PARA EMERGÊNCIA Sau Lopes, na região central de São Paulo: deixa sempre uma reserva na poupança para contas inesperadas. (Crédito:GABRIEL REIS)

Nem a revolução digital, nem a criação de produtos financeiros mais vantajosos foram suficientes para ameaçar a mais antiga ferramenta de investimento dos bancos. Até a explosão de aplicações na B3 (3,4 milhões de aplicadores pessoa física, com aumento de 28% em apenas um ano) não foi suficiente para tirar a poupança da preferência dos brasileiros. Criada pelo Imperador D. Pedro II, ela completou 160 anos e continua a opção mais popular do Brasil, mesmo quando não repõe sequer as perdas da inflação, como ocorre atualmente. Este ano, ela rendeu 2,94%, enquanto a inflação acumulada foi de 10,74%. Desde 2016, quando remunerou 8,3%, vem perdendo atratividade. Em 2020, rendeu 2,11% . A partir deste mês, porém, ela passa a ser mais atraente. Vai render 0,5% mais o valor da Taxa Referencial (TR). A perspectiva é de 6,17% de rendimento ao ano.
A poupança representa 42% de todas as aplicações financeiras realizadas no Brasil. É o investimento majoritário entre todos os produtos ofertados, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e dos Capitais (Anbima). Qual é o motivo? “O brasileiro não tem muita educação financeira. Por isso, prefere investimento simples e que o dinheiro possa ser retirado a qualquer momento”, responde Zeller Bernardino, sócio da Valor Investimentos.

Marco Ankosqui

A aplicação também se beneficia por ser muito conhecida da população. Durante muitos anos, a poupança foi o produto mais divulgado pelas instituições financeiras. “Tudo isso ajudou o brasileiro a criar uma cultura de poupança”, explica Bernardinho. “Tenho clientes milionários que investem na Bolsa, mas também possuem dinheiro na poupança. “Essa ferramenta é importante para o País, porque 65% dela pode ser destinada para o financiamento da compra e contruções de imóveis.”
Segurança (46%), retorno (24%) e liquidez (26%) são as principais razões apontadas pelos brasileiros para aplicarem na poupança, de acordo com pesquisas da Anbima. “Apesar da baixa rentabilidade, ela é livre de imposto e tem resgate mensal. Se o investidor colocar o dinheiro no CDB, o produto que rende 80% do CDI, paga 15% de imposto, o que no final dá um retorno próximo da poupança (65% do CDI)”, diz Alexandre Chaia, professor de Economia do Insper. “Entre as aplicações mais conservadoras, a poupança é boa opção para quem não tem grande volume aplicado e não quer se comprometer com aplicações de longo prazo.”

Os especialistas de mercado dizem que a escolha da aplicação está diretamente relacionada com o perfil do investidor, o que também inclui o valor disponível que ele tem para esse fim. “Grande parte das pessoas coloca um montante pequeno de dinheiro separado na caderneta de poupança, apenas pensando em não gastar, sem levar muito em conta a rentabilidade”, diz Henrique Castro, professor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas. É o caso do pequeno empresário Sau Lopes, 54 anos. Ele tem aplicações em ouro e no mercado imobiliário, mas sempre tem uma reserva na poupança. “Todo mundo precisa de dinheiro disponível para uma conta extra que apareça ou para uma emergência, por isso eu coloco na poupança”, diz. “E se não há imprevistos, eu não gasto.”

Há também quem use poupança como uma conta corrente livre de taxas. “Eu preferia não ter conta em banco, mas preciso para receber os pagamentos”, diz o jardineiro José Ricardo de Oliveira, de 40 anos, que completou apenas o Ensino Fundamental completo. “Se eu tivesse uma conta corrente pagaria taxas para o banco. A poupança é de graça. E agora com o PIX ficou ainda melhor”, explica. De acordo com o Banco Central, em 2020, a quantidade de clientes da poupança aumentou 50% em relação a 2018. Mas o saldo total diminuiu 15%, no mesmo período. De acordo com o relatório da instituição financeira, a mudança tem muito a ver com o Auxílio Emergencial, que foi disponibilizado pela poupança digital durante a pandemia. Porém, outro dado que reafirma a ferramenta como hábito financeiro vem da Anbima. Antes da pandemia, em 2017, 32% dos entrevistados pela associação afirmavam guardar dinheiro na poupança. Em 2019, esse número foi para 38%.