24/03/2022 - 11:27
Num país onde pastor é lobista, tem relações pra lá de estreitas com a classe política e organiza caravanas de evangélicos para encontros com o presidente da República, talvez não devêssemos nos espantar com mais nada. Nem mesmo com o vazamento de uma conversa em que o ministro da Educação Milton Ribeiro admite priorizar solicitações de verbas feitas por prefeitos indicados pelos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura a pedido do presidente Jair Bolsonaro. Em contrapartida, os prefeitos garantiriam ajuda na construção de igrejas. O caso já foi batizado de Bolsolão do MEC.
Numa nota enviada após as denúncias, o ministro Ribeiro blindou seu presidente, negou qualquer irregularidade e disse ter compromisso com a laicidade do Estado. Se fôssemos um pouco mais ingênuos talvez até acreditássemos na laicidade desse governo, senhor ministro, mas não é o caso. Um Estado é considerado laico quando promove oficialmente a separação entre Estado e religião. Não é o que acontece por aqui, convenhamos, porque um Estado laico jamais permitiria a interferência de correntes religiosas ou privilegiaria esta ou aquela crença.
A bancada da Bíblia, como são conhecidos os parlamentares que têm ligação direta com igrejas das mais variadas vertentes, não apareceu agora e não é privilégio desse governo, muito embora seus integrantes nunca tenham sido tão privilegiados. Esse escândalo do Bolsolão do MEC é prova escancarada disso. Pastores evangélicos sem qualquer vínculo de trabalho com o Estado, mas com livre acesso ao gabinete de um ministro, negociando verbas públicas. Uma sujeira só. Se fossem religiosos de verdade, se temessem a Deus como gostam de gritar nos milhares de templos e casas de oração espalhadas por todos os buracos desse país, jamais estariam metidos até o pescoço nessa prática. É pecado.
Lembro que minha avó materna frequentava uma igreja batista na Avenida João Ribeiro, subúrbio carioca de Pilares. Naquela época não tinha pastor esbravejando para tirar dinheiro dos fiéis. Cada um dava o que podia e se não tivesse para dar, tudo bem. Ninguém saía envergonhado ou constrangido do culto. Hoje, as igrejas viraram um bom negócio, têm CNPJ, funcionários, lucros, comandam grades empresas de comunicação e seus pastores frequentam ministérios com a Bíblia numa mão e a calculadora na outra. Oremos.