30/07/2021 - 9:30
Você já reparou naqueles globos cheios de bolinhas numeradas do sorteio da Mega-Sena?
O globo gira, as bolinhas se empurram para lá e para cá, desesperadas, até que uma é escolhida.
Daí para frente, nada acontece até o sorteio do próximo número.
Nosso sistema eleitoral não é muito diferente de um sorteio da Mega-Sena.
Conforme vai chegando a eleição, os candidatos começam a se debater e girar em círculos se ofendendo mutuamente, implorando para serem escolhidos.
Exatamente igual às bolinhas numeradas, tornam-se todos iguais aos olhos dos eleitores, que não fazem ideia de quem será o escolhido.
Nenhum Instituto de Pesquisa é capaz de prever qual será o próximo número do sorteio da Mega-Sena, assim como não sabem dizer qual candidato será vitorioso.
Como as bolinhas, depois de eleito o candidato não faz mais nada, não têm mais relevância, não melhora nossa condição de vida, não cumpre suas promessas, não faz nada de útil.
A única coisa que importa é o próximo sorteio, ou melhor, eleição, a qual vai movimentar novamente a política e nós, que apostamos na Mega-Sena da democracia, vamos nos iludir, na crença de que algo pode mudar.
Então, em algum ponto de 2022, o eleitorado brasileiro se deu conta desse fenômeno.
Acordaram para o fato de que a última mudança realmente importante para nosso País foi a criação do Real e que, de lá para cá, estamos apenas vendo as bolinhas políticas serem sorteadas.
Nossa política se tornou apenas uma sucessão de escândalos terminados em “ão”.
Mensalão, Petrolão, Vacinão e o País, que é bom, esquecidão.
Então, em maio de 2022, surgiu o movimento “Não Voto!”.
No começo, não foi levado a sério, afinal, apenas uma parcela da população aderiu.
E se apenas um punhado de brasileiros não votassem, o movimento fracassaria.
Mas como tudo no Brasil surpreende, o Não Voto! começou a ganhar força.
Sindicatos, Universidades e até alguns pajés da política nacional, começaram a apoiar a ideia.
– É a hora de zerar a nossa política e começar de novo! — disse um famoso Senador.
Em julho de 22, ao invés de pegar carona em outras manifestações, o #NaoVoto! teve sua primeira carreata em Brasília.
Num palanque montado diante do Congresso, líderes de diversos partidos e artistas clamaram pelo boicote às eleições.
Ao contrário das tradicionais manifestações, essa tinha apenas os favoráveis, milhões vestidos de branco, como combinado, sem conflito nenhum, o que acabou por atrair ainda mais brasileiros.
No dia 7 de setembro, o presidente, uma das poucas vozes contrárias ao movimento, tentou convencer da importância de se escolher o chefe de Estado, ele de preferência, mas seu governo foi a contradição viva de seu próprio argumento.
Naquele ano, a eleição registrou o menor número de candidatos da história.
Chegou dia 2 de outubro e as urnas registraram um número de votos exatamente igual ao número de candidatos. Só os candidatos votaram neles mesmos.
Pela primeira vez na história, uma eleição acabou empatada.
Na Mega-Sena da política o povo não ganha nunca. Esse é um fato irrefutável
Depois de muitas discussões no Congresso, inclusive com a presença do presidente do STE, esse também contrário à votação, decidiram por repetir o pleito.
E de novo empatou. E em uma terceira tentativa também nada mudou.
Não houve jeito. Ninguém foi eleito.
Os anos se passaram e o Executivo e Legislativo foram ficando vazios.
O brasileiro abdicou de ter representantes.
Qualquer problema que surgia, era resolvido localmente, como numa taba indígena.
Aos olhos do mundo, essa mudança foi vista com desconfiança, mas paradoxalmente, a economia prosperou como nunca.
Tanto que depois de algumas décadas, o movimento se espalhou pelo mundo.
A corrupção acabou.
A política virou assunto do passado.
O planeta precisou ser terra de ninguém para ser de todos.
E o ser humano, apolítico, foi finalmente feliz.