O líder das multidões tinha o carisma típico dos populistas, daqueles raros homens capazes de inspirar tanta confiança a ponto de guiar ovelhas para o matadouro. Militar ressentido, de baixa patente, apresentou-se como inimigo da corrupção e salvador da Pátria — ora envolta num sentimento profundo de frustração política e crise econômica.

De inspiração patriótica, o “Mito” se dizia antiprogressista e antiglobalista, pregava a restauração moral, o resgate do orgulho nacional e a nova política, sempre propondo soluções fáceis para problemas complexos. Aos olhos e ouvidos do povo, ele era a única redenção.

Era dado a discursos caricatos e extremistas sobre como proteger os compatriotas de conspiradores comunistas. Politicamente incorreto, ele defendia abertamente a pena de morte e a perseguição a minorias. Apesar da retórica flagrantemente truculenta, ou talvez até por causa dela, ganhou a confiança das massas e, por onde passava, era saudado como líder, ovacionado por milhões de incautos (ou seriam cúmplices?)

O “Mito” não teria jamais prevalecido sem a cumplicidade criminosa dos seus seguidores, que acabaram se tornando co-autores do extermínio

Chegando ao poder, transformou o discurso de ódio em política de Estado. A promessa de palanque foi cumprida. O líder que criou ameaças imaginárias encontrou inimigos e bodes expiatórios onde não existiam: entre partidários, oponentes, homossexuais, comunistas ou jornalistas. A imprensa foi acusada de “marxismo”, e os veículos de comunicação que ele não comprou, controlou. Sua rede de propaganda era exímia propagadora de “fake news”, mentiras, que repetidas mil vezes, tornavam-se verdades incontestes.

Qual messias diabólico, o líder veio para confundir, dividir e incitar uns contra outros: pais contra filhos e
filhos contra pais.

Sua mente sádica e conturbada reuniu todas as características da “tríade obscura”, descrita pelos psicólogos Delroy Paulhus e Kevin Williams: narcisismo, maquiavelismo e psicopatia. O ódio que inspirava se alastrou como praga, como vírus nefasto e mortal. Aliás, matar era sua especialidade.

Pelas mortes em massa que produziu, recebeu epítetos como “monstro”, “anjo da morte” e o mais famoso – “genocida”. O “Mito” não teria jamais prevalecido sem a cumplicidade criminosa dos seus seguidores, que acabaram se tornando co-autores do extermínio. Sob o olhar passivo e covarde de simpatizantes, eleitores, militares, políticos, intelectuais, médicos e cientistas, o carrasco da humanidade ceifou milhões de vidas.

Para não encarar o cadafalso, e, talvez, supondo por fim à sua infame biografia, o líder nazista Adolf Hitler cometeu suicídio em 30 de abril de 1945. Escapou ao julgamento dos homens, mas não do arbítrio do tempo. Castigo perene, a história lhe foi implacável.