Se nas grandes premiações do Cinema, o filme que fala sobre a tragédia familiar de uma das mais tradicionais marcas de moda do mundo, “Casa Gucci”, está sendo esnobado sem levar nenhuma estatueta – nem mesmo o de Melhor Atriz com Lady Gaga no Bafta, ocorrido no último domingo –, na vida real a família Gucci voltou a ser o centro dos holofotes. É que a filha mais velha, Allegra Gucci, rompeu o silêncio de mais de duas décadas e escreveu um livro sobre o assassinato de seu pai, Maurizio Gucci, morto em 1995. Sua mãe, Patrizia Reggiani, foi condenada por ser uma das mandantes.

A garota, que tinha 14 anos na época do crime, afirma em entrevista à revista americana Vanity Fair que resolveu escrever o manuscrito justamente em razão do filme dirigido por Ridley Scott, que ela descreve como “um terrível desenho animado”. E pelos seus dois filhos pequenos. “Gostaria que eles crescessem e se baseassem nos fatos contados pela mãe. Reconstruí as lembranças, peça por peça. Às vezes senti dor, às vezes uma sensação de libertação”, explica Allegra, que agora tem 41 anos.

O livro Fine dei giochi. Luci e ombre sulla mia famiglia (Fim dos Jogos – Luzes e sombras sobre minha família), em tradução livre, é um diálogo imaginário em que a filha tem com o pai, onde Allegra lembra sua relação com os pais “Chegou a hora de compartilhar minhas palavras não mais só com você, querido pai. Há muito a dizer. Minha verdade, sua verdade, nossa verdade. Aquela história que está esperando para sair de muito tempo”, escreveu. A herdeira também fala sobre sua avó materna, Silvana Barbieri Reggiani, na qual ela a define como manipuladora e gananciosa. “Verificando os livros contábeis, percebemos que a avó escondia parte dos fundos destinados a nós e nossas despesas transferindo-os para suas próprias contas correntes”, diz Allegra. E separa uma parte da história para comentar sobre Paola Franchi, companheira de Maurizio na época do crime. “Ela nunca nos deu trégua”.

Em um dos momentos mais marcantes do livro, Allegra fala sobre sua relação com a mãe, Patrizia. Segundo a autora, ela e a irmã, Alexandra, sempre visitavam a mãe na prisão de San Vittore, em Milão, à qual se referia como “residência de Victor”, e na qual ela nunca quis sair, mesmo sendo liberada após cumprir 18 anos de sua pena e ser liberada em 2017. Allegra afirma que tanto ela, quanto a irmã, sempre acreditaram na inocência da matriarca até que um dia, na televisão, Patrizia teria feito uma “meia admissão”. “Liguei para ela e pedi uma explicação. No final, ela desabafou: ‘Tudo o que eu fiz, eu só fiz por você’. Então ela tinha feito alguma coisa. Eu senti um vazio sob meus pés. Um abismo”.

O Oscar, que ocorre no próximo dia 27, pode até ignorar a existência do longa “Casa Gucci”, as demais premiações podem esnobar a atuação de Lady Gaga no papel de Patrizia, que ficou mundialmente conhecida como “Viúva Negra”, mas, depois do lançamento deste livro, e do relato de uma das personagens da história, não há como esquecer de um dos crimes mais chocantes e escandalosos da alta sociedade da Itália e que marca a memória da moda mundial.