O presidente Bolsonaro, por meio de seu pau-mandado na Câmara, o deputado Arthur Lira, faz um jogo para lá de obscuro com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) dos Precatórios, que objetiva dar um calote nas milhares de pessoas que têm dinheiro a receber saldos de demandas judiciais e que este ano dariam em torno de R$ 89 bilhões. Para pagar esse dinheiro legalmente indispensável, pois esses recursos são baseados em decisões judiciais incontestáveis, o governo alega não ter de onde tirar os valores e usa a PEC para recalcular os parâmetros do teto de gastos, dando uma pedalada na dívida, empurrando-a para o ano que vem. Assim, numa única proposta que está sendo discutida na Câmara, o governo Bolsonaro comete três irregularidades graves: promove o fura teto, comete uma pedalada fiscal à exemplo de Dilma e decreta o calote nos credores dos precatórios.

Ocorre que o governo diz que precisa pedalar os R$ 89 bilhões dos precatórios, jogando-os para o ano que vem, para poder pagar os R$ 400 do Auxílio Brasil, ou o atual Bolsa Família, instituído pelo governo petista. Esse novo programa, segundo a dupla Bolsonaro/Gudes, vai gastar em torno de R$ 30 bilhões para socorrer pouco mais de 14 milhões de famílias de famintos, que estão cozinhando ossos na lenha para que os filhos não morram de fome. Não é que estamos contra Bolsonaro atender os miseráveis. Isso precisa ser feito mesmo. Há fome, desemprego, inflação descontrolada, crise econômica sem precedentes que está sufocado a todos, de empresários, de integrantes classe média, aos mais necessitados. A crise é generalizada e Paulo Guedes fica no Olímpo do Planalto, morando confortavelmente na Granja do Torto e contando a fortuna que guarda no exterior.

O fato é que com o calote dos precatórios, o governo vai usar os R$ 30 bilhões para os miseráveis, mas vem a pergunta que não quer calar. Onde o governo vai gastar os outros R$ 59 bilhões que vão “sobrar” do calote dos precatórios? Há quem diga no Congresso, como o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos, que esse dinheiro poderá ser usado para a campanha da reeleição. Fala-se que pode haver um aumentar do fundo eleitoral de R$ 2 bilhões para R$ 5 bilhões, o que seria um grande soco no estômago da sociedade e dos pobres, ou mesmo que esse dinheiro possa ser utilizado para Bolsonaro e Lira repassarem para o orçamento secreto na Câmara, onde os gastos são descaradamente empregados em emendas sem controle, em despesas superfaturadas, sobretudo na compra de tratores e maquinários, que só servem para enriquecer ilegalmente os parlamentares.

A questão agora é saber se essa PEC do escândalosa e geradora de corrupção vai passar na Câmara. Não deverá passar. Ela precisa de 308 votos para ser aprovada e o governo não tem isso. A oposição votará em peso contra. E até muitos governistas já se posicionaram contrários. Nesta quarta-feira, 27, não houve votos suficientes para apreciá-la. Ao votar se a PEC deveria ser retirada de pauta, para ser votada em outro dia, já que Lira sentiu que não teria quorum ontem, o governo só teve 256 a favor. Ou seja, faltaram 52 votos. Isso significa que Lira/Bolsonaro não terão os 308 para emplacar a PEC da pedalada. Principalmente por que os deputados mais conscientes já entenderam que, ao driblar os precatórios, o governo estará sinalizando ao mercado que não há segurança jurídica no País (a lei que garantiu a validade das decisões judiciais para o pagamento de dívidas da União não vale nada?). E que o teto de gastos virou figura de retórica.

Pior. Ao fazer esse arranjo lamentável, o Brasil vai estourar o controle fiscal, para adotar medidas eleitoreiras no ano que vem, com a adoção de projetos populistas e meramente paroquianos. Resumindo. Bolsonaro está pedalando muito mais que Dilma, mas nem assim Lira desengaveta um dos 130 pedidos de impeachment que estão na sua gaveta. Quando Bolsonaro ajudou a eleger o atual presidente da Câmara, sabia muito bem o que estava fazendo: comprando sua permanência no cargo. Mas, pelo menos, isso tem data marcada para acabar: outubro de 2022.