Entrar em conflito com Arthur Lira (PP-AL), o poderoso presidente da Câmara dos Deputados, é igual CPI: sabe-se como começa, mas não como termina. Ele não vem conseguindo fazer prevalecer sua vontade na discussão com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre o rito de tramitação das Medidas Provisórias (MPs). Diante do impasse, surge uma nova crise entre as duas Casas, provocada por aliados do alagoano, que pode resultar no despejo de onze senadores que ocupam apartamentos funcionais destinados a deputados. Titular da Quarta-Secretaria da Mesa Diretora da Câmara e responsável pela gestão dos imóveis funcionais, o deputado Lucio Mosquini (MDB-RO) nega que o pedido para que os senadores desocupem os apartamentos seja alguma forma de represália em razão do imbróglio do andamento das MPs. “Sou amigo do Arthur, fomos eleitos na mesma chapa para o comando da Câmara, mas não tem nada a ver; eu pedi os imóveis de volta antes desse embate entre os dois”, diz ele. “Te garanto que o Lira nem sabia dos requerimentos, ele tomou conhecimento quando foi procurado por senadores insatisfeitos com a medida”.

Devem desocupar os imóveis da Câmara, dentre outros, os senadores Davi Alcolumbre (UNIÃO-AP), ex- presidente do Senado; Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra de Jair Bolsonaro que comandou a pasta da Agricultura; e Romário (PL-RJ). Eles ocuparam os apartamentos quando ainda eram deputados, e lá permaneceram porque as duas Casas tinham um acordo nesse sentido. Por outro lado, a Câmara também informou que vai devolver ao Senado três imóveis — hoje moram neles os deputados Aécio Neves (PSDB-MG), Gleisi Hoffmann (PT- PR) e José Medeiros (PL-MT), que já foram senadores.

Arthur Lira abre guerra com o Senado para despejar senadores que ocupam apartamentos da Câmara
ESPAÇO AMPLO As instalações à disposição dos parlamentares têm até 200m2: disputa acirrada (Crédito:Marcelo Camargo)

Argumento

Ao justificar as providências para a “ordem de despejo”, Mosquini assegura estar sendo movido exclusivamente pelo déficit de moradias para seus colegas. São 513 deputados e 361 unidades habitacionais. “Não há apartamentos para todos, e onze dos imóveis da Câmara estão ocupados por senadores”, afirma ele. Ainda de acordo com Mosquini, o auxílio-moradia de R$ 4.253,00 não é suficiente para que parlamentares se mantenham na Capital Federal. “Não há imóvel para alugar em Brasília por menos de R$ 4 mil” — de fato, em um País no qual não há viaduto sem gente morando embaixo (são mais de 300 mil brasileiros em situação de rua) a fala de Mosquini dá até vontade de chorar. “Esse valor também é insuficiente para pagar as despesas de um flat ou hotel”. No final de janeiro, no entanto, na véspera da eleição para a presidência da Câmara, Lira, que acabou reconduzido ao posto com a maior votação da história, praticamente dobrou o valor do benefício: com um acréscimo na verba de gabinete, eles podem receber até R$ 8.401,00 por mês para essa finalidade.

Arthur Lira abre guerra com o Senado para despejar senadores que ocupam apartamentos da Câmara
DESPEJO 1 Davi Alcolumbre: o senador vai ter de deixar o imóvel funcional que ocupou quando ainda era deputado (Crédito:Geraldo Magela)

A resistência de Rodrigo Pacheco no rito das MPs não é o único revés na vida de Arthur Lira. O deputado viu fracassar a tentativa de criar uma federação entre o seu PP e o União Brasil, e agora se depara com um racha no Centrão — o Republicano se descolou do PP e do PL e se uniu ao bloco formado por MDB, PSD, Podemos e PSC. A nova federação tem 142 deputados e sinalizou ao presidente da Câmara que não pretende afrontá-lo — mas sem dúvida essa nova força é uma ameaça ao poder de Lira. O fato é que tanto se trama de um lado e de outro, que na alma de parlamentares fica uma angústia. Sabe qual é? É nome de filme: Se Meu Apartamento Falasse.

Arthur Lira abre guerra com o Senado para despejar senadores que ocupam apartamentos da Câmara
DESPEJO 2 Gleisi Hoffmann: a deputada saiu do Senado mas permaneceu em apartamento daquela Casa (Crédito:Mateus Bonomi )