A gastronomia brasileira está em busca de uma receita para se reinventar. A pandemia provocou o fechamento de restaurantes, demissões em massa e uma série de incertezas no setor. Mesmo assim, chefs e donos de restaurantes tentam manter o otimismo e confiam que a proximidade do “novo normal” vai começar, pouco a pouco, a trazer os clientes de volta.

Gabriel Reis

Segundo dados da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), 25% dos negócios do ramo fecharam as portas em definitivo diante da crise, um em cada quatro estabelecimentos. No total, já são mais de 1,2 milhão de empregos perdidos em um mercado que, antes do colapso, contabilizava seis milhões de vagas diretas. A estimativa é que o prejuízo do setor ultrapasse os R$ 50 bilhões, além de provocar um longo e lento processo de recuperação.

Dados apontam uma queda de 80% no faturamento dos empreendimentos que continuam de portas abertas. No Rio de Janeiro, tiveram que fechar as portas e demitir funcionários casas tradicionais como O Navegador, da chef Teresa Corção, fundado há 45 anos, e o badalado Angu do Gomes, inaugurado em 1955 e considerado um patrimônio cultural carioca. Apenas nesses dois restaurantes, foram 33 cortes. Enquanto isso, outros milhares de estabelecimentos correm risco de decretar falência. Planos de apoio a microempresas, como o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte), oferecem suporte financeiro, mas é difícil que a ajuda chegue a todos pela demanda em excesso.

CRIATIVIDADE Mocotó e Capim Santo: serviço de entregas, novas receitas e corte de gastos (Crédito:Divulgação)

Apesar das incertezas, os empreendedores do setor não desanimam. O empresário Marcelo Fernandes, proprietário dos renomados Attimo e Kinoshita, entre outros restaurantes, afirma que a pandemia exigiu inovação e criatividade de sua equipe. “Acredito que os clientes vão retornar aos poucos. Seguiremos os padrões de distanciamento e esperamos que eles se sintam confortáveis. Sempre fomos especializados em alimentação fora de casa, o serviço de delivery nem fazia parte da nossa realidade. Tivemos que ser criativos para sobreviver a essa crise”, afirmou o empresário, que colaborou com programas de doações de alimentos para as vítimas da pandemia.

Rodrigo Oliveira, chef do premiado restaurante Mocotó, em São Paulo, é um dos poucos gestores que conseguiram evitar a demissão de funcionários. “A parte mais importante são as pessoas que trabalham conosco. Temos que preservá-las, aliás, porque elas são o negócio. Nosso mercado precisa se reinventar, se engana quem acha que nossa atividade consiste só em fazer arroz, macarrão. Trabalhamos com hospitalidade e o acolhimento de pessoas”, afirma o chef.

Um novo ingrediente

A pandemia trouxe um novo ingrediente que hoje é essencial para a receita de transformação do setor da gastronomia: os entregadores. Sem eles, é impossível montar uma estratégia alternativa que inclua o delivery. Para a chef Morena Leite, do Grupo Capim Santo, o serviço de entregas é uma maneira de garantir a vida dos negócios, pelo menos no curto prazo. “A pandemia afetou muito a nossa operação, assim como a de outros colegas. Estamos fechados desde o dia 15 de março e não fazíamos serviços de delivery antes da pandemia. Hoje, essa é uma maneira de manter as coisas funcionando”, afirma. Alex Atala, empresário e um dos chefs mais conhecidos do País, acredita que ainda é cedo para saber exatamente como o setor será impactado. “Foram e estão sendo meses difíceis para todos. Vamos reabrir aos poucos os restaurantes, sempre tentando conter ao máximo os custos e ganhar o máximo de eficiência”, afirma o chef. “Esse recomeço será diferente, com menos gente, maior distanciamento. Mas vamos continuar buscando saídas para que o cliente continue tendo uma experiência única.”