Renegado e sua madrinha na música, Elza Soares, lançaram no dia 6 de agosto a terceira parceria dos cantores. Intitulado “Black Power”, o samba enaltece o estilo de cabelo que é alvo de tanto preconceito e fala sobre a superação diária de meninos e meninas negras, que lutam para superar as adversidades e conseguir seus objetivos. A IstoÉ conversou com os cantores sobre esse novo single e sobre racismo, retomada dos shows e o momento político que vivemos. Ouça a música aqui.

Segundo Renegado,  a música surgiu após o professor João Luiz ter sido alvo de uma “brincadeira” sobre o seu cabelo no BBB21. “Temos que mostrar para os nossos que o nosso #BlackPower é a nossa coroa, fonte de força e de energia que empodera”, afirmou o músico. Elza disse que o objetivo da música é ensinar “as pessoas a nos enxergar como somos”.

A música ganhou mais força após a ginasta Rebecca Andrade ganhar duas medalhas – uma de ouro e outra de prata – nas Olimpíadas de Tóquio. Elza, que já tinha gravado a música, pediu para regravar a canção. “Queria gravar outra vez com aquele calor no peito que senti vendo aquela menina preta, de origem simples, como eu, como tantas de nós, ganhando o mundo. Outra menina preta querendo brincar, querendo brilhar. Me vi ali, sei lá. Quando escuto eu sinto tudo outra vez. Me emociona muito”, afirmou a cantora.

Os dois cantores pretendem fazer uma  turnê nacional em 2022 do show ‘Onda Negra’, que aconteceu no final do ano passado, em formato de live, no Theatro Municipal de São Paulo, durante a Virada Cultural Online. “Nós já temos agenda até setembro do ano que vem com esse show. Emoção, amor, cantoria e protesto não faltarão”, afirmou Elza.

Ao ser perguntada sobre quais os segredos para manter o vigor aos 91 anos, Elza responde: “Amo o que faço e me amo acima de qualquer coisa. Não me apego muito a essa coisa de idade não”, afirmou. Sobre o momento político que vivemos, Elza disse que está “muito preocupada” e que espera que as coisas “mudem logo.” “Vai passar e depende de nós pra isso”, disse a cantora.

Confira a entrevista completa:

ISTOÉ: Esta é a segunda música que vocês lançam com a temática do racismo. Qual a importância de se discutir este tema atualmente?

Elza: “Muito importante, cara. Aliás, é importante lutar sem esmorecer, porque se lutando estamos vendo eles passando como um trator em cima da gente, imagina se ficarmos calados. O Renegado escreve muito bem. Ele consegue me tocar com as letras, com a musicalidade dele. O que eu faço é colocar meu sentimento na música.”

Renegado: “As pessoas não pretas, podem achar essa pauta repetitiva, mas a nossa luta ainda é pelo direito a vida. Ainda não alcançamos um espaço de garantia do direito vida para o povo preto no Brasil, os nosso tabloides e noticiários são a prova disso, a nossa miséria e morte alimenta a industria do sensacionalismo. A minha cor e a minha luta não me permiti seguir alheio a esta discussão, por isso a necessidade de ser contundente, mas amoroso, pois não quero punir, quero educar. Não enxergo as pessoas não pretas como inimigos sou contra o apartheid (regime de segregação racial da África do Sul). Mas queremos viver, queremos respirar!”

ISTOÉ: De onde surgiu a ideia de fazer a música Black Power?

Elza: “O Renegado me convidou pra fazer parte desse disco novo dele. Eu pedi que ele fizesse uma música forte, mas que falasse de amor, do acolhimento, uma música que ensinasse as pessoas a nos enxergar como somos e ele fez essa pérola que amo.”

Renegado: “Essa necessidade de gritar nasceu no dia em que o João Luiz foi alvo de uma “brincadeira” sobre o seu cabelo no BBB21. O cabelo do povo preto é sempre um grande tabu, temos que mostrar para os nossos que o nosso #BlackPower e a nossa coroa, fonte de força e de energia que empodera, não podemos mais aceitar essas brincadeiras, pois elas são heranças do racismo estrutural.”

ISTOÉ: A música foi dedicada à Rebecca Andrade, ganhadora de duas medalhas na Olimpíada de Tóquio. O que representa esta vitória?

Elza: “Ah, isso foi uma coisa ótima, cara. Nós dedicamos a música pra Rebecca e para aquela turma boa toda que nos encheu de orgulho durante as Olimpíadas. Aquilo é o Brasil, né cara?! Na verdade eu já tinha colocado a voz na música, mas sei lá, queria gravar outra vez com aquele calor no peito que senti vendo aquela menina preta, de origem simples, como eu, como tantas de nós, ganhando o mundo. Outra menina preta querendo brincar, querendo brilhar. Me vi ali, sei lá. Aí gravamos a voz valendo e quando escuto eu sinto tudo outra vez. Me emociona muito.”

Renegado: “Representatividade, em pleno século 21 é inaceitável o nosso povo ainda ser preterido e invisibilizado, essas medalhas transmitem mensagens muito importante para os jovens pretos do Brasil. Quando vemos Rebecca, Abner, Hebert e Beatriz vemos que é possível e que sim nos podemos. Nos trás de volta o direito de sonhar e só realiza quem sonha.”

ISTOÉ: Quais os planos para a retomada dos shows? Vocês pretendem se apresentar juntos no show Onda Negra, né? O que podemos esperar desta turnê?

Elza: “Pode esperar muita música. Nós já temos agenda até setembro do ano que vem com esse show. Emoção, amor, cantoria e protesto não faltará.”

Renegado: “Eu particularmente estou louco pra realizar o #OndaNegra de forma presencial, me alimentar da reação do publico e compartilhar a honra e a emoção de dividir o palco com esse ícone da musica brasileira, essa madrinha linda e generosa chamada Elza Deusa Soares. Temos os nossos shows individuais que também estão prontos para ganhar a estrada e os palcos do Brasil.
Algumas capitais já estão no nosso radar para a #OndaNegra, que é um espetáculo que só evolui. Se posso dar um spoiler para os espectadores, é não percam, pois guardamos surpresas para vocês.”

ISTOÉ: Qual a avaliação de vocês sobre o momento político que vivemos. Vocês têm esperança de dias melhores?

Elza: “Aiii, cara, me dá até arrepios quando falo nisso. Tô preocupada, muito preocupada. Hoje eu tô assim, mas espero realmente que isso mude logo, mas olha… eu já vivi e vi muita coisa. Ver tudo isso que tá acontecendo me arrepia inteira a ponto de me apavorar. O que é bom passa e o que é ruim também passa. Isso a vida ensina bem. Vai passar e depende de nós pra isso.”

Renegado: “A fé no amanha vive no peito do povo brasileiro, é impossível nascer no Brasil e não ter a superação bordada no peito.
Mas o fato é que temos que aprender a usar o nosso voto e parar de esperar o salvador, nós somos a salvação! Eu acredito no Brasil, mais acredito ainda mais no povo brasileiro.”

ISTOÉ: Você está preparando um novo álbum. O que podemos esperar deste novo trabalho?

Elza: “Surpresa, como sempre né?! Um disco só com composições de mulher. Aguardem, por favor.”

ISTOÉ: Elza, como você conheceu o Renegado?

Elza: “Eu conheço o Renegado tem um tempo, mas não sei dizer quanto. Já tinha visto alguma coisa dele, sempre muito coerente, forte, musical, mas nunca tinha assistido um show dele. Em 2019 ele foi a um show meu no Morro da Urca, se não me engano, e passou no camarim pra falar com o Pedro (Loureiro, seu empresário) e pra me ver. A gente sente quando acontece sintonia e foi assim.

Eu apaixonei pelas músicas e falei pro Pedro que eu queria dar uma força pro Renegado de algum jeito. O Brasil precisava conhecer melhor esse cara, a arte dele. Pra mim ele está ali no mesmo patamar de Marco Ribas, do meu Melô (Luís Melodia), Vander Lee e outros pretos geniais da nossa música.

Ele veio aqui em casa em Copa, papeamos a noite toda, aquela cantoria boa, aí as ideias de fazer coisas juntos foram surgindo. Acabei me tornando madrinha musical dele, mas mais que isso. Somos parceiros de trabalho e nos tornamos amigos da vida. Durante a pandemia ele foi muito importante pra mim, pra me ajudar a manter a cabeça boa.

ISTOÉ: Renegado, qual a importância da música na sua vida? Como é trabalhar junto com sua madrinha, Elza Soares?

Renegado: “Musica é a minha vida, trabalhar ao lado de Elza tem me mostrado que a entrega deve ser cada vez maior.
Hoje vivo a oportunidade de fazer um curso superior em musica com a melhor professora do milênio, isso é um privilégio.
Elzinha me ensina tanto todos os dias, ela é uma madrinha que joga junto, lutar por mim e comigo por esse reconhecimento.
Não é por acaso que Deus é uma mulher preta.”

ISTOÉ: Elza, qual o segredo para manter o vigor e a potência aos 91 anos?

Elza: “Me cuido muito. Amo o que faço e me amo acima de qualquer coisa. Não me apego muito a essa coisa de idade não. Digo que é mais uma primavera e pronto. Me mantenho cercada de gente boa, animada, que me recarrega. Hoje eu tenho o Pedro Loureiro, meu empresário maravilhoso. Estamos juntos nessa há uns seis anos já, desde o disco “A Mulher do Fim do Mundo”. Aliás, mais que isso, Pedro é um amigo muito presente, dedicado, protetor, um parceiro de vida que mudou a minha e hoje me dá condições de ter tranquilidade, de trabalhar só em coisa boa, não me deixa cair em furada.”