O elogio do vice-presidente Hamilton Mourão ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, mais notório torturador da ditadura, teve pelo menos um efeito simbólico para a memória coletiva: fez ressurgir com força nas redes sociais uma reportagem publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo, em 2012. Nele, a atriz e ex-deputada Bete Mendes relata a experiência de dor e sofrimento que teve nas mãos de Ustra e sua estupefação ao encontrá-lo trabalhando normalmente como adido militar na Embaixada do Brasil em Montevidéu, no Uruguai, para onde ele viajou, em 1985, na comitiva oficial do presidente José Sarney.

Pau-de-Arara

CRUELDADE Elogiado com frequência por membros do governo, Ustra foi um homem impiedoso e despótico: Bete Mendes foi uma de suas vítimas (Crédito:Sérgio Lima/Folhapress)

Bete Mendes foi torturada em 1970 no DOI-Codi, em São Paulo. Seu relato é tocante e mostra a fúria aniquiladora de Ustra. “Fui sequestrada. presa e torturada nas dependências do DOI-Codi do II Exército, onde o major Brilhante Ustra (dr. Tibiriçá) comandava sessões de choque elétrico, pau-de-arara, afogamento, além do tradicional “amaciamento”, na base dos ‘simples’ tapas, alternado com tortura psicológica. Tive sorte, reconheço, senhor ministro: depois de tudo, fui julgada e considerada inocente em todas as instâncias da Justiça Militar, que, por isso, me absolveu; e aqueles inocentes, como eu, cujos corpos eu vi, e que estão nas listas de desaparecidos?”, disse em uma carta que enviou para o então ministro do Exército, Leônidas Pires Gonçalves. Em entrevista, Mourão disse que Ustra “respeitava os direitos humanos dos seus subordinados”. Só de seus subordinados. Talvez nem deles.