Acordo Mercosul-UE mira fenômeno do ‘italian sounding’

SÃO PAULO, 24 OUT (ANSA) – Por Elisabetta Guidobaldi – O fenômeno do “italian sounding” – produtos com nomes que soam italianos, mas não são – está presente nas prateleiras de supermercados de São Paulo e de todo o Brasil em níveis considerados alarmantes, com denominações como “reggianito”, “grana padao” e “tipo grana”.   

Para o consumidor brasileiro, é difícil distinguir se o produto é realmente italiano ou não. A diferença no paladar é evidente para quem conhece os originais, mas os similares podem agradar, especialmente a um comprador não habituado.   

E é justamente sobre os falsos produtos italianos e europeus que se trava uma das batalhas mais importantes do acordo entre a União Europeia e o Mercosul.   

“O objetivo é assinar o acordo em dezembro”, declarou o comissário de Agricultura da UE, Christophe Hansen, durante missão de alto nível em São Paulo com 76 empresas agroalimentares do Velho Continente, 12 delas italianas – a maior representação nacional.   

“Não será uma liberalização sem regras. Seremos rigorosos quanto à reciprocidade e não daremos passos atrás na defesa de nossas tradições”, afirmou Hansen, citando as salvaguardas adicionais propostas, que representam uma “apólice de seguro” para as empresas do setor.   

Essa estratégia, no entanto, não convence totalmente os agricultores italianos, que apontam a falta de um mecanismo de segurança automático sobre a reciprocidade. “Para a Confagricultura, o acordo com o Mercosul é controverso”, disse o presidente da entidade de agricultores, Massimiliano Giansanti.   

“Se é verdade que alguns setores podem se beneficiar, como o de vinhos, por outro lado, muitos segmentos serão muito prejudicados”, especialmente açúcar, frango, arroz e carne bovina, acrescentou.   

Um total de 344 bebidas e alimentos da UE estarão protegidos contra imitações, 57 dos quais são italianos. A lista inclui desde vinagres balsâmicos até presuntos e queijos, além de uma série de vinhos, maçãs e até os biscoitos cantucci da Toscana, de acordo com relatório da Direção-Geral de Comércio da Comissão Europeia.   

Entretanto, uma análise da confederação de produtores agroalimentares Coldiretti com base em dados do Instituto Nacional de Estatística (Istat) revela que, nos primeiros oito meses de 2025, as importações italianas dos países do Mercosul no setor aumentaram 18% em valor, totalizando 2,3 bilhões de euros. Em contrapartida, as exportações de produtos made in Italy para a América do Sul foram de cerca de 284 milhões de euros, uma queda de 8%.   

O relatório europeu aponta que, em 2024, o valor das exportações italianas de produtos agroalimentares para o Mercosul foi de quase 500 milhões de euros, com tarifas que variavam de 27% a 55%. Essas alíquotas serão gradualmente eliminadas com o acordo, chegando a zero para alguns produtos.   

“Somos absolutamente favoráveis ao acordo com o Mercosul porque, antes de tudo, reduz as tarifas – hoje o Parmigiano Reggiano e o Grana Padano pagam 28% – e criará uma cota de 30 mil toneladas de queijos com tarifa zero da Europa para o Mercosul”, disse Paolo Zanetti, presidente da associação de produtores de laticínios Assolatte. Atualmente, as exportações europeias de queijos para o Brasil são de 2 mil toneladas por ano, 500 das quais da Itália.   

Giada Battaglia, líder da associação de indústrias de carnes e salames Assica, vê o acordo como positivo para a defesa dos embutidos italianos. Já Ignacio Sanchez Recarte, secretário-geral do Comitê Europeu das Empresas de Vinho (Ceev), assegurou que a União Europeia “não será inundada” por produtos argentinos, estimando em 30 milhões o número de consumidores em potencial para os rótulos da UE apenas no Brasil.   

A missão em São Paulo também serviu para o comissário Hansen responder às críticas sobre os cortes propostos para a Política Agrícola Comum (PAC) no período de 2028 a 2034. “Há 300 bilhões de euros já assegurados e destinados, enquanto outros 453 bilhões ainda não definidos poderão ser utilizados por meio de programas escolares, conectividade rural e atividades no pilar ambiental”, explicou. (ANSA).