Ao contrário do antecessor, Bruno Covas faz questão de dizer que é político. Tem a política no sangue. Neto do ex-governador Mário Covas, Bruno começou a fazer política aos 8 anos, integrando o Clube dos Tucaninhos, em Santos, onde nasceu. Desde criança ia a Brasília participar de eventos do avô como senador. “Ele foi meu exemplo de vida”. Por isso, em 1995, quando tinha 15, deixou a casa da mãe Renata e foi morar no Palácio dos Bandeirantes, ocupado pelos avós, pois desejava estudar na capital e seguir os passos do “vô Mário”. Só deixou o Bandeirantes em 2001 com a morte do governador, quando tinha 21. Três anos depois, disputou sua primeira eleição, a de vice-prefeito de Santos, mas não se elegeu. Na sequência, teve uma carreira meteórica: foi deputado estadual, secretário Estadual do Meio Ambiente, deputado federal e vice de João Doria, assumindo o cargo de prefeito no sábado 7, no exato dia em que comemorou 38 anos. Sentou-se na cadeira que já foi do avô há 35 anos (1983 a 1986) e passou a administrar um Orçamento de R$ 54 bilhões — o terceiro maior do País. Agora, quer levar os ensinamentos do avô para desenvolver uma gestão ética, com transparência e eficiência administrativa, sem deixar de lado a estratégia de encaminhar a cidade para o cumprimento de sua nova vocação, voltada para o turismo e eventos de negócios.

A sua posse representa a volta dos Covas à Prefeitura de São Paulo, quase 40 anos depois de seu avô Mário Covas ter assumido o cargo. É uma tradição das dinastias na política. Quais as lições que você aprendeu com seu avô?

É natural que se tenha parentes de políticos fazendo política. É um exemplo que eu tive dentro de casa. Mais que isso, eu vim morar com ele no Palácio dos Bandeirantes em 1995. Ele é minha referência. Não fosse o exemplo dele, certamente eu não faria política. Eu tinha 8 anos e já fazia campanha para o senador Covas, do MDB, número 554.Tirei meu título e com 16 anos já era militante da juventude do PSDB.

O seu avô sempre lutou pela ética na política e pela administração com transparência, eficiência de gestão e desburocratização. Essas também serão marcas que o senhor pretende adotar?

Ele teve marcas importantes. Foi o prefeito que criou o passe do idoso, os mutirões, foi senador líder do PMDB na Constituinte e foi o governador que revolucionou o Estado de São Paulo, com as Fatecs, as concessões, mas acima de tudo é lembrado por valores e princípios: a questão da ética, da honestidade, da autenticidade. Essas são as grandes marcas dele, muito mais que as marcas de governo. Foram marcas do jeito de fazer política e, se lá na frente, eu puder ser reconhecido por isso, será algo satisfatório.

São Paulo ainda tem alguns problemas financeiros, como um grande déficit na Previdência. Como estão as contas da cidade?

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Quando assumimos, em 2017, herdamos um Orçamento que não batia com a realidade. As receitas estavam superestimadas e as despesas subestimadas. No encontro de contas havia um rombo projetado para o final de 2017 de R$ 7,5 bilhões. De janeiro a dezembro de 2017 passamos cortando despesas e criando receitas para superar esse rombo. E chegamos ao final de 2017 zerando, sem dívida alguma para 2018. Hoje, temos um Orçamento adequado, mas temos um problema que não foi corrigido e que eclodiu, que é o da Previdência municipal.

Rombo de R$ 1 bilhão por ano?

Não. É R$ 1 bilhão a mais por ano. No ano passado o déficit foi de R$ 4,7 bilhões e este ano será de R$ 5,8 bilhões. Mais de 10% do Orçamento, que este ano será de R$ 54 bilhões. Agora em 2018, vamos gastar 90% da arrecadação do IPTU com o pagamento de aposentadorias. É como se a gente pegasse 9 de cada 10 carnês de IPTU só para pagar aposentados.

O governo federal também vem tentando aprovar a reforma da Previdência sem conseguir…

Só que o governo federal tem meta de déficit. No final do ano, roda moeda para pagar. Na prefeitura não. Temos que chegar ao final do ano no zero a zero. Senão, somos processados pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Não temos a possibilidade de deixar a dívida para lá. A nossa situação é mais grave do que a do Governo Federal. Em São Paulo.

Você disse que sem a reforma, vai aumentar impostos?

Alguma coisa teremos que fazer. Ou aumentamos impostos ou cortamos do Orçamento para educação, saúde, meio ambiente, transporte, zeladoria… Ou deixaremos de pagar aposentadoria. Se a reforma federal tivesse acontecido, um terço do nosso déficit teria sido resolvido. Ao invés de um rombo de R$ 5,8 bilhões, estaríamos falando de R$ 3,9 bilhões, o que aliviaria um pouco os cofres da prefeitura.

São Paulo tem o terceiro maior orçamento do País, mas também tem problemas enormes. Você pretende continuar procurando firmar parcerias com a iniciativa privada para superar as dificuldades orçamentárias?

São as atuações do executivo que possibilitam o crescimento partidário, o que só aumenta minha responsabilidade de gerir o maior Orçamento nas mãos de um governante do PSDB. Temos que cuidar bem da casa, da responsabilidade fiscal, das concessões, privatizações, para tirar das mãos da prefeitura a gordura que tiver, transferindo-a para a iniciativa privada cuidar. Mas eu entendo que arrumar a casa não é um fim em si mesmo. A gente arruma a casa para melhorar a vida das pessoas. Eu gostaria de imprimir a marca do olhar social, que já foi uma ação do ex-prefeito Doria ao longo dos últimos 15 meses: corujão da saúde, que acabou com as filas para exame, criação de 17 centros de acolhimentos, 2 mil empregos para moradores de rua, acabamos com a fila da pré-escola. Esse é o foco. Essa é a finalidade do governo, é o anseio da população. Com isso, pretendemos ter um reflexo na imagem do PSDB.

A cidade tem ampliado em muito sua vocação também no turismo. No carnaval, a cidade até superou o Rio nesse quesito. A sua administração pretende dar força a esse setor, até como forma de reduzir a grande taxa de desemprego que atinge os paulistanos?


Não há a menor dúvida de que o nível de emprego acompanha muito a variação do PIB, resultante da política do governo federal. Mas o município precisa atuar sobretudo nos setores que precisam ser mais estimulados. Em São Paulo, o que puxa a economia é a área de serviços, mas mais do que isso, é o setor da economia de baixo carbono. É o turismo, a gastronomia, a arte, teatro. São Paulo cada vez mais se transforma em um pólo de shows. No ano passado, quase não havia agenda para eventos no Allianz, no Morumbi, no Pacaembu, no Anhembi. Temos outros grandes eventos, como o Carnaval, a Fórmula 1, a Parada Gay, a Marcha para Jesus, o turismo de negócios. Recebemos aqui 12 milhões de turistas por ano, que é a mesma população da cidade. E isso é geração de emprego e renda.

Hoje a classe política ou está na cadeia, ou está sendo investigada e denunciada. Com o senhor vê Lula na prisão e o avanço dessa limpeza ética na política?

Eu não tenho nenhuma satisfação pessoal em ver o Lula preso. Não fico feliz com isso. Agora, do ponto de vista institucional, isso mostra que vivemos num outro País. O País da pós-Lava Jato mostra que pouco importa o grau de influência, a sua riqueza, de onde você veio, quem são seus advogados. Errou, você vai pagar por isso. Do ponto de vista do simbolismo, a prisão do Lula vai exatamente nessa direção: uma pessoa influente, conhecida no mundo todo, está atrás das grades.

Você acha que ao espetacularizar sua prisão, Lula zombou da Justiça?

Não há a menor dúvida. Não só pelo espetáculo, mas da forma como ele se comportou nos depoimentos, nas entrevistas, sempre incitando a população contra a Justiça, contra uma instituição democrática. É algo inaceitável. O comportamento dele, a forma como ele enfrentou as ações que geraram a prisão, e a forma como ele enfrentou o processo, foram inaceitáveis.

Além dos petistas, há membros do PMDB e também do PSDB que estão sendo investigados, como o senador Aécio. Você acha que o combate à corrupção vai dominar a campanha eleitoral deste ano?

A corrupção já foi tema nas últimas eleições e sempre estará presente. É requisito inicial para poder ser considerado o voto a pessoa não ter tido condenações em segunda instância, ter ficha limpa, etc. Mas é claro que a população também está preocupada com seu futuro. Como vai melhorar o posto de saúde, a escola? Não adianta só ter o discurso de desconstrução do adversário por conta da questão da corrupção. Você precisa dizer o que pretende fazer. Os defeitos do outro não aumentam suas virtudes. A corrupção sempre vai existir. Anos atrás tinha o candidato rouba mas faz. O Maluf era assim. Esse tema já está presente nas campanhas há muito tempo. Mas a população quer saber como é que você, que se diz não corrupto, vai melhor a sua vida.

O centro está congestionado com várias candidaturas, inclusive a do presidente Temer. Isso não favorece uma polarização entre direita e esquerda?

Não há a menor dúvida. Se essa fragmentação permanecer, vamos ter na eleição federal o que aconteceu para a Prefeitura do Rio em 2016, com seis ou sete candidatos de centro, mas com a polarização entre o Crivella, na direita, e o Freixo, na esquerda. Qualquer extremismo é ruim.

O Alckmin vai conseguir unir o centro em torno dele?

É isso que eu espero. Vou ajudar no que puder. Vou ser o militante de sempre do PSDB, mas só nas horas vagas.


Você tem dito que é contra o Foro Privilegiado e que é a favor do foro concentrado. O que isso quer dizer?

Sou contra o político responder direto no STF, no STJ ou no Tribunal de Justiça. Isso traz um sentimento de impunidade que temos no Brasil. O que é preciso é não deixar que o fim do Foro Privilegiado represente também uma dificuldade para se fazer política. Imagina o presidente da República deixando de responder perante o STF e ter que passar a responder a centenas de ações, uma em Rio Branco, no Acre, outra em São Paulo, outra em Brasília. O que se precisa é ter um foro concentrado. Qualquer tipo de ação tem que se concentrar na vara A ou vara B, onde houve o primeiro processo contra o político. Concentrar todas ações no mesmo lugar, para que o político possa fazer sua defesa num único juízo. Se não, só rico que tem condições de contratar um escritório imenso de advocacia poderá ser político.

Seu avô foi adversário do regime militar. Nos últimos dias, os militares tem se posicionado contra a impunidade a políticos. Como você vê a movimentação nos quartéis?

Eles têm todo o direito de dar opinião, mas não quer dizer que vão dar golpe. Até porque hoje a Nação não aceitaria a repetição de 1964. O cenário é completamente diferente. Não podemos negar a eles o direito de opinar.


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