Augusto Aras levou três dias para romper o silêncio após Jair Bolsonaro colocar o Itamaraty de joelhos e submeter o Brasil a um vexame internacional ao atacar o sistema eleitoral do próprio país e tentar descredibilizar as instituições. A resposta, no entanto, ficou muito aquém do que se espera de um chefe do Ministério Público Federal, órgão que tem a responsabilidade de assegurar os direitos do cidadão e defender a ordem jurídica e o regime democrático.

O procurador-geral da República publicou a manifestação em seu canal no YouTube no início da tarde desta quinta-feira, 21. No vídeo, ele diz não aceitar alegações de fraude, porque “nós temos visto o sucesso da urna eletrônica ao longo dos anos, especialmente no que toca à lisura dos pleitos”. A resposta, por si só, é fraca. Mas o cenário piora quando observado o contexto geral. A gravação mostra apenas um compilado de trechos de uma entrevista concedida por Aras a correspondentes estrangeiros no último dia 11 de julho — ou seja, sete dias antes da reunião de Bolsonaro com chefes de missões diplomáticas.

Como foi reciclada, a fala não aborda diretamente o monólogo do presidente da República. Assim, Aras evita se posicionar diretamente sobre a nova investida de Bolsonaro pela subversão da democracia e o poupa, embora o capitão, segundo juristas, tenha cometido crimes de responsabilidade e o ilícito eleitoral de abuso de poder político no evento realizado no Palácio da Alvorada, na segunda-feira,18.

A resposta de Aras, em geral, não pegou bem em Brasília. Ministros, sob reserva, frisam que a posição dele, além de tardia, acabou “apagada”, porque procuradores, tribunais e até mesmo associações de servidores públicos de órgãos de destaque, como a Polícia Federal, a Abin e o próprio Ministério das Relações Exteriores, deram declarações mais “fortes”, “pontuais” e “técnicas”.

Entre os pares do PGR, a reação foi ainda pior. “O mínimo que todos esperamos no MPF e em todas as instituições que já se manifestaram é que o procurador-geral da República se manifeste com uma fala atual, de apoio ao TSE, seus ministros e ao sistema de justiça eleitoral como inúmeros membros do MP e do Poder Judiciário que atuam ou atuaram no MP Eleitoral e na Justiça Eleitoral então fazendo no Twitter”, me escreveu um subprocurador.

Justamente em razão do morno teor da resposta de Aras, são baixas as expectativas quanto a um pedido de abertura de inquérito para investigar Bolsonaro. Mais à frente, o PGR terá de se posicionar formalmente, já que deputados de oposição apresentaram uma notícia-crime contra o presidente sob o entendimento de que ele praticou crimes de responsabilidade e contra as instituições democráticas e ilícito eleitoral, bem como propaganda eleitoral antecipada e ato de improbidade administrativa.

Em um movimento de praxe, nesses casos, o ministro-relator pede a manifestação da Procuradoria-Geral da República. Aras pode seguir por três caminhos: propor o arquivamento da ação, pedir a abertura de um inquérito ou informar a instauração de uma apuração preliminar e interna sobre o caso. No órgão, a aposta é de que ele apostará na terceira opção e deixará o assunto esfriar.

Enquanto Aras e Arthur Lira permanecerem inertes, Bolsonaro seguirá firme em sua sanha golpista. Afinal, por que o capitão recuaria enquanto tem a certeza de que não responderá por seus crimes? Nos próximos meses, com a escalada do discurso do presidente contra o sistema eleitoral e a tentativa de insuflar a população contra as instituições, saberemos até onde vai a conivência do PGR com o chefe do Planalto e se ele colocará mesmo o desejo de conquistar uma vaga no STF, na eventual reeleição de Bolsonaro, acima da estabilidade democrática do país.