

Para quem acredita nas palavras de Elsässer, a guerra está chegando à Alemanha, e o responsável é o candidato a chanceler federal Friedrich Merz, dos partidos conservadores democratas cristãos. "O que está por vir é uma guerra de duas frentes, que o Sr. Merz quer começar", alega Elsässer. De um lado a Rússia, do outro os Estados Unidos. "E o último a tentar isso havia sido Adolf Hitler", acrescenta. Merz e Hitler, destruição, Alemanha em ruínas – pior não tem como.

Mas Elsässer vê uma saída para a Alemanha: "Talvez precisemos de uma ocupação temporária pelas potências de paz Estados Unidos e Rússia". No programa de TV, o ex-membro da AfD no Bundestag Armin-Paul Hampel o apoia: a chamada cláusula dos Estados inimigos, da Segunda Guerra Mundial, ainda é aplicável, diz.

Ela permitiria às antigas potências vitoriosas, Rússia e Estados Unidos, "intervirem política e militarmente na Alemanha sem uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, se estiverem convencidas de que a situação política está se tornando instável", afirma o ex-deputado. Os presidentes dos EUA e da Rússia, Donald Trump e Vladimir Putin, como salvadores da nação alemã: é o que sugere a direita radical moderna.

Apoio de Musk e Vance

A Alemanha não está à beira do abismo, não quer uma guerra de duas frentes e teorias da conspiração como essas soam risíveis, mas a verdade é que elas criam um ambiente que pode ter um impacto no mundo real. A eleição de 2025 mostrou que muitas pessoas na Alemanha têm preocupações causadas pelo medo da guerra e das crises.

No dia seguinte à eleição, Weidel aproveitou a onda: "Deve valer para a Alemanha que tenhamos bons contatos com nossos parceiros: os Estados Unidos, a Rússia e a China", disse a líder da AfD na primeira entrevista à imprensa da capital alemã após a eleição.

E, com os seus novos contatos no governo Trump, como o conselheiro governamental Elon Musk e o vice-presidente JD Vance, que a apoiaram na campanha eleitoral, Weidel aproveitou para passar por cima do novo governo e se posicionar como interlocutora: "Somos o contato dos nossos parceiros no cenário internacional", declarou.

A AfD vai continuar sem poder implementar suas políticas porque, devido à natureza radical do partido, ninguém na Alemanha quer formar uma coalizão de governo com ela. Mas a pressão que a sigla pode exercer sobre a política externa pode vir a ser um desafio para o futuro chanceler federal.

"O governo Trump não tem qualquer interesse em manter a Europa como um player forte. Sua abordagem parece ser a de apoiar nacionalistas radicais para enfraquecer a União Europeia", comenta o cientista político Boris Vormann.

Valores em comum com Trump

Ou seja, a forte presença AfD no Bundestag poderia ser um instrumento para o governo Trump minar a autoridade do governo alemão. A base para isso é a proximidade ideológica de Trump com a AfD. "Há uma ideia comum sobre o que está errado na sociedade, como a rejeição do 'wokismo' e a defesa da família tradicional e dos valores conservadores", observa Vormann.

E assim como Trump, a AfD tem certa admiração pelo presidente e homem forte da Rússia, Vladimir Putin. O líder da AfD no estado da Turíngia, Björn Höcke, classificado de extremista de direita pelo serviço interno da Alemanha e um dos políticos mais influentes da AfD, elogiou a Rússia de Putin numa entrevista em janeiro de 2023: "Hoje é um país não apenas com associações negativas, mas também do qual alguns têm a esperança de que possa ser pioneiro num mundo de Estados livres e soberanos, sem influência hegemônica".

O fato de Putin estar travando uma guerra sangrenta na Ucrânia, que já causou a morte de dezenas de milhares de pessoas, não é um problema para a AfD. Nem que os Estados Unidos, sob o comando de Trump, estejam colocando o Estado de Direito sob pressão. Com a proximidade ideológica a ambos, os líderes da AfD querem dar a si mesmos ares de estadistas. Se os conflitos entre a Europa e os EUA ou a Rússia aumentarem, eles também poderão se posicionar como uma alternativa na política externa.

Em meio a tudo isso, a AfD persegue um objetivo: tornar-se a maior força política da Alemanha. Até lá, ela não vai deixar os conservadores em paz e vai mantê-los sob pressão. Na noite da eleição, Weidel já falava sobre o pleito de 2029: "Aí teremos um mandato para governar".