“Baseado em Fatos Reais” é a resposta do polonês Roman Polanski ao bombardeio digital promovido pelas redes sociais. “Nunca estivemos tão rodeados de fotos e de informações, incluindo falsas”, diz Polanski, cineasta aclamado por clássicos como “Repulsa ao Sexo’’ (1965), “O Bebê de Rosemary’’ (1968), “Chinatown’’ (1974) e “O Pianista’’ (2002). “E o que é pior: não podemos mais confiar nas fotos como documento, já que elas podem ser falsificadas em questão de minutos e enviadas ao mundo inteiro. Como saber o que é real nos dias de hoje?”

Para realizar o seu suspense, Polanski adaptou o romance homônimo de Delphine de Vigan. Com habilidade de discutir ideias e explorar os instintos mais ocultos de seus personagens, Polanski brinca com o apetite do público pelo que seria a verdade. No caso, o filme explora a obsessão por tramas apresentadas como verídicas pelo mercado de livros. A protagonista (Emmanuelle Seigner, mulher do diretor) é uma escritora que alcançou o sucesso desvendando segredos da mãe — fato que acarreta ataques na internet, com acusações de expor amigos e a família. Abalada, ela permite que uma leitora obcecada por sua vida se aproxime (leia entrevista abaixo com a atriz Eva Green).

FASCÍNIO Emmanuelle Seigner e Eva Green: quando autora e leitora se envolvem (Crédito:Carole Bethuel)

“Como a notícia que julgávamos ser verdade ontem, acaba se revelando falsa hoje, tenho lido mais livros de não-ficção, sobretudo de Ciência”, afirma Polanski, que lamenta o poder alcançado pelas redes sociais. “Do jeito que vamos, é possível mudar o destino de uma nação com um simples gesto, que é amplificado milhões de vezes ao redor do planeta.”

Abuso sexual

Mais recentemente, o nome de Polanski passou a circular nas redes e nos veículos de comunicação por causa do movimento Me Too. A campanha nasceu nas redes, com a enxurrada de acusações de assédio sexual de atrizes de cinema contra o produtor Harvey Weinstein. Polanski foi uma espécie de precursor de Weinstein: em 1977, ele fugiu dos Estados Unidos para escapar à pena de abuso sexual de uma adolescente de 13 anos, Samantha Geimer.

Natalie Portman chegou a lamentar ter assinado a petição para a libertação de Polanski em 2009, quando o cineasta foi preso ao chegar ao Festival de Cinema de Zurique, na Suíça. Por sua vez, Catherine Deneuve se apressou em defender Polanski, considerando excessiva a acusação de abuso sexual por parte de Samantha. Até hoje, ele é considerado um fugitivo pela Justiça americana, além de ter sido acusado por mais três mulheres de estupro: Charlotte Lewis, Robin M. e Renate Langer.

Entrevista

Eva Green (Crédito:Carole Bethuel)

“O Facebook é tóxico”

Como você lida com as mais de 20 páginas no Facebook sobre você, fingindo ser oficiais?
Não vejo nada! Minha irmã gêmea (Joy) fica furiosa com isso, dando uma checada nessas contas de vez em quando. Mas o que posso fazer? Não estou nas redes porque elas me assustam. É algo tóxico. Ser atacada lá deve ser a pior coisa.

Belas atrizes muitas vezes aceitam papéis menos interessantes. Qual o segredo de sua galeria de mulheres de personalidade forte?
Evito as personagens descritas nos roteiros como “bonita e misteriosa”, que acabam representando apenas o objeto do desejo de alguém. Se aceitasse, eu me sentiria vazia.

Polanski é tão obcecado como dizem seus atores?
Como ele foi tranquilo na leitura do roteiro, não imaginava o nível de exigência que enfrentaria na filmagem. Ele é realmente obcecado por todos os detalhes, mesmo a posição de um copo na mesa (risos).

Você teve receio de contracenar com Emmanuelle, por ela ser mulher do diretor?
É normal pensar que a mulher dele teria algum favoritismo. Antes de conhecê-la, questionei se daria certo. Mas deu. Não senti competição ou qualquer hierarquia no set.

Algumas atrizes reclamam de rodar cenas de sexo com diretores homens, sentindo-se mais expostas. E você?
Já filmei com homens e mulheres e não senti diferença. Os diretores sempre foram respeitosos comigo, incluindo Bernardo Bertolucci, com quem rodei meu primeiro filme (“Os Sonhadores”, de 2003, em que sua personagem perde a virgindade no chão da cozinha). Perto de mim, muitos homens ficam até tímidos (risos).