Diplomacia

O viés ideológico que caracteriza a política externa brasileira desde o início do governo Bolsonaro dá mostras de que a insensatez dos responsáveis pela nossa diplomacia coloca em risco os negócios do País no exterior, sobretudo com a China, nosso maior parceiro comercial. A mais recente barbeiragem das autoridades brasileiras em relação ao país asiático partiu do ministro da Educação, Abraham Weintraub, e pode levar o Brasil a perder milhões de dólares. De forma imprudente, Weintraub ridicularizou os chineses. Em uma live na sua página do Instagram, no domingo (5), o ministro previu outra epidemia na China por causa dos hábitos alimentares locais: “(Os chineses) Comem tudo que o sol ilumina e algumas coisas que o sol não ilumina comem também.” Um dia antes, no Twitter, ele fez chacota com a população do país que corresponde a 30% das exportações brasileiras. Em uma postagem caricata e usando o personagem Cebolinha, da Turma da Mônica – que troca a letra R pelo L -, ele acusou os chineses de terem um plano para dominar o mundo por meio da disseminação da Covid-19.

“Cunho racista”

O governo chinês reagiu com contundência, dizendo que as declarações do ministro eram “absurdas e desprezíveis, com cunho fortemente racista”. Para a Embaixada da China no Brasil, esse tipo de comentário, que tem se tornado frequente por parte das autoridades brasileiras, “tem causado influências negativas no desenvolvimento saudável das relações bilaterais China-Brasil”. Traduzindo a mensagem diplomática: o Brasil pode sair prejudicado. Afinal, essa postura agressiva em relação aos chineses não se limita ao ministro, que mal sabe escrever em português.

A xenofobia contra os chineses
PERIGO Araújo tem referendado os ataques “à ideologia maoísta” da China (Crédito:Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Em março, logo depois de voltar de uma viagem aos Estados Unidos, onde acompanhou o pai em um jantar com o presidente Donald Trump, em Miami, o deputado Eduardo Bolsonaro disse que o coronavírus foi criado em laboratório pelo Partido Comunista da China para infectar a humanidade. A embaixada chinesa, como agora, também mostrou-se indignada e respondeu que o filho do presidente havia “contraído um vírus mental” nos EUA. Por tudo isso, as relações diplomáticas entre os dois países nunca estiveram tão estremecidas. E o Brasil já está perdendo negócios importantes com os chineses. Na semana passada, uma grande quantidade de equipamentos médicos que o Brasil havia comprado da China, como ventiladores mecânicos, máscaras e luvas, foi desviada para os EUA. O Brasil está perdendo, também, muitos contratos de exportação de soja, já que os chineses estão preferindo comprar o produto dos americanos. A soja é o principal item da balança comercial brasileira.

“As absurdas declarações das autoridades brasileiras têm causado influências negativas no desenvolvimento saudável das relações bilaterais China-Brasil” Embaixada da China no Brasil

Tudo isso demonstra que a diplomacia brasileira trocou os pés pelas mãos, substituindo o tradicional pragmatismo pela intolerância. E sempre com a tutela do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, que tem endossado esses ataques virulentos.

Ele, no entanto, diz que a questão com a China não está relacionada a uma maior aproximação com os EUA, como afirmam seus críticos. “Não é uma questão da China em si como governo. É sobre a ideologia maoísta”, diz Araújo. Mas o ex-embaixador do Brasil em Washington, Rubens Barbosa, explica que é necessário o País não ter alinhamento automático com nenhum país especificamente: “O Brasil tem que defender seus interesses acima das ideologias e não tomar partidos em nenhuma disputa entre EUA e China”, afirmou Barbosa.