Ta-Nehisi Coates cresceu em meio a livros “sobre pessoas negras, escritos por pessoas negras, para pessoas negras, transbordando das prateleiras e da sala de estar”, segundo ele mesmo afirma. Heróis populares em sua infância, como Tarzan e Cavaleiro Solitário, e todos os brinquedos com rostos brancos foram banidos de sua casa em uma tentativa rebelde de seus pais contra a história escrita por brancos. Coates cresceu conhecendo o que chama de “primeiros”: “primeiro congressista negro, primeiro prefeito negro”. Foi com essa educação que o escritor desenvolveu uma das visões mais contundentes da questão racial nos Estados Unidos. E a partir dela escreveu uma série de histórias em quadrinhos que serviu de inspiração para o filme “Pantera Negra”, fenômeno cinematográfico que em menos de um mês se tornou uma das dez maiores bilheterias da história nos EUA, batendo a marca de US$ 1 bilhão.

FENÔMENO Há um mês em cartaz, “Pantera Negra” já é a sétima maior bilheteria da história nos EUA ; US$ 1,1B arrecadados no mundo; é a 20a bilheteria de todos os tempos (Crédito:Divulgação)

O convite para assumir os roteiros do personagem veio em 2016, quando Coates já era um jornalista respeitado e autor do finalista do Pulitzer “Entre o Mundo e Eu”, livro em que conta sua história em uma longa carta ao filho de 15 anos. Sua experiência como poeta, aprimorada no tempo em que passou na Universidade de Howard, em Washington, serviu de base para os diálogos dos quadrinhos. Seu trabalho como jornalista influenciou os temas abordados pelas histórias. A combinação funcionou: a primeira edição de “Black Panther” foi a HQ mais vendida de 2016.

Foram principalmente as questões levantadas pelas HQs de Coates que inspiraram o diretor Ryan Coogler. Em sua superfície, “Pantera Negra” mostra as aventuras de um rei africano, T’Challa, detentor de um enorme poder tecnológico. Mas também aborda a experiência negra nos Estados Unidos, na África e, em maior escala, no mundo. Aborda o poder negro intocado pelo colonialismo, a diáspora africana, as questões morais envolvendo o nacionalismo negro e o impacto de uma sociedade injusta na formação e na motivação dos personagens. Com diversas personagens femininas fortes, aborda a questão de gênero, outro tema caro às HQs escritas por Coates. Fez com que muitos espectadores se sentissem finalmente representados nas telonas, de uma maneira que foge da representação costumeira dos negros no cinema, em tramas que abordam principalmente a pobreza e a violência. E de quebra se tornou o segundo maior sucesso da Marvel nas telas, atrás apenas de “Vingadores”.

REPRESENTAÇÃO O filme é centrado em Wakanda, nação intocada pelo colonialismo, e discute a diáspora africana (Crédito:Divulgação)

Agora, o jornalista e escritor se prepara para assumir o roteiro de outra série da Marvel. Dessa vez, escreverá as aventuras do Capitão América. Um dos personagens mais populares da editora, o herói mantém uma relação complicada com o governo americano, contestando diversas decisões políticas. A visão muitas vezes pessimista de Coates sobre o futuro dos EUA e o sonho americano podem servir de base para um capítulo interessante na trajetória do personagem. “Escrever, para mim, é sobre questões, não respostas. E o Capitão América, a personificação de um tipo de otimismo digno de Abraham Lincoln, propõe uma questão direta para mim: porque alguém acreditaria no Sonho Americano?”, escreveu Coates. A HQ será lançada no dia 4 de julho.

Sempre político

AUTOR O jornalista Ta-Nehisi Coates assumiu o roteiro das HQs do herói e transformou o título em sucesso de vendas (Crédito:Divulgação)
Divulgação

Criado por Stan Lee e Jack Kirby (1917-1994), o Pantera Negra apareceu nos quadrinhos pela primeira vez em uma revista do Quarteto Fantástico em 1966, poucos meses antes do surgimento do partido político de mesmo nome. Mesmo sem conotação política explícita, já nasceu radical ao ser apresentado como um rei africano capaz de oferecer tecnologia aos ocidentais. A associação com o partido foi problemática para a Marvel, que nunca batalhou muito para que suas histórias fizessem sucesso. A situação só mudou em 1998, quando Christopher Priest assumiu o título e deu nova cara ao personagem, aprofundando a mitologia em torno de Wakanda e reforçando a imagem de monarca e estrategista de T’Challa.

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