A eleição dos governadores dos três maiores Estados (São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais) foi a demonstração inequívoca de que a política brasileira respira novos ares. A nova política venceu a disputa contra representantes das velhas estruturas partidárias, confirmando a tendência de que o eleitor clamava pelo novo, desde métodos modernos de fazer campanha até propostas de gestão espelhadas na eficiência da iniciativa privada. As vitórias de João Doria (PSDB), em São Paulo, Romeu Zema (Novo), em Minas Gerais, e Wilson Witzel (PSC), no Rio de Janeiro, poderão servir de parâmetro para dar início a uma reformulação partidária, em que os partidos tradicionais terão que ser refundados, com a adoção de recursos mais atuais de participação popular, principalmente pelo uso mais intensivo das redes sociais. A eleição de Doria, por exemplo, deverá deflagrar a reestruturação do PSDB, que sofreu uma de suas piores derrotas à nível nacional nos últimos 30 anos. Com sua vitória, deve ressurgir um PSDB mais à direita, mais contundente contra a esquerda lulopetista e menos indeciso quanto às posições políticas. “O PSDB vai descer do muro”, disse Doria em entrevista exclusiva à ISTOÉ, contrapondo-se à atual direção nacional do partido, conhecida por posturas claudicantes.

Apoio ao governo Bolsonaro

Doria deixou claro que sua vitória irá mudar a correlação de forças dentro do PSDB nacional. “Vamos liderar, a partir de São Paulo, as mudanças necessárias no PSDB”, disse o tucano no ato em que comemorou a vitória apertada sobre seu oponente, o socialista Márcio França, a quem derrotou por uma diferença de apenas 750 mil votos (conquistou 10,9 milhões de votos, ou 51,75% do total), Com isso, o PSDB permanece no comando do governo de São Paulo por 28 anos consecutivos. O tucano avalia que a campanha que o levou ao Palácio dos Bandeirantes foi “uma das mais sujas”, sobretudo nos últimos dias, em que seus adversários montaram filmes eróticos com sua suposta participação, o que peritos concluíram tratar-se de deslavada farsa.

A eleição de Doria guarda relação com a dos governadores de Minas Gerais e Rio de Janeiro pela postura adotada ainda no final do primeiro turno, quando percebeu que seu candidato a presidente, Geraldo Alckmin, não tinha respaldo popular. Foi quando lançou o voto “Bolsodoria” – Bolsonaro para presidente e Doria governador, contrariando o PSDB nacional. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, presidente de honra do partido, chegou a dizer que o ex-capitão do Exército representava tudo o que ele mais abominava. Estratégia vitoriosa, Doria confirmou à ISTOÉ que pretende liderar os tucanos para apoiar formalmente o governo Bolsonaro. Resta saber até quando , já que o tucano pode se transformar num dos nomes fortes para concorrer ao Planalto em 2022. “Agora não é hora de tratar da sucessão presidencial”, prega Doria.

A associação a Bolsonaro catapultou Doria ao governo de São Paulo, do mesmo modo que contribuiu para as vitórias de Romeu Zema e Witzel em Minas e no Rio

Um empresário no poder

QUEBRADO O novo governador mineiro admite adotar medidas
impopulares para conter a crise fiscal (Crédito:Luis Evo/Folhapress)

Em Minas Gerais, o clima de mudanças foi até maior. O empresário Romeu Zema (Novo) nunca havia disputado uma eleição. Dono de uma grande rede atacadista de Minas Gerais, Zema derrotou o tucano Antonio Anastásia por 71,8% (6,9 milhões de votos) a 28,2% (2,7 milhões de votos), na espetacular vitória de um desconhecido contra um ex-governador e representante da velha política mineira. “Só vou receber salários como governador quando o funcionalismo mineiro estiver recebendo salários em dia”, prometeu Zema. Em função da situação caótica do Estado, quadro legado pelo governador petista Fernando Pimentel, que fez uma péssima gestão, recheada por denúncias de corrupção, Zema já sinalizou que vai precisar tomar “medidas impopulares”, cujo teor ainda não detalhou.

“Só vou receber salário de governador quando os funcionários estiverem recebendo em dia” Romeu Zema, governador eleito de Minas Gerais

No vizinho Estado do Rio de Janeiro, a situação não é menos dramática, com o Estado falido e sitiado por tropas das Forças Armadas, para impedir que a violência nas ruas inviabilize o bem estar social. O governador eleito Wilson Witzel (PSC), que recebeu 4,6 milhões de votos (59,8%), já adiantou que vai pedir ao presidente eleito Jair Bolsonaro ajuda para a manutenção da segurança no Estado com o uso de tropas federais. Como ex-juiz, Witzel disse que espera contar com o apoio de todos para tirar o Estado do atoleiro. Os novos governadores terão, portanto, quatro anos para provar que o eleitor não se enganou ao aposentar a velha política.

ENTREVISTA/JOÃO DORIA

“O PSDB vai descer do muro”

Ouça entrevista com Doria

 

A eleição de João Doria para o governo de São Paulo constitui uma dupla vitória política para o tucano. Além de protagonizar o principal triunfo do partido neste pleito, Doria se cacifa para doravante ser o grande líder do PSDB. O novo tom espelha os novos ares. Segundo ele, o PSDB perderá a pecha de partido “em cima do muro”

Ao se eleger com quase 11 milhões de votos, o senhor acredita que a vitória o transformará no principal líder do PSDB no País?
É uma vitória expressiva, mas eu não tenho a expectativa de ser o maior líder do partido. O PSDB tem que ser um partido sintonizado com a realidade do País, com o povo e com as pessoas mais simples, que sofrem pela miséria, desemprego, pela falta de recursos nas áreas da educação, saúde, legado maldito dos governos Lula e Dilma.

O senhor disse no discurso da vitória que o PSDB vai mudar e que a partir de agora não ficará mais em cima do muro. O que o senhor quis dizer com isso?
Que o PSDB tem um lado. Eu não vou mais freqüentar a histórica muralha do PSDB, de adiar decisões ou não tomar decisões para não ser avaliado pelas atitudes tomadas. O PSDB vai descer do muro. Eu prefiro ser avaliado pelas decisões que eu tomo e pelas opções que eu adoto, ainda que possa estar errado. E se eu errar, terei humildade de corrigir o erro e poder avançar novamente.

O que precisa mudar no PSDB?
O PSDB, que já chegou a ter sete governadores, desta vez elegeu apenas três. O PSDB precisa reciclar a sua estrutura e repaginar o seu posicionamento em relação ao povo. Não pode viver do passado. Deve-se respeitar o passado, preservar a memória, mas sintonizar com o presente.

O senhor acredita que o partido vai adotar uma postura mais radical no combate à esquerda?
Eu serei. E espero que o PSDB também possa ser. O PSDB nunca foi um partido de esquerda ou aliado do PT. A meu ver nem deve passar pelo conceito de ter um posicionamento desse tipo. Eu não terei.

O PSDB sob seu comando deve ir mais para a direita?
Acho que ele deve ir mais para o centro. Eu não sou de direita. Sou de centro. Entendo, contudo, que o PSDB não pode se posicionar à esquerda, diante de um País que não quer a esquerda.

O senhor acabou se unindo a Bolsonaro para derrotar a esquerda. Isso vai continuar?
A resposta à esquerda foi dada pelos eleitores nas urnas. Numa eleição muito acirrada, mas onde prevaleceu a voz do eleitor. E o eleitor, majoritariamente, disse que não quer a esquerda. Quer Lula preso. Ele vai ser mantido na prisão, sem nenhum aceno de possível liberdade. Ele é criminoso, cumprindo pena. Eu vou inclusive defender o fim das saidinhas da cadeia. No caso de Lula, ele não vai ter nem saidinha e nem saidona. Vai ter de cumprir a pena na prisão.

O PSDB poderá vir a fazer parte da base aliada de Bolsonaro?
Aqui em São Paulo nós já definimos. Vamos apoiar Bolsonaro. Ao apoiá-lo, nós estamos apoiando o Brasil. Não vamos apostar no quanto pior melhor. O PSDB não vai ficar em cima do muro esperando um escorregão ou um tropeço de Bolsonaro para daí então se posicionar. Não é preciso participar do governo para apoiar. É preciso compreender a importância de que o apoio ao governo Bolsonaro neste momento é o apoio ao Brasil. E para isso não é preciso cargo no governo, ocupar espaço fisico no governo.

O seu sonho sempre foi ser presidente do Brasil. O senhor pretende ser candidato a presidente em 2022?
Não está no nosso projeto. Hoje ele está integralmente voltado para a gestão em São Paulo, montagem de governo, na transição de governo e na valorização de São Paulo. Não é hora de tratar da sucessão presidencial. Vou apoiar Bolsonaro em suas boas causas e para que ele pacifique o Brasil.