Grosso modo, semiótica é a ciência que estuda os signos, ou os significados, e pode ser separada em sintaxe (relação entre os signos), semântica (relação entre o signo e sua representação) e pragmática (relação entre os signos e seus intérpretes). Espero não estar falando muita bobagem, já que fui um péssimo aluno, e 30 anos depois é que não seria um expert no assunto. Ao saber da morte de duas emas da Granja do Torto, ex-residência do Posto Ipiranga, vulgarmente conhecido como Paulo Guedes, decorrente da obesidade pela alimentação inadequada (as aves comiam restos de comida humana por falta de ração, contingenciada pelos cortes no orçamento), logo me lembrei de Jair Bolsonaro, o ex-verdugo do Planalto, tentando submetê-las ao “tratamento precoce”, à base de cloroquina e ivermectina.

Ironicamente, não fosse trágico, o desgoverno passado cuidou das penosas como cuidou dos brasileiros, vide os 700 mil mortos por Covid-19 e as crianças yanomamis. O maior signo – olha a semiótica aí, gente! – do bolsonarismo é o completo desprezo pela vida, seja humana, animal ou vegetal (pobre floresta amazônica). Não é à toa a crueldade com que Nikolas Ferreira, deputado federal por Minas Gerais, tratou uma moça obesa. Nikolas e Bolsonaro, ou Zambelli e Damares, tanto faz, representam a essência de um estrato gigantescamente assustador da sociedade brasileira, em que personagens hoje bizarras como Regina Duarte e Cássia Kiss saltam da selvageria primitiva, adormecida em todos nós, para as portas dos quartéis e redes sociais, relacionando, ou melhor, transacionando signos que não deveriam vir à tona jamais.

Ironicamente, não fosse trágico, o desgoverno passado cuidou das penosas como cuidou dos brasileiros – vide os 700 mil mortos por Covid-19

Em seu picadeiro particular (Twitter), Nikolas, sob aplausos efusivos dos bolsonaristas, acredita que “gorda tem de ser chamada de gorda”, bem como uma mulher trans tem de ser chamada de “ele”, já que é assim que “veio ao mundo”. Fico imaginando, cá com meus parcos botões, o sentimento destes cristãos patriotas ao serem informados sobre a passagem das emas: “bem feito, quem mandou comer demais”? Bolsonaro, por sua vez, ao se referir a um quilombola que “não serve nem para reproduzir”, atacou o peso do rapaz, estimando em “7 arrobas, no mínimo”. Entendem agora o que é semântica bolsonarista? Pois é. Ricardo Kertzman também é cultura, hehe. Descansem em paz, minhas caras emas. Algum dia, aquele que não é coveiro,
há de pagar por tudo isso.