A Náusea e os Salafrários

(Crédito: Wilson Dias/Agência Brasil)
A Náusea, de Jean-Paul Sartre, é um daqueles romances que muita gente lê na adolescência, entende pela metade e só lembra aos pedaços. Eu, por exemplo. Da leitura que eu fiz há cento e dois anos, haviam sobrado apenas duas coisas com alguma clareza: a própria Náusea e os Salafrários.
O narrador, eu lembrava, definia a Náusea nascia da percepção de que todas as coisas – as pedras, as árvores, ele mesmo, o universo – existem de maneira aleatória, sem justificativa ou finalidade.
Os Salafrários eram os figurões que o narrador observava nas pinturas de um museu. Os quadros glorificavam aqueles “homens de bem”, mas não conseguiam esconder completamente que havia algo de errado com eles. A natureza exata da picaretagem que fazia o narrador chamá-los de Salafrários eu tinha esquecido. Até hoje de manhã, quando fui procurar o livro.
Nunca é por acaso que você acorda pensando numa coisa dessas. Vejam a descrição do Salafrário típico: “Jean Parrotin dedicara toda a vida a conceber seu direito: nada mais. Em lugar da ligeira dor de cabeça que eu sentia despontar, como todas as vezes que visito um museu, ele teria sentido em suas têmporas o direito doloroso de ser bem tratado. Era preciso que não o fizessem pensar muito, que não chamassem sua atenção para realidades
desagradáveis, para os sofrimentos de outrem.”
Eu devia estar sonhando com Flávio Bolsonaro para acordar com A Náusea na cabeça. Depois de vir a público que ele comprou uma mansão de 6 milhões de reais em Brasília, o senador fez um vídeo com explicações sumárias, e acrescentou que “não vai deixar de fazer nada em sua vida” por causa daquilo que a imprensa ou o resto do mundo pensam.
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O senador conseguiu financiamento, com juros mais que camaradas, em um banco público. O banco é comandado por um executivo que estava na bolsa de apostas para ocupar a presidência do Banco do Brasil. Em outras palavras, quem lhe deu o crédito poderia ser, em breve, funcionário de papai. Mas ele acha que não precisa dar satisfações.
O senador está sendo investigado pelos indícios gritantes de que desviou salários de servidores da Assembléia do Rio de Janeiro para o próprio bolso. Seriam milhões de reais. Mas ele acha que não precisa explicar nada.
Deve ser o tal “direito de ser bem tratado”.
Também Arthur Lira, o presidente da Câmara dos Deputados, parece acreditar piamente ser dono desse direito.
Caso contrário, não tentaria aprovar à força uma PEC que confere aos parlamentares, muito mais que imunidade, verdadeiros privilégios – como o de não ficar sob a guarda da polícia, mas do próprio Congresso, caso seja decretada sua prisão.
Lira é acusado de corrupção em mais de um processo. Um dia, talvez, a polícia vá bater à sua
porta.
O narrador do livro de Sartre descobre a Náusea diante de um castanheiro.
Brasília, cotidianamente, é o castanheiro dos brasileiros. Desperta um sentimento parecido com a náusea. A diferença é que sabemos por que a cidade existe, e porque os políticos estão lá, ou deveriam estar: para servir ao país, e não a si próprios.
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