Foram momentos de um desabafo generalizado em prol da democracia. Lula, o presidente eleito, verteu lágrimas, sinceras (dava para notar), quando da leitura de seu libelo à conquista. Alexandre de Moraes, o presidente do TSE – e de alguma forma maior bastião da luta para assegurar a estabilidade e lisura do processo, – foi mais fundo. Falou na batalha, decerto hercúlea, para barrar o sobranceiro pendor autoritário, contra a desinformação e os discursos de ódio que ainda granjeiam nas redes e nos grupelhos golpistas plantados até hoje em vigília de arruaça diante dos quartéis. Garantiu que seriam responsabilizados. Nas ruas de Brasília, nas cercanias da Polícia Federal, numa noite tenebrosa, a baderna tomava conta, com bolsonaristas queimando ônibus, depredando patrimônio, atacando com pedras, paus e o que tinham pela frente inúmeras instituições da capital federal, a destilar a raiva implacável pela saída iminente do mito de araque adorado. Eram talvez os últimos resquícios do clima anárquico que se instalou no País desde que o capitão extremista – que nada faz além de incitar à violência e destruição – foi ungido ao Planalto, há quatro intermináveis anos. Bolsonaro vive o ocaso e, com ele, uma era de desmonte incomparável dos valores republicanos. Lula, que elogiou o povo, a liberdade e apelou à união, tenta recosturar solturas de uma sociedade despedaçada, aos trapos, com 33 milhões de famintos, um legado de miséria incomparável, a nível recorde; setores de Educação, Saúde e Meio Ambiente dilapidados. Nas palavras do eleito, com a diplomação efetivada, as pessoas estão reconquistando o direito de viver sem a mentira e o arbítrio. Ele deseja acolher aqueles que sofreram toda sorte de ofensas, ameaças e agressões para fazer valer a soberania do voto popular — o STF dentre eles, a quem o demiurgo de Garanhuns resolveu dirigir elogios típicos de quem almeja arregimentar aliados. O clima de beligerância ainda não desanuviou e por motivos óbvios: o mandatário Messias, a seguir nos derradeiros dias no posto, trata de alimentar a algazarra. Em repúdio à quebradeira não moveu uma palha sequer. Nenhuma força de guarda para coibir, controlar a massa enfurecida e prender os delinquentes. Nada foi feito. Como se, ao contrário, uma ordem implícita e não expressada tivesse sido dada para abrir espaço a tais demonstrações de caos. Seu sonho dourado, como lembrou Moraes, era criar um regime de exceção. De maneira intensa e criminosa procurou dilapidar os fundamentos constitucionais, asfixiar veículos de mídia, armar extremistas e montar uma narrativa paralela que, de maneira torpe e vil, sedimentasse seu caminho para comandar uma ditadura. Não conseguiu. Os poderes constitucionais foram maiores. E agora eles se unem na mesma cruzada. Uma verdadeira pax institucional vem sendo tecida. A vitória plena e incontestável do Estado de Direito é uma realidade. Na missão de Lula, como sugeriram os magistrados participantes da cerimônia, será preciso buscar serenidade e equilíbrio ante a dura armadilha deixada para ele. O choro de Lula deve ter sido movido também um pouco pela noção e consciência do desafio que lhe aguarda. Há uma imensa cobrança e desconfiança em relação aos passos que dará. É certa má vontade especialmente por setores de elite costumeiramente conservadores e simpáticos ao estilo de personagens como Jair Bolsonaro. No rol de alternativas, políticas públicas de apelo social e instrumentos para o desenvolvimento constituem uma trilha. Há muito mais a perseguir. De uma forma ou de outra, a cerimônia da última segunda-feira, 12, com a presença maciça de líderes dos três poderes, além de ex-presidente da República, marca um ponto de inflexão importante. Lula já avança de maneira promissora no diálogo com o Legislativo. Abriu um relevante leque de aliados a lhe dar apoio. Ganhou o aval do Judiciário e evolui para uma gestão que pode deixar bons resultados. Basta não abusar de práticas ideológicas que nada acrescentam. Erro capital de seu antecessor que levou o pêndulo a se movimentar, mais uma vez de maneira abrupta, da direita para a esquerda.